Na vida existem duas escolhas fundamentais: Aceitar as circunstâncias como elas são, ou ser ousado o suficiente para mudá-las. A vida é, literalmente, a soma de todas as nossas escolhas, e como bem sabemos, nem sempre estamos prontos para decidir o que é ou não bom para nós mesmos. Principalmente quando se tem quinze anos e está no primeiro dia de aula do segundo ano, como é o caso de Ansel e seu inseparável melhor amigo, Elói.
Desde os sete anos, a personalidade dos amigos é oposta. Ansel é o mais reservado, caladão. Já Elói, o mais alegre e falador, nunca teve problemas com o contato social. Essa diferença é refletida até no modo em como se vestem, com Ansel quase sempre usando roupas em tons neutros, só o básico, e Elói, bom, seu senso de moda é... extravagante.
Elói é de uma personalidade forte e divertida, o menino sempre se imaginou rodeado de amigos, sendo popular, quando pequeno ele queria se encaixar, mas o seu jeito de ser e se vestir "diferente" faziam do menino um alvo para as chacotas e perturbações das crianças maiores.
Ansel, apesar de retraído e um desajustado social até hoje, desde pequeno tem duas qualidades: ele é observador e empático, e, por mais que Elói não demonstrasse, ele sabia que aquelas coisas magoavam o menino. Assim, um dia surpreendendo Elói, que de segunda à sexta-feira tentava puxar assunto com ele, — sem ser correspondido — e que mesmo assim afirmava que eles ainda seriam amigos, Ansel, meio sem jeito puxou assunto com o menino, que franzindo a testa, estranhou a princípio, mas quando percebeu que não se tratava de mais uma pegadinha que aprontavam para ele, Elói sorriu. Ansel pensou que deixariam de incomodar o menino, mas o que aconteceu foi exatamente o contrário. Agora os dois eram perseguidos diariamente pelas crianças maiores, por muitas vezes tendo que se esconder na hora do recreio.
Contudo e com o tempo, isso já não importava mais, não aceitar as circunstâncias foi um "divisor de águas" na vida dos dois. Agora, o rejeitado e o estranho tinham um ao outro, um alguém para chamar de amigo.
Ansel, o garoto arredio vive com a sua jovem e bela mãe sanroquense, Bernadete Silva e Souza, Enfermeira chefe do Hospital Geral de São Roque de Minas, em Minas Gerais e dona de um encantador par de olhos azuis, diferente de seu filho cariboca cujo os olhos são cor de âmbar. A verdade é que os dois não tinham nenhuma semelhança física. Bárbara, irmã mais nova de Bernadete, sempre que visita a irmã com sua filha Briana de oito anos, diz à Ansel: "Você está cada dia mais parecido com o seu pai", pai esse que o menino não chegou a conhecer.
Segundo a avó de Ansel, suas duas filhas têm "dedo podre" para escolher homens, mas Bárbara foi muito alertada quanto ao mulherengo que só aparecia nas noites de sexta-feira no Terraço, um bar nas redondezas muito animado nos fins de semana.
Tão animado quanto um vaso de barro que Bernadete mantém próximo a janela da sala, um presente do pai de Ansel, o vaso das sete deusas representadas nas cores do arco-íris e que, segundo Bárbara, por algum motivo, as figuras desenhadas nele se moviam quando não tinha ninguém olhando. Certa vez Bárbara jurou que ouviu aquelas pinturas rupestres cantarem.
Bernadete e Ansel moram próximo a Cachoeira Casca D'Anta na Serra da Canastra em uma casa tradicional e bem espaçosa, equipada por Bernadete com um pequeno banco de sangue para atender as necessidades de seu filho e seu raríssimo tipo sanguíneo, o Rh-Nulo, mais conhecido como "sangue dourado". Além disso, a casa ainda conta com uma confortável garagem para o Corcel azul Capri de faróis há muito amarelos, herança da família Silva e Souza.
Como de costume, por ser caminho, Elói Leal sempre passa na casa de seu amigo para irem juntos ao colégio de bicicleta, e com Bernadete no portão desejando um bom primeiro dia aos meninos e declarando a seu "raio de sol" o quanto ela o ama, eles partem. Além do longo percurso, existem também duas pontes que fazem a ligação entre a cidade de São Roque de Minas e a cidade vizinha, Sacramento, sobre um pequeno trecho do Rio São Francisco, Velho Chico para os mais íntimos: Uma bem antiga, feita com cordas e madeiras bem velhas e a nova de concreto, construída no ano passado pela prefeitura vizinha. Obviamente, era a de concreto que eles usavam, a mais segura. O trajeto era repleto de árvores altíssimas de ambos os lados da rua.
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A AMEAÇA DE CHARÍA - LENDAS DE AIRUMÃ VOL.1
Fantasy"Quando abriu os olhos, Ansel contemplou um enorme pássaro sobrevoando sua cabeça, diferente de tudo que ele já tinha visto. O pássaro desencadeava raios a cada bater de asas. O menino já não estava mais em sua cidade." A vida de Ansel Silva e Souza...