O outono começava a pintar as árvores com cores quentes, e a cidade pequena ganhava uma atmosfera nostálgica que Clara apreciava cada vez mais. Ela se envolveu completamente na nova rotina — equilibrando seu trabalho remoto com o tempo ao lado de Lucas e os momentos preciosos com sua mãe. No entanto, a conversa sobre Felipe continuava a ecoar em sua mente. Apesar de confiar que Lucas resolveria a situação, Clara não podia deixar de sentir que havia mais sob a superfície. E logo isso se tornaria evidente.
Naquela tarde, Clara e Lucas decidiram fazer uma caminhada pela antiga trilha nas colinas próximas. Era um dos lugares favoritos de ambos quando eram adolescentes, um refúgio onde podiam falar sobre sonhos e medos, sem serem perturbados. O vento fresco trazia um ar de renovação, mas também de tensão não resolvida.— Você conseguiu falar com Felipe? — perguntou Clara, enquanto caminhavam lado a lado.Lucas hesitou, antes de responder.— Sim, tive uma conversa com ele. Não foi fácil. Ele está magoado, mas não por algo específico que fizemos, entende? É mais sobre como as coisas mudaram. Acho que ele se acostumou com a ideia de que, depois que você foi embora, estávamos construindo algo como amigos inseparáveis. E, agora que você voltou, ele sente que tudo isso foi abalado.Clara assentiu, entendendo mais do que gostaria. Sabia como era a sensação de ter o chão arrancado debaixo dos pés, de ver algo que se acreditava ser certo se transformar repentinamente.— E como ele se sente agora? — perguntou ela, sentindo uma leve tensão crescer em seu peito.Lucas olhou para o horizonte, pensativo.— Ele disse que precisa de tempo. Acho que é justo. Mas também me pediu um pouco de espaço, o que, sinceramente, me preocupou. Não quero perder um amigo de tantos anos, Clara.Clara parou por um momento, absorvendo as palavras. Ela sabia que o relacionamento entre Lucas e Felipe era profundo, e não queria ser a razão de um distanciamento. Mas também entendia que certas mudanças eram inevitáveis. Nem todos sabiam lidar bem com o retorno de alguém que havia partido.— Eu não quero que a nossa relação prejudique a amizade de vocês — disse Clara, com um olhar preocupado. — Talvez eu possa falar com ele, tentar esclarecer que nunca foi minha intenção afastá-lo.Lucas balançou a cabeça lentamente.— Eu aprecio isso, mas acho que essa é uma situação que Felipe precisa lidar por si mesmo. Ele não está bravo com você, está mais... perdido. E talvez eu também tenha errado ao não conversar com ele de forma mais aberta quando as coisas entre nós começaram a se reconstruir.Clara mordeu o lábio, tentando conter a preocupação. Havia algo mais profundo em tudo aquilo, e ela sentia que ainda não tinha visto tudo o que estava prestes a emergir.---No dia seguinte, Clara decidiu ir à biblioteca da cidade para procurar um livro que sua mãe mencionara, uma distração que também lhe proporcionaria um tempo para pensar. A pequena biblioteca sempre fora um lugar tranquilo, e Clara apreciava a simplicidade do ambiente. Quando estava percorrendo as estantes, ouviu uma voz familiar atrás dela.— Clara.Ela se virou e encontrou Felipe, parado alguns metros de distância. A surpresa tomou conta dela, mas ela logo sorriu de forma educada.— Felipe, oi. Eu não esperava te ver aqui — disse Clara, com uma tentativa de manter a calma.Felipe se aproximou, mas seu semblante era sério. Não havia o calor que Clara lembrava de outros tempos. Ele parecia cansado, como se estivesse carregando algo pesado.— Eu queria falar com você — começou ele, em um tom que não deixava muito espaço para subterfúgios. — Acho que já era hora.Clara assentiu, sentindo a tensão no ar. Sabia que essa conversa era inevitável, mas não imaginava que seria tão cedo.— Claro, Felipe. Eu também pensei em conversar com você — disse ela, com um leve sorriso, tentando quebrar o gelo.Felipe suspirou, olhando para o chão por um momento antes de voltar seus olhos para ela.