34. Lily

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Quase não vi a carta de tão apressada que estava. Ela foi colocada debaixo da minha porta e ficou presa sob o tapete.

Eu estava com Emmy no colo, com a bolsa maternidade em um ombro, minha própria bolsa no outro e com um café na mão. Consegui me abaixar e pegar a carta sem derramá-lo. Supermãe.

Precisei esperar por um momento mais calmo no trabalho para poder abri-la. Quando abro e vejo a letra de Atlas, sinto uma onda de alívio percorrer meu corpo. Não porque duvidei que fosse de Atlas. Já faz vários meses que estamos juntos e ele me escreve cartas o tempo todo. Mas esta é uma das primeiras vezes que não senti nenhum medo de que fosse de Ryle.

Reparo a importância deste momento.

Faço muito isso. Reparo coisas importantes que são sinais de que minha vida finalmente está voltando aos eixos. Já não faço com a mesma frequência de antes, mas isso é uma coisa boa. Agora Ryle é uma parte tão pequena da minha vida que às vezes esqueço que achava que nossa situação nunca se rsolveria.

Ele ainda faz parte da vida de Emmy, mas tenho exigido mais estrutura dele. De vez em quando Ryle tenta me fazer diminuir minhas exigências em relação às visitas, mas só vou me sentir à vontade quando ela puder me contar com as próprias palavras como são seus encontros com ele. Espero que as aulas de controle da raiva estejam ajudando, mas isso só o tempo dirá.

O contato que eu e Ryle temos ainda é ríspido de vez em quando, mas tudo que eu queria com o divórcio era me libertar do medo, e realmente acho que consegui isso.

Estou escondida no armário do meu escritório, sentada de pernas cruzadas no chão porque queria ler a carta sem ser interrompida. Faz meses que obriguei Atlas a se esconder aqui dentro, mas ainda sinto seu cheiro.

Abro a carta e contorno o coraçãozinho aberto que ele desenhou no canto superior esquerdo da primeira página. Já estou sorrindo quando começo a ler.

Querida Lily,

Não sei se você está ciente da data, mas agora já estamos namorando oficialmente há seis meses. É metade de um ano! As pessoas comemoram meio ano de namoro? Eu até teria comprado flores para você, mas não gosto de dar trabalho demais para a florista.

Então decidi te dar esta carta.

Dizem que toda história tem dois lados, e li algumas histórias suas que, apesar de terem acontecido como você diz, me proporcionaram uma experiência completamente diferente.

Você mencionou brevemente o momento nos seus diários, mas sei que ele foi importante para você e inspirou uma tatuagem. Porém, não sei se você tem ideia do quanto aquele momento foi relevante para mim.

Você diz que nosso primeiro beijo aconteceu na sua cama, mas não é esse que eu considero o nosso primeiro beijo. Nosso primeiro beijo aconteceu numa segunda-feira, no meio do dia. Foi naquela vez que adoeci e você cuidou de mim. Você percebeu que eu estava doente assim que entrei pela sua janela. Lembro que você agiu na mesma hora. Você me deu remédio, água, cobertores e me obrigou a dormir na sua cama.

Não me lembro de nenhum outro momento na minha vida em que me senti tão doente. Acredito que você testemunhou o pior dia que já tive. E olha que já tive alguns dias péssimos. Mas quando a pessoa está lidando com uma terrível infecção estomacal, parece que não há nada pior do que isso.

Não me lembro de muita coisa daquela noite, mas me lembro das suas mãos. Elas sempre estavam perto de mim, ou conferindo minha temperatura, ou enxugando meu rosto com um pano ou segurando meus ombros nas várias vezes que precisei me virar para o lado no meio da noite.

É assim que começa Onde histórias criam vida. Descubra agora