O massacre do debate - parte 2

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Assim que chegou em casa, Victória ignorou mais uma tentativa da prima de conversar e correu para o quarto. Deu graças a Deus por estar de folga do trabalho. Trancou-se lá o dia todo, com pequenas pausas para ir ao banheiro, almoçar e beber água. Ainda bem que Dom Casmurro era um dos livros que tinha em casa, comprara numa das bienais do livro, mas nunca lera. Essa era sua chance. 

Victória leu com um dicionário e um caderno ao lado, sempre pausando para anotar pontos importantes para o debate. No fim do dia, leu mais de cinquenta por cento da obra e já se via estranhando a relação entre Escobar e Bentinho. Nunca vira dois amigos se tratar da mesma forma com que Bentinho tratava o cara. 

No dia seguinte, Victória foi para a escola mais cedo. Ia subir as escadas direto para a sala, se não tivesse visto Brenda indo  para os fundos da escola. Fez uma careta e desviou de sua rota. Seguiu a menina com cuidado, tentando não lhe atrair atenção. Brenda parou no jardim dos juntos, na frente do muro da escola, tirou um spray de tinta da mochila e começou a espirrá-lo no muro, danificando totalmente o desenho idiota de livros, que fazia a escola parecer infantil. Victória nunca gostara da pintura, mas nunca ousaria acabar com ela. 

— Droga — resmungou, fechando os olhos por um segundo. Depois, correu até a menina. — Mas o que diabos você tá fazendo?

Brenda levou um susto e deixou o spray cair no chão, levando a mão ao peito.

— Ai, meu Deus! Não faz mais isso, quer me matar do coração? Sabia que os índices de infarto aumentou entre os jovens? Odeio livros, mas sou antenada nas notícias, viu? 

Ela revirou os olhos e apontou pro muro.

— Essa é sua brilhante ideia de me mostrar que pode fazer coisas terríveis também? Que saco, Brenda. Você é burra ou o quê? Isso é ridículo. Pra fazer maldade precisa ter um propósito, se não tudo é em vão. Que saco. — Ela bufou e soprou a franja dos olhos. 

— Quem disse que não tenho propósito? Olha só, tô tendo dias bem ruins, então me deixa. Isso aqui não tem nada a ver com você. — Ela abriu um sorriso magoado. — Na verdade, acho que não vai funcionar, o lance de andarmos juntas. Talvez fosse um motivo pra me fazer ficar nessa escola, mas você não me quer por perto. Então, eu preciso dar um jeito de ser expulsa daqui o mais rápido possível. 

— Ser expulsa? Você é retardada? Qual o plano? Ir pra um internato?

Brenda deu de ombros.

— Quem sabe…

— Você é uma anta mesmo. — Com um grunhido, Victória agarrou em seu pulso, pegou a lata de spray e a tirou de lá. Ambas acabaram em um dos corredores do térreo e ela jogou a tinta numa lata de lixo. Depois, conduziu Brenda a uma escada e a fez sentar ao seu lado nos degraus.

— Não precisava jogar fora meu spray — a mais nova resmungou.

— Dane-se. Você também não precisava pichar o muro da escola. 

— Você parece boazinha demais pra ser a famosa Maligna. O que aconteceu com sua maldade? 

— A vida não é um filme, Brenda. E não confunda maldade com burrice. Em pouco tempo a escola encheria de gente e todo mundo te veria pichando o muro. 

— Já falei que não me importo, era intencional. Assim, seria expulsa.

— Não vou te deixar ser expulsa.

— Por quê?

— É nova demais pra acabar com seu futuro assim. Espere pelo menos passar numa faculdade, aí vai poder se destruir como quiser. E se tem uma coisa que eu abomino é relaxo com os estudos. Se quer ser uma vilã, seja uma vilã inteligente. 

A VilãOnde histórias criam vida. Descubra agora