Capítulo Cinco

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— Capítulo Cinco: O Submundo

Com as três balas incorporadas ao meu ser, eu me sentia diferente, mais conectado com as escamas deste reino. A energia pulsante corria através de mim como um rio de mistérios e possibilidades, fluindo pelas minhas veias e inundando cada parte do meu ser. A aberração ameaçadora, com a qual eu tinha tido um confronto tenso, desapareceu, me deixando com suas palavras de advertência ecoando em minha mente como um eco sinistro, uma lembrança constante dos perigos que espreitavam este recinto amaldiçoado. A busca pela verdade tinha me transformado de maneiras que eu mal podia compreender, mas estava determinado a continuar. Afinal, não havia retorno agora, apenas o desconhecido que se estendia diante de mim, cheio de segredos e desafios. Era como se eu tivesse cruzado um limiar, entrado em um território irreal e corrompido, entre o que era e o que poderia ser se tornando imagens borradas e desentendidas.

O caminho à minha frente era envolto em chamas, um mar de flamas vermelhas e douradas que iluminava o caminho como uma lanterna acesa na noite mais escura. Os lumes dançavam ao ritmo de uma melodia desconhecida, o fogo crepitante criando sombras grotescas nas paredes do submundo. As labaredas ardentes lambiam as rochas negras, criando um espetáculo hipnotizante e aterrorizante ao mesmo tempo. Cada passo que eu dava era acompanhado pelo calor intenso que emanava das chamas, como se o próprio Inferno estivesse respirando sob meus pés. O calor penetrava minha pele e se infiltrava em meu corpo, como se tentasse me consumir. O ar estava impregnado com o cheiro de enxofre sendo queimado, e a sensação de tirania era tateável, como se o ambiente estivesse me testando, me desafiando a continuar.

Enquanto eu avançava através do mar de chamas, algo extraordinário surgiu diante de mim: um bar sombrio, perdido no meio das labaredas infernais. Parecia completamente fora de lugar, um oásis de escuridão e decadência no meio do caos flamejante. Me questionei quantos desses existiam por aqui, pois davam certa ideia de que na pós-vida as almas gostavam de se entregar a seus vícios e prazeres mundanos. A fachada do bar estava adornada com sinistras esculturas de demônios alados e caveiras em chamas, uma placa de madeira enegrecida balançava preguiçosamente com a inscrição "O Pecado Ignorado". A música distante de um piano desafinado e o murmúrio de vozes roucas e sussurros indecifráveis escapavam pelas rachaduras da porta semicerrada. Cautelosamente, empurrei a porta e entrei. O interior era como o de um antigo salão de bar, mas com uma torção infernal. Mesas de madeira rangiam sob a luz trêmula das velas, criaturas grotescas, tanto humanas quanto demoníacas, ocupavam os bancos, conversando em línguas estranhas e trocando olhares furtivos. O balcão era um espetáculo à parte. Um demônio de chifres retorcidos e pele escamosa servia bebidas em copos burlescos, enquanto um ser garboso tocava o piano desafinado com dedos esqueléticos. O ar estava carregado com o cheiro de álcool e enxofre, criando uma atmosfera intoxicante e opressiva.

— Que surpresa cativante! — uma voz soturna e arrastada gritou em meio ao barulho, me chamando a atenção para uma mesa no canto onde um homem com cabeça de jumento bebia junto a outras criaturas como ele. O homem-jumento ergueu seu copo bizarro, cheio de uma bebida que parecia fumegar em seu interior, e fixou seus olhos nos meus com uma intensidade que me fez estremecer, sorrindo maliciosamente. — Mas que... bela e atraente alma ousa entrar pelas portas deste lugar esquecido do Inferno. — Ele deu um gole em sua bebida ardente antes de continuar. — O Pecado Ignorado não é para almas inteiras, só os perdidos vêm afogar suas mágoas e esquecer os tormentos do passado. Somos todos criaturas de apetites vorazes e desejos proibidos, e tu, quem és?

— Sou Ulysses, só um... viajante atrás de respostas e redenção — respondi, mantendo meu tom firme apesar da atmosfera opressiva do lugar. — Minha jornada me trouxe até aqui, só entrei por curiosidade.

Podia sentir seu olhar sondando minha alma, como se estivesse tentando decifrar meus segredos mais profundos. O homem-jumento soltou um riso rouco que ecoou pelo bar, atraindo a atenção de outras criaturas estranhas ao seu redor. Deu mais um gole em sua bebida fumegante e acenou para um assento vazio à sua frente, convidando-me a me juntar a ele.

Ulysses e o Caos DivinoOnde histórias criam vida. Descubra agora