Tudo o que eu quero é viver a minha vida do meu jeito
Acordo com o barulho do despertador. Eu gostaria de dormir até tarde, mas regras são regras e vermelhos precisam seguir regras.
Eu queria ser uma prateada. Sinceramente quem não gostaria? Poder ver as cores, controlar elementos, seguir apenas minhas próprias regras. Mas, sou apenas uma vermelha. E os vermelhos seguem regras.
Os vermelhos não deveriam ver cores, mas, quando me concentro, eu as vejo. Não contei a ninguém. Não quero ser diferente dos outros. Ser diferente é quebrar regras, mas quem disse que as regras se aplicam aos prateados?
Me olho no espelho e meu reflexo aparece com cores. Meus cabelos são vermelhos e meus olhos são um meio-termo entre azul e verde. Eu já era uma vermelha, porque eu tinha que ter o cabelo da mesma cor? Desviei o olhar do espelho então voltei a encará-lo. Sem cores.
Abro o armário e vejo na tela da parte de dentro da porta do guarda-roupa o que os prateados selecionaram para os vermelhos vestir no dia da cerimônia. Um vestido que ia até a altura dos joelhos e um rabo de cavalo. Jura? Um dos dias mais importantes para os vermelhos, e vamos precisar usar roupas tão bregas?
Hoje é a cerimônia de distribuição dos ofícios. O que será que os prateados escolheram para mim? Motorista? Cozinheira? Criadora? Argh, os ofícios vermelhos são tão sem graça, os prateados ficam sempre com os ofícios mais legais.
Na cerimônia, devemos manchar dedo com nosso próprio sangue e prensá-lo contra um papel. Acho que é um tipo de juramento ou algo do gênero.
A caminho do Grande Salão, vejo algumas famílias prateadas fazendo piqueniques abaixo da Árvore da Vida. Os prateados a consideram sagrada, os vermelhos não sabem por que. Ela não é verde como as outras árvores. Ela é dourada, como se alguém pintasse cuidadosamente todas as suas folhas todos os dias do ano. Ela era linda.
Lembro-me que quando eu era pequena perguntava a minha mãe por que a árvore era sagrada.
– Os prateados sabem - ela respondia. Todas as vezes ela repondia isso.
"Os prateados vem primeiro". Essa é a regra número um dos vermelhos, como se já não bastasse sermos praticamente pisoteados por eles.
Me lembro dos corredores da escola. A maioria dos prateados de lá sempre se aproveitavam a ingenuidade de alguns vermelhos. Era de dar raiva. Uma vez precisaram me segurar para não dar um soco na cara de um deles, o que não seria nada bom para mim.
Não consigo me lembrar quantos anos eu tinha quando vi um vermelho desrrespeitar um prateado pela primeira vez, mas eu lembro o que aconteceu depois. Ele foi chicoteado no meio da praça. Foi horrível de se ver. Lembro também que quando os seguranças prateados foram embora, minha mãe e eu corremos para ajudar o homem. Ele já estava morto. Naquele dia eu aprendi que o unico jeito de viver é ficando de boca fechada.
Não. Eu não gostaria de ser uma prateada.
Quando chego ao Grande Salão, minha amiga Bree acena para mim me juntar com ela.
– Guardei um lugar para você - Sussurrou ela enquanto eu sentava ao seu lado. - Estou tão nervosa.
– Eu também - respondi. Bree, pelo menos, tinha alguma idéia do que os prateados escolheriam para ela. Ela com certeza seria uma criadora.
Quando a cerimônia começou, o primeiro a ser chamado foi uma garota, não prestei atenção no nome dela. Depois foi um garoto, e logo depois foi a vez da Bree.
– Breenel Williams. - Bree cortou o dedo e precionou contra o papel. - Criadora.
Sorri. Estava feliz por ela ter conseguido o oficio que queria.
Algumas outras pessoas foram chamadas, então foi minha vez.
– Margô Climber.
Com o coração na mão, eu caminhei com passos rápidos até a mesa onde se encontrava a faca cerimonial e o papel que estava manchado com o sangue dos outros vermelhos. Estava tão nervosa que nem senti dor quando aquele metal frio e afiado cortava meu dedo. Então pressionei contra o papel.
Meu sangue tinha uma coloração diferente dos demais. Era mais claro e mais brilhante, como se alguém tivesse colocado um pouco de glitter em cima. Os prateados anciãos arregalaram os olhos quando viram a cor. Então eu reconheci aquele tom. Era prata avermelhado.
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Prata Avermelhado
General FictionMargô vive num mundo onde a sociedade foi dividida em dois grupos: os de sangue Prateado (que eram a nobreza), eles podem ver as cores, controlar elementos e não seguem regras de ninguém, e os de sangue Vermelho (que eram a plebe), eles não vêem cor...