Capítulo 5 - A dança das máscaras

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Lyra se encontrava, mais uma vez, envolta em uma alegria que parecia flutuar no ar. Ao seu redor, o salão vibrava com o som de risadas e música. As tochas iluminavam o espaço, dançando à medida que a multidão se movia, enquanto o aroma de especiarias e vinho preenchia o ambiente. Ela estava no centro da roda de dança dos convidados, girando e rindo, absorvendo aquela sensação de liberdade que parecia fluir a cada movimento seu.

Então, seus olhos captaram algo — uma figura parada à beira do salão, observando-a de longe. Era um homem vestido de preto, com roupas elegantes que contrastavam com a sua presença sombria. Uma corrente pendia de seu braço, como se fizesse parte dele, e seu olhar era intenso, quase pesado demais. Ele começou a se aproximar, e uma sombra gelada pareceu deslizar por entre os convivas, perturbando a leveza ao redor.

Lyra tentou se afastar, mas seus pés pareciam presos. Ao se mover, esbarrou em algo — ou melhor, em alguém. Três figuras surgiram, rodeadas por uma luz dourada suave, quase ofuscante. Havia algo profundamente reconfortante naquelas presenças, como se uma força de esperança e proteção as acompanhasse, empurrando para longe o homem sombrio e o frio que ele trazia. Mas, antes que Lyra pudesse dizer qualquer coisa, antes que pudesse entender quem eram ou por que estavam ali, sentiu um chamado distante que a puxava de volta.

Uma lufada de vento frio tocou seu rosto, arrancando-a do sonho. Lyra abriu os olhos e deu de cara com a realidade do quarto onde estava confinada. As paredes de pedra nua devolviam apenas o silêncio e o vazio; o ar invernal entrava por uma pequena janela, provocando um arrepio em sua pele.

Ela respirou fundo, tentando se reconectar com aquela sensação de paz que o sonho trazia, mas já se dissipava, como areia entre os dedos. Esse era o mesmo sonho que vinha todas as noites desde seu aniversário, cada detalhe incrivelmente real. Mas dessa vez... havia sido diferente. Dessa vez, as figuras douradas estavam mais próximas, quase ao seu alcance.

Lyra se levantou da cama, sentindo o frio penetrante do quarto enquanto se aproximava do espelho de moldura antiga e escura. A imagem refletida lhe parecia quase uma estranha, alguém que ela mal reconhecia. Os olhos, de um roxo profundo, estavam sombreados pelo cansaço e pela tristeza – como se contivessem mares revoltos, cheios de emoções não ditas. O cabelo, de um preto intenso, caía em longas ondas soltas sobre os ombros, em contraste com sua pele pálida e quase translúcida. Seu rosto era delicado, com traços finos e uma expressão melancólica, um reflexo da vida que levava há tempos: uma prisão camuflada de luxo.

Enquanto Lyra se perdia nos próprios pensamentos, a porta foi aberta com uma brusquidão que a trouxe de volta à realidade. Vanya, sua mãe, entrou no quarto com passos rápidos e seguros, o olhar severo deixando claro que ela não toleraria hesitações. Alta e esguia, com um rosto impassível e elegante, Vanya carregava o orgulho e o peso do nome da família Dargall, conhecidos por seu prestígio e influência, embora Lyra soubesse que isso era, agora, mais aparência do que verdade.

"Levante-se e venha logo," ordenou Vanya, sua voz fria e sem qualquer traço de afeto. "Não temos tempo para distrações."

Antes que Lyra pudesse reagir, Vanya a segurou pelo braço e a puxou com firmeza, arrastando-a para fora do quarto. O toque rígido era a maneira de Vanya deixar claro que o momento não permitia objeções.

"Hoje à noite é uma ocasião especial," Vanya declarou enquanto atravessavam os corredores gelados da mansão. "Kael é um homem poderoso, e ele escolheu você. Essa é a chance de nossa família assegurar o futuro e restaurar o respeito que merecemos." O tom de Vanya era cortante, como se cada palavra fosse uma sentença irrevogável.

Lyra sentia o peso de cada palavra da mãe, a certeza cruel de que estava sendo oferecida como um tributo, um preço a pagar para que a ilusão de poder e riqueza dos Dargall continuasse viva – uma moeda de troca em um jogo implacável.

A mitologia de Karmus - A primeira chamaOnde histórias criam vida. Descubra agora