— Quando você foi embora, Lucas e eu nos aproximamos muito. Ele estava arrasado, e eu tentei estar lá para ele, como qualquer amigo faria. Passamos por tantas coisas juntos, e, com o tempo, acho que comecei a acreditar que seria sempre assim. Como se... eu tivesse uma parte dele que ninguém mais poderia ter.Clara sentiu seu estômago se revirar. Não era ciúmes simples que Felipe estava sentindo, era algo mais profundo, uma ligação emocional que ela não havia previsto.— Eu entendo que as coisas mudaram — continuou Felipe, sua voz ficando mais sombria. — Mas, Clara, sua volta trouxe tudo isso à tona de uma maneira que eu não estava preparado. É como se eu estivesse sendo substituído, e isso não é algo fácil de aceitar.Clara respirou fundo, escolhendo suas palavras com cuidado.— Eu entendo que minha volta pode ter bagunçado as coisas. Mas, Felipe, nunca foi minha intenção afastar você ou mudar o que vocês têm. Eu quero que Lucas continue tendo suas amizades, especialmente com alguém tão importante quanto você.Felipe a observou por um momento, e Clara podia ver a luta interna em seus olhos.— Não é só sobre amizade, Clara. Eu acho que... de alguma forma, eu também me apeguei a Lucas de um jeito que vai além da amizade. E sua volta fez isso tudo se desmoronar — disse Felipe, finalmente revelando o que Clara temia.O silêncio que seguiu foi pesado. Clara não sabia o que dizer, mas a revelação de Felipe explicava muita coisa. Não era apenas um amigo ressentido; era alguém que carregava sentimentos profundos e não correspondidos, e sua volta havia desfeito a estrutura delicada que Felipe havia construído em torno dessa relação.— Felipe, eu... sinto muito — disse Clara, com sinceridade. — Eu não sabia.Felipe balançou a cabeça, com um sorriso triste.— Eu sei que você não sabia. E isso não é culpa sua. Mas agora que você está de volta, as coisas não podem continuar como estavam antes. E acho que preciso de distância para processar isso. Talvez, no futuro, as coisas possam voltar ao normal, mas, por enquanto, não posso ficar perto de Lucas do jeito que as coisas estão.Clara assentiu, compreendendo a profundidade da situação. Não era algo que ela ou Lucas poderiam resolver com uma simples conversa. Era um processo interno que Felipe teria que enfrentar sozinho.— Espero que, um dia, vocês possam retomar essa amizade — disse Clara, com suavidade.— Talvez — respondeu Felipe, com um olhar distante. — Mas isso vai levar tempo.Ele se despediu com um aceno de cabeça e saiu da biblioteca, deixando Clara com o peso da revelação e o turbilhão de emoções que isso desencadeou.---Quando Clara contou a Lucas sobre a conversa com Felipe naquela noite, ele ficou em silêncio por um longo tempo, absorvendo o que ela havia compartilhado. Clara podia ver a dor nos olhos dele, a dor de perder um amigo de forma tão inesperada e de uma maneira que ele nunca havia percebido.— Eu nunca soube... — murmurou Lucas, balançando a cabeça.— Eu sei, Lucas. E acho que nem Felipe tinha total consciência disso até que as coisas mudaram entre nós — disse Clara, tentando confortá-lo. — Ele só precisa de tempo.Lucas suspirou, passando a mão pelo cabelo.— Isso não torna mais fácil. Eu me sinto como se estivesse traindo ele, de alguma forma. Não por amar você, mas por não ter percebido o que estava acontecendo.Clara se aproximou, segurando a mão dele.— Ninguém poderia ter previsto isso. Mas você não está traindo ninguém, Lucas. Você está apenas seguindo o seu coração. E, com o tempo, espero que Felipe encontre o caminho dele também.Lucas apertou a mão de Clara, e juntos, eles encararam o desafio de frente, sabendo que o caminho à frente seria difícil, mas certos de que, juntos, poderiam enfrentar qualquer coisa.
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Vidas Entrelaçadas: Entre desavenças e reconciliações
RomancePrepare-se para uma montanha-russa de emoções! Neste romance, acompanhamos a vida de pessoas comuns que se veem envolvidas em situações extremas. Desavenças, traições e paixões avassaladoras moldam seus destinos e os levam a questionar tudo o que ac...