(1998) Singe: Até uma princesa tem seus dias de fada madrinha

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Querido diário,

Uma coisa que sei na vida, e sei como ninguém, é a importância do dia do casamento.

O meu casamento, por exemplo. Foi legal. Foi bonitinho. As fotos ficaram lindas. Vou lembrar pra sempre. Mas não foi o evento do ano, pois naquela época eu era louca e metida a viver com meus próprios recursos, e disse para o papai que não queria nada faraônico que fizesse a família classe média do Mick se sentir mal. Aliás, eu tinha toda uma teoria a respeito. Eu achava que o Mick, como homem e provedor, se sentiria menos viril ao ter o dinheiro da minha família esfregado na cara dele, por isso recusei uma festança (até porque meu casamento aconteceu bem rápido, credo, parecia que estava grávida), disse que continuaríamos morando no apartamento alugado que podíamos pagar, e na ocasião achei até que Mick ficou bastante feliz com a minha escolha. Hoje sei que ele não se importaria a mínima, talvez até aceitasse o apartamento que o papai queria me dar de presente de casamento desde que nós pagássemos as contas, mas na época eu era toda cheia de medos e frescuras e com a cabeça entupida das psicologias da mamãe. Conclusão: Papai me deu apenas um carro, o casamento foi simples, e Mick e eu ainda nos apertaríamos por um bom tempo.

Ok, mas isso foi em 1987, éramos estudantes, duros, metidos a independentes e revolucionários. Mas em 1998, quando somos adultos, ricos, realmente independentes, não há necessidade de revolucionar o que não precisa de revolução. Principalmente a Malu. Se fosse a Kate, eu entenderia. Entenderia até a Rê. Mas a Malu é romântica, tradicional... é normal! E, como amiga dela, não posso deixar que ela faça algo que vai se arrepender pelo resto da vida.

O casamento na prefeitura precisava ser impedido a qualquer custo!

Por isso, aproveitei um raro momento em que todas as agendas agiam a meu favor e convoquei uma reunião urgente. Pobre Malu, devia estar se sentindo a pessoa mais solitária do mundo, pois estavam todos aqui. Mas ela vai entender, foi por um ótimo motivo.

-É o seguinte - Expliquei para as sete pessoas da sala. É claro que a Naomi não veio. Por que ela viria ajudar a organizar algo que não diz respeito a ela? - A Malu não pode e não vai se casar na prefeitura.

-Mas é o que ela quer! - Tom protestou imediatamente.

-Ai, Singe, pelo amor de Deus! Se conforma, criatura, que o casamento é dela, ela quer assim! - Kate jogou as mãos pra cima, impaciente.

-Ela diz que quer assim, isso não significa que ela realmente queira! Qualquer um que passe cinco minutos conversando com a Malu sabe que ela sonha com igreja, branco, pétalas de rosa, festa... Almoço no apartamento? Você tá louco, Tom?

-Porra, isso não foi nem ideia minha! Ela disse que queria assim. Não sou telepata como você, Singe - Ele falou, sarcástico.

-Prefeitura e almoço no apartamento é mesmo bem pouco "Malu". Eu botei na conta do amadurecimento.

-Não é questão de amadurecimento, Rê. É uma questão de sonho.

E então, a pessoa que eu menos esperava se levantou para me defender: O Eddie, que tem os piores casamentos da história, embora todos tenham sido, sim, muito grandiosos e com bastante glamour.

-Isso, sonho! A Malu sempre quis isso, sempre quis um conto de fadas e sempre sonhou com esse casamento. Não faz sentido que algo que vai acontecer apenas uma vez não seja exatamente como ela quer. E, se é isso que ela deseja, nós vamos te ajudar a dar isso pra ela, Tom.

-Mas como? Faltam dois meses! - Ele estava meio perdido, mas parecia convencido.

Eu estava pronta para isso porque, claro, nunca me passou pela cabeça que eles não topariam. Peguei a minha lista de tudo o que precisava, o que era absolutamente tudo mesmo, uma vez que joguei fora o que fiz para o casamento do ano passado, pois era mau agouro. Só o que sobrou foi o vestido, pois a Malu se recusou a se desfazer dele. Os rapazes estarão fora da cidade a maior parte do tempo até lá, mas dividi, entre as meninas e eu, o que precisava ser providenciado. Claro que fiquei com a maior parte, pois a Rê trabalha vinte horas por dia e a Kate tem um gosto um pouco duvidoso.

-Você dá conta disso, Singe? - Vince perguntou, assombrado.

-Puta que pariu, é uma festa! Não só dá conta, como daqui a pouco ela goza.

Mostrei o dedo do meio pro Mick e disse que seria bom se eles me ajudassem a ligar para as casas de festa, pois provavelmente essa seria a parte mais difícil.

-Posso arranjar, eu conheço algumas pessoas - Eddie falou.

-Você sempre conhece algumas pessoas.

-Mas conheço.

-Então tente essa! É perfeita! - Abri o catálogo e lhe mostrei a casa de festa top, maravilhosa, que parecia um castelo de contos de fada, exatamente como o casamento que queríamos proporcionar. Todos os homens falaram "caraca", o noivo falou "caralho", pois acho que o impressionei mais que os outros, e as mulheres fizeram "oh".

-Beleza - Eddie arrancou a página do catálogo, dobrou e colocou no bolso.

-Não era pra fazer isso! - Reclamei, mas nisso a Kate estava comentando com a Rê qualquer coisa sobre, se não dar tempo de ver tudo, convencermos a Malu a adiar a data.

-Aí já não vai rolar - Tom falou. - Ela não vai querer adiar, e nem eu.

-Eu tive uma ideia! - Kate deu um pulo do sofá. Ela pula muito (e grita) quando tem ideias: - E se fizermos um casamento surpresa? A Malu toda achando que está indo para a prefeitura, e aí a gente a leva para a casa de festa?

-Mas como vai ser isso? - Vince perguntou, e Rê falou:

-Já sei! Combinamos uma despedida de solteira lá em casa. Vocês todos vão para a casa de festa, e eu levo a Malu! E aí dou um jeito de convencê-la a entrar, porque provavelmente, a essa altura, ela já vai estar surtadíssima.

-Você entra com ela, Eddie - Tom falou, e ficamos tão surpresos que olhamos todos para ele. Até o Eddie estava com cara de quem ia morrer fulminado de susto a qualquer momento. - Ela não tem pai, não tem ninguém para caminhar com ela, e você é meu irmão e tal, e amigão dela. Certeza que, se ela fosse escolher alguém, escolheria você.

Eddie ficou mudo. Foi uma reação bem exagerada, pois ele parecia estar em estado de choque.

-Porra, Eddie, fala alguma coisa, nem que seja "não"! - Tom perdeu a paciência.

-Claro que sim - ele falou, mas ainda parecia um pouco sem foco. - Cara, seria uma honra do caralho! - Eddie finalmente reagiu como uma pessoa normal e abraçou o Tom.

Foi lindo, exatamente como no desenho da Cinderela. Cinderela sendo a Malu, claro, e nós os ratinhos e passarinhos arrumando tudo para ela ficar pronta para o baile. Será um casamento inesquecível.


O Lado Escuro da LuaOnde histórias criam vida. Descubra agora