𝟎𝟏𝟖 | A Vida Que Você Lutou Para Ter

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O som suave e constante das ondas quebrando na areia é a primeira coisa que Christian percebe ao despertar, de pé na areia em uma praia que se estende à sua frente. Ele fica imóvel, seus sentidos atordoados, tentando entender como foi transportado de um lugar sombrio e desconhecido para aquele cenário idílico. E não é uma praia qualquer; é a praia que ele visitou há anos, com seus pais e irmãos, durante uma viagem com a família Lancaster. Contudo, algo é desconcertante: O local está deserto, silencioso, sem sinal de vida humana ou animal, apenas o suspiro do mar. Atrás, as ruas, normalmente movimentadas, estão envoltas por uma espessa névoa branca. Ele ainda veste as mesmas roupas escuras, rasgadas e manchadas de sangue que usava naquela floresta, como se o tempo tivesse congelado naquele instante.

Christian recorda-se das muitas conversas sobre o cérebro humano, sobre como ele pode criar ou "reviver" memórias nos momentos finais da vida, fenômenos frequentemente relatados por aqueles que passaram por experiências de quase-morte. Ele se pergunta, então, se este é o seu caso. Está vivendo uma dessas visões, uma dessas memórias em um instante de transição. A sensação de déjà vu é palpável, mas também desconcertante.

O sol brilha intensamente no céu, mas o calor parece não tocá-lo. Seus ferimentos ainda estão lá, evidentes e dolorosos, mas estranhamente ele não sente dor, nem sede, nem fome. Uma sensação de apatia, como se estivesse suspenso em um limbo, toma conta de seu ser. Será que está preso nesse limbo, entre a vida e a morte, aguardando seu julgamento final, como imaginam as crenças populares? Talvez, ele se questiona, esteja à beira de um encontro com o destino, aguardando para finalmente ser acolhido no céu.

A cena é ao mesmo tempo encantadora e desconcertante, como se estivesse preso entre dois mundos. Mas, antes que possa mergulhar mais fundo em seus pensamentos confusos, uma voz suave e cheia de serenidade o interrompe.

— Está perdido? — uma voz masculina familiar pergunta, quebrando o silêncio com uma calma inusitada.

Christian se vira lentamente, como se temesse enfrentar o peso do passado que a voz traz consigo. O mundo ao redor parece se dissolver em ondas suaves e distantes, como o som de marés calmas sussurrando nos ouvidos. Seus olhos encontram a origem da voz, e o impacto é tão forte quanto uma marreta no peito. Ali, diante dele, está um garoto de quinze anos, cabelos loiros caindo suavemente até o pescoço, repartidos no meio, com fios rebeldes roçando a testa. Ele veste roupas brancas impecáveis, que contrastam como neve contra o dourado dos cabelos.

Christian sente um arrepio correr pela espinha, um calafrio que o faz trincar os dentes. É impossível. E, no entanto, ali está ele, um membro da família Lancaster, mas conhecido como Tommy, seu melhor amigo, o garoto que morreu há tanto tempo.

— Tommy? — Christian balbucia, incrédulo, sua voz quebradiça, quase um sussurro que o vento leva.

Tommy sorri, um sorriso cálido e simples que carrega anos de histórias compartilhadas.

Oi, Christian.

O mundo ao redor parece desaparecer quando Christian corre para abraçá-lo. Seu peito se comprime, e lágrimas quentes escorrem sem controle. Não importa como, nem por quê; estar diante de Tommy novamente faz todas as dores e lutas desabarem em uma onda de alívio avassalador.

— Eu não acredito... — murmura Christian, apertando-o como se temesse que ele sumisse novamente.

Christian se afasta, o olhar perdido no rosto do amigo, examinando cada detalhe, como se precisasse confirmar que aquilo não é um sonho.

— Tommy, eu... eu sinto muito pelo que aconteceu — sua voz treme, embargada pelo peso da culpa.

Tommy balança a cabeça com uma tranquilidade quase sobrenatural.

The Dead Come Back To Life: O Caminho Para CrossvilleOnde histórias criam vida. Descubra agora