Deboche

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Ao chegar ao batalhão, ainda absorvendo a intensidade do dia, fui imediatamente recebido pelo André e pelo Neto, que, obviamente, já estar pronto para uma sessão de provocações.

"Então quer dizer que já levou a pirralha para conhecer até o enteado... ele é um herói!" André soltou com aquele sorriso debochado.

Neto completou com sua risada característica: "O Roberto de aventura não tem nada, André... nem comeu a novinha ainda."

Revirei os olhos, mantendo a calma, mas por dentro senti uma mistura de estresse e cansaço. Não era incomum ser alvo dessas brincadeiras, principalmente quando havia algo novo em minha vida pessoal que chamava a atenção dos colegas. Sabia que, para eles, isso era só parte da camaradagem, mas às vezes o peso das piadas passando do limite.

"Vocês devem se preocupar mais com a missão de hoje do que com a minha vida", respondeu secamente, tentando desviar o foco.

"Tá estressado, hein?" disse Neto, levantando as mãos em um gesto de rendição com um sorriso maroto nos lábios.

André, nunca perdendo a chance de soltar uma piada ácida, acrescentou: "Ah, eu entendo o cara... a menina ainda é quase uma criança! Se chegar pegando ela de jeito, acho que desmaia!" Ele deu de ombros, com um riso breve.

Respirei fundo e olhei para eles, controlando minha confiança. Não queria entrar em uma discussão ali, mas também não estava disposto a deixar passar sem uma resposta.

"Vocês não têm nada melhor pra fazer, não? Lembrem-se de que daqui um pouco a missão começa e não vai ter espaço pra essas brincadeirinhas", respondi com um tom sério.

Os dois se entreolharam, percebendo que talvez tivessem ido longe demais. André deu um meio sorriso, como quem se desculpa sem palavras, enquanto Neto apenas assentiu discretamente. Sem mais provocações, ambos se afastaram e seguiram para se preparar para a missão, deixando o ambiente em um silêncio momentâneo.


Observei-os saindo e senti um alívio por não ter deixado a situação escalar. Sabia que, apesar das brincadeiras e da tensão que às vezes surgia entre nós, a lealdade e a compreensão eram sempre mais fortes. Esse era o tipo de dinâmica que se desenvolvia em um batalhão como o nosso, onde o senso de humor frequentemente servia para aliviar o peso do trabalho, mas que precisava ser balanceado com respeito. Tirei um momento para respirar fundo e ajustar meu equipamento, concentrando-me na missão que tínhamos pela frente.


Estar no BOPE sempre foi sinônimo de encarar o perigo de frente, quase como se ele fosse apenas mais uma parte da rotina. Em operações, não havia espaço para hesitação; éramos treinados para sermos rápidos, precisos e implacáveis. Mas, naquela noite, enquanto nos preparávamos para entrar na favela, uma sensação que eu não sentia há muito tempo me atingiu como um soco: medo.


Não era o medo do desconhecido ou da troca de tiros. Era o medo de não voltar para casa, de deixar Rafael sem pai e de perder a chance de construir algo mais com Mia. O pensamento me pegou desprevenido, como um lembrete cruel de que, por trás do uniforme e das armas, eu era humano.


"Que idiotice", murmurei para mim mesmo, balançando a cabeça para afastar a fraqueza. Não podia me dar ao luxo de pensar assim. Ali, no meio da escuridão e do silêncio tenso que antecede uma incursão, não havia espaço para vulnerabilidade. Mas a verdade era clara: pela primeira vez, eu tinha algo mais a perder do que minha própria vida.


O Batalhão de Operações Policiais Especiais, BOPE para os íntimos, nós chegamos com gana de invadir favela uma puta tensão quando a gente solta o verbo nem sempre as palavras são as mais sóbrias e elegantes

Paixão AcidentalOnde histórias criam vida. Descubra agora