VII

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𝗥𝗮𝗶𝗻𝗲𝗹𝗶𝘀 𝗥𝗼𝘀𝗮𝗿𝗶𝗼.

O aroma de café se espalhava pela cozinha do meu apartamento, enquanto o frio da manhã entrava pela janela entreaberta. Nem o casaco largo e as pantufas que eu usava conseguiam afastar totalmente o frio.

Meu apartamento era minimalista, decorado com tons pastéis e brancos elegantes, como aquelas casas de filmes em preto e branco.

Meu chá estava quase pronto, e o único som que ecoava no ambiente era da água borbulhando e fervendo suavemente na panela com o saquinho de chá.

Suspirei, tentando me aquecer enquanto envolvia as mãos ao redor da caneca quente. O silêncio do apartamento parecia ainda mais pesado do que de costume, como se ecoasse as coisas que eu tentava não pensar. A conversa com Alondra, a maneira fria com que ela me dispensou... era impossível não reviver aquilo em looping.

Dei um gole no chá, sentindo o calor se espalhar, mas ele não conseguia aquecer a frieza que me invadia por dentro. Parecia que tudo ao meu redor estava me lembrando de ontem, e por mais que eu quisesse seguir em frente, algo dentro de mim ainda desejava respostas.

De repente, um toque suave no meu celular me tirou dos pensamentos. Era uma mensagem de Angie:

"Ei, soube do que aconteceu. Quer companhia? Posso trazer umas bebidas, se quiser."

Sorri levemente ao ler a mensagem. Angie sempre sabia o que dizer para me animar, mesmo que fosse só uma oferta de ficar em silêncio ao meu lado. Mesmo que eu soubesse que precisava desse tempo para processar tudo, talvez fosse bom não estar sozinha com meus pensamentos.

Respondi rapidamente:

"Eu adoraria. Venha. Precisamos de um pouco de risadas por aqui."

Enquanto aguardava a chegada dela, voltei a me aconchegar no sofá, com a caneca de chá nas mãos e a mente vagando. Sabia que, com Angie ao meu lado, mesmo as situações mais complicadas pareciam um pouco mais leves.

Alguns minutos depois, ouvi a campainha tocar. Levantei-me e fui até a porta, abrindo-a para encontrar Angie ali, segurando uma garrafa de vinho e uma sacola cheia de lanches. Ela sorriu ao me ver, e aquele simples gesto trouxe uma onda de conforto.

— Pensei que a gente podia precisar de carboidratos e álcool em quantidade industrial — disse ela, erguendo a sacola e a garrafa.

Dei uma risada, puxando-a para dentro e fechando a porta atrás dela.

— Você sabe exatamente o que eu precisava, como sempre.

Fomos até a sala, e ela abriu o vinho enquanto eu ajeitava as taças e os lanches na mesa. Assim que nos acomodamos no sofá, brindamos com um "à sobrevivência" e tomamos o primeiro gole, o sabor intenso do vinho aquecendo um pouco o ambiente.

— Então... quer falar sobre o que aconteceu? — Angie perguntou, a voz gentil, deixando claro que estava ali para ouvir, mas sem pressão.

Suspirei, sentindo que as palavras estavam presas na garganta. Mas Angie era uma das poucas pessoas com quem eu conseguia ser completamente honesta.

— Alondra me dispensou. Ela nem quis discutir, só... foi tão fria. — A voz embargada saiu antes que eu pudesse controlar. — Acho que, no fundo, eu sabia que ela estava se afastando, mas a maneira como ela fez isso... foi cruel.

Angie colocou a taça de lado e se aproximou, segurando minha mão.

— Rai, você é uma pessoa incrível. Se ela não consegue ver isso, então ela realmente não merece você. Mas dói, eu sei. E dói muito.

Concordei, sentindo o peso das lágrimas que ameaçavam escapar.

— O pior é que, apesar de tudo, ainda sinto falta do trabalho.

— Rai, você não merece trabalhar naquele ambiente tóxico e também não merece a Alondra. — Disse, me deixando confusa com suas palavras.

Ela... estava me paquerando?

Eu observei Angie por um momento, tentando captar o significado das palavras dela. Seu olhar parecia diferente, um brilho que eu não tinha notado antes. Quando ela segurou minha mão com mais firmeza, senti uma energia nova no ar, algo que me fez questionar o que estava acontecendo.

Fui pega de surpresa quando senti os lábios de Angie contra os meus, intensos e decididos. Por um segundo, fiquei imóvel, sem saber como reagir, mas logo percebi que minha mão ainda estava entrelaçada à dela, e meu coração disparou.

Quando ela se afastou, seu olhar era uma mistura de expectativa e ansiedade, como se estivesse esperando minha reação, meu julgamento. A sala parecia ter parado, o som do vinho preenchendo o silêncio enquanto eu processava o que tinha acabado de acontecer.

— Angie... — murmurei, ainda atordoada, sem saber ao certo o que dizer.

Ela deu um sorriso meio tímido, como quem tenta parecer confiante, mas logo recuou um pouco, como se estivesse esperando que eu fizesse algo.

— Desculpa, eu... eu só senti que era o momento.

Num impulso, correspondi novamente, mergulhando naquele momento inesperado. Era como se a dor da noite anterior e as memórias com Alondra fossem, por um breve instante, colocadas de lado. Senti uma paz inesperada, como se aquela conexão tivesse estado ali o tempo todo, mas apenas agora revelada.

Angie afastou-se por um segundo, os olhos cintilando com um misto de surpresa e alegria.

— Eu sabia que Alondra não era certa para você.

Sorri, deixando meus dedos deslizarem pelo rosto dela, sentindo um carinho que eu não imaginava existir ali.

— Você nunca disse nada, Angie… e eu… acho que nunca percebi. Mas aqui, agora… parece que faz sentido.

Ela se aproximou novamente, sem hesitar, e eu a beijei, deixando que tudo o que eu sentia falasse mais alto. Por um momento, não havia preocupações, dúvidas, nem mágoas. Era só Angie e eu, e aquilo parecia certo de um jeito novo e reconfortante.

Com um sorriso, ela se afastou apenas o suficiente para olhar nos meus olhos.

— Você é linda — ela sussurrou, seus dedos entrelaçados aos meus.

— Você também... — respondi, o coração acelerando com a intensidade do momento. A conexão entre nós era palpável, uma nova energia que se formava, e eu não queria que isso acabasse.

Angie me puxou para mais perto, e nos encontramos novamente em um beijo suave, como se cada toque fosse uma descoberta. O mundo lá fora parecia desaparecer, e tudo o que importava era aquela sensação de estar viva, de estar presente.

BOSS - Railo ✔️Onde histórias criam vida. Descubra agora