Capítulo XVII

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Ver Dorian partir na carruagem com Agnes me fez entender muitas coisas.

Primeira: eles, em especial Dorian, como senhor e herdeiro de tudo aquilo, tinha toda liberdade de partir quando bem entendesse e eu não.

Segunda: Dorian estava muito bem vestido e arrumado, um cavalheiro e eu estava em meu habitual vestido da criadagem, uma diferença bem evidente, principalmente quando ficamos lado a lado.

Terceira e mais importante: eu e ele não éramos do mesmo mundo, mesmo que ele já tenha vivido no meu.

Precisava voltar para minha realidade e ser resiliente com ela.

Eu poderia ficar ali andando pela casa, mas o simples pensamento de acabar perto do quarto do senhor Anders me dava arrepios. Para ocupar minha mente, decidi ajudar a senhora Taylor a cortar maçãs. Fiquei feliz por ela não me olhar com desconfiança depois de me flagrar no quarto de Dorian, mas a expressão em seu rosto não era necessariamente amigável. Lembrei-me de sua ligação com Dorian e perguntei:

– Senhora Taylor, há quanto tempo trabalha aqui? – Por mais que tivéssemos trabalhado juntas por tantos meses, jamais tinha lhe questionado sobre aquilo.

– Trabalho para a família Anders há quase vinte anos. – Ela me encarou, seu rosto suavizando. – Tempo suficiente para saber onde é meu lugar nesta casa.

Sabia muito bem que aquelas palavras eram direcionadas a minha atitude de momentos antes.

– E meu lugar não é me intrometendo nos assuntos dos meus senhores.

– Mas a senhora ajudou Dorian.

Ela me olhou espantada, não sabia bem se pela réplica ou por tê-lo chamado de Dorian. A governanta segurou a faca e suspirou.

– Conheci a mãe deles. – Ela começou. – E mesmo não sendo a companhia mais recomendada, éramos próximas.

Aquilo me deixou ainda mais curiosa e intrigada.

– Eles sabem? – Murmurei.

– Sabem, por isso eles me mantêm aqui. – Ela abriu as mãos na tentativa de relaxar enquanto o amontoado de maçãs não tinha diminuído. – O senhor Dorian é um bom homem, apesar de tudo, mas tenha cuidado. O restante dessa família esmagaria uma criada com muita facilidade.

Engoli em seco lembrando do meu encontro com Henry na cidade.

– Você é uma boa pessoa, Hope, por isso me preocupo. Tenha cuidado, talvez essas pessoas não atendam às suas expectativas.

Compreendia muito bem aquelas palavras.

Eles poderiam ir embora para Londres, Dorian poderia se casar com alguém com posição e fortuna. Tantas possibilidades e eu continuaria ali sendo a criada. Tinha esperança de que Dorian cumprisse com seu acordo, então eu poderia ao menos ir embora daquela casa.

A senhora Taylor foi chamada pela senhora Ruth e eu continuei a cortar maçãs.

Agora eu tinha duas opções: me deitar enquanto Agnes não chegasse, apesar de acreditar que ela não me incomodaria apenas para ajudá-la a ir dormir. Ou poderia ir visitar Camila, ela já havia me enviado uma carta me alertando sobre não se afastar de sua vida. Dramática, mas incrivelmente amorosa, minha querida amiga.

Escolhi a segunda opção.

A senhora Taylor me pediu para ficar com Camila caso ficasse muito tarde, o que levei em consideração.

Ainda não tinha escurecido quando sai de Anders Hall, fui seguida por Bob, mas o ordenei que retornasse.

A estrada de pedra estava vazia enquanto eu caminhava, ouvia um ou outro pássaro, mas o sol já se pondo deixava a floresta silenciosa. Me peguei questionando minhas próprias atitudes. Eu poderia muito bem visitar Camila no dia seguinte, o que seria até mais cômodo, mas estar na cidade não me deixaria tão entediada ou pensativa sobre o abismo entre eu e... Suspirei frustrada. Por que eu estava pensando em Dorian?

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