O sol, ainda tímido e singelo, permanecia escondido por entre as grandes montanhas rochosas e gélidas, tomando coragem, preparando-se e elevando-se aos poucos para, finalmente, estar em seu ponto mais elevado do dia.
Era manhã, e a cada minuto sua luz se intensificava, passando por entre as árvores que sussurravam com o vento, por entre os picos congelados no horizonte, pelas mais belas colinas calorosas do norte, refletindo-se sobre as águas dos lagos e riachos e, sobretudo isso, iluminando gloriosamente o reino de Vale-Orus.
Com algumas horas de espera, tendo todos os seres viventes diurnos já ocupados com os seus próprios afazeres, o sol finalmente estava em seu ápice.
E assim como o sol, Vale-Orus estava acima dos outros reinos, sendo um reinado poderoso, rico em agricultura, exércitos e com uma boa qualidade de vida; bom, pelo menos, para a maioria.
Muitas pessoas não sabiam o que era fome, pois comida não lhes faltavam, também não sabiam o que era passar frio, pois o dinheiro ganho de seus próprios trabalhos lhe permitiam comprar boas roupas para se aquecerem. No entanto, dentro dos distritos mais pobres do reino, existiam aqueles cuja a fome lhes eram a maior companheira, e o frio, um convidado muito presente em determinadas épocas do ano.
Felizmente, era verão; época de calor e clima agradável. E para o pequeno Carl, não seria necessário preocupar-se com uma nova coberta tão cedo.
Carl era um garoto que, apesar de suas condições, sempre se mantinha positivo independentemente da situação. Ele vivia naquelas casas de madeira enfileiradas que estavam sendo comidas aos poucos por cupins. Nela, morava apenas ele, sua mãe - que preparava uma sopa de repolho para o almoço - e seu pai, que havia acabado de chegar de seu trabalho como ferreiro do distrito.
-Pai! - Carl correu pelo chão de madeira, rumo à porta onde seu pai se encontrava com um enorme sorriso cansado no rosto. -Chegou mais cedo hoje. Aconteceu algo?
Seu pai se ajoelhara para receber o filho de braços abertos.
-Sim, resolvi vir mais cedo... - Murmurou, com certa dor na voz. -Meus braços estão cansados hoje. Mas, trouxe algo para você.
-Para mim? - Perguntou o garoto, afastando-se um pouco para trás enquanto mantinha um olhar curioso para seu pai.
Seus olhos arregalados, brilhavam na expectativa de receber o presente enquanto o observava enfiar a mão num grande saco de pano, tentando retirar alguma coisa de dentro e, quando finalmente conseguira, retirou de lá uma bola de futebol. Seu pai sabia que ela não era tinha a melhor qualidade, já que seu material era feito de couro de vaca costurado com alguns poucos retalhos que escondiam algumas imperfeições, mas para Carl, era perfeita.
-Feliz aniversário, filho - disse o pai, contendo as lágrimas que se aglomeravam em seus olhos. Para quem não sabe - e que, talvez um dia saberá -, uma das maiores alegrias de um pai é ver o orgulho e a felicidade do próprio filho; até mesmo quando reconhecem que, coisas simples como aquelas, possuíam grande valor.
O garoto, com as suas mãos pequenas, agarrou o presente boquiaberto. Fazia alguns anos que não recebia algo de seu pai, visto que ele trabalhava demais para tentar manter algum alimento dentro de casa. Mas finalmente, depois de tanto tempo, tinha algo só seu para brincar.
Agradecido, Carl voltou a abraçar seu pai, que riu com o gesto e, sem perder mais tempo, a criança correu para fora de casa, a fim de brincar pela rua feita de pedras.
Alguns de seus amigos que moravam nas casas ao lado, vieram brincar juntamente com ele.
Todos corriam, brincavam e gargalhavam em todas as vezes em que alguém caia ao chão por algum tropeço e, após longos minutos - talvez horas - a brincadeira havia cessado; algumas mães mandaram que seus filhos entrassem para dentro de casa, já que estava ficando tarde.
Sentado sobre a calçada de sua casa, ofegante, Carl olhou para o amigo que estava sentado ao seu lado, e ambos trocaram sorrisos alegres.
-Estou cansado...
-Eu também. - Disse o amigo, engolindo em seco. -Diga ao seu pai que eu agradeço pelo presente que ele lhe deu. Já havia tempo que não brincávamos com algo novo.
-Tem razão. - Carl sorriu pensando na sorte que tinha em ter o ferreiro como pai. -Ele é o melhor.
O amigo sorriu meio torto, não querendo concordar com Carl, mas ambos sabiam que, de todos os pais daquela rua fétida largada pelos deuses, o pai de Carl era, de fato, um dos pais mais gentis que havia por ali.
Ambos respiraram fundo para encher os seus pulmões com o ar impuro do distrito, e em seguida, soltaram todo o ar pela boca.
Os olhos castanhos de Carl ergueram-se para cima, admirando o céu limpo, vendo alguns pássaros sobrevoando o reino quando, de repente, o sol que iluminava Vale-Orus fora tapado por uma grande, gigantesca sombra de um ser alado. O reino tornara-se escuro.
Carl não sabia ao certo sobre o que vira; era um ser que possuía uma enorme cauda, voando no ar. Então aconteceu algo que confirmava as suas suspeitas, ele sentiu seus pelos se eriçarem ao ouvir um rugido forte e estridente vindo dos céus, carregado de ameaça e morte. Os garotos levantaram-se rapidamente da calçada com as pernas já bambas por um medo que nunca haviam sentido na vida, e tentavam entender, alarmados, sobre o que estava acontecendo, quando ouviram gritos de desespero por todos os lados do distrito; os gritos só não eram tão altos quanto o rugido ecoando por todo o céu.
O cheiro de fumaça começara a se espalhar e, com o coração na boca, Carl deixou a bola que seu pai havia lhe dado cair ao chão, sentindo uma grande urgência em sair correndo para qualquer lugar que não fosse aquele; algum lugar seguro. Mesmo sem saber o que estava acontecendo, mesmo sem entender nada, Carl sabia, de alguma forma, que estava correndo perigo.
No entanto, antes que ele pudesse processar alguma informação, os olhos assustados do garoto viu, pela última vez, um fogo ardente descendo do céu bem na sua direção. O fogo o consumiu, assim como sua casa, e as demais que estavam por ali.
E então, como o sol que ardia em fogo, assim também ardia Vale-Orus em chamas, sendo destruída e queimada por todos os lados.
De um reino grande e poderoso, agora só restavam chamas e, por fim, cinzas de um império caído.
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Império Caído
Fantasy"Como o sol que ardia em fogo, assim também ardia Vale-Orus em chamas, sendo destruída e queimada por todos os lados. De um reino grande e poderoso, agora só restavam chamas e, por fim, cinzas de um império caído." • • • • • • A história é inspirada...