Capítulo 04

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Passou-se uma semana desde que Bruce pisou no restaurante e, com o tempo, comecei a acreditar que aquilo tinha sido apenas um incidente isolado. Afinal, ele provavelmente tinha outros lugares onde poderia comer ou, com o dinheiro que tinha, quem sabe não mandava preparar suas refeições em casa? Se ele nunca mais aparecesse, seria um alívio.

Tentei convencer a mim mesma de que, finalmente, estava voltando ao normal. O restaurante tinha seus dias agitados e alguns clientes difíceis, mas isso fazia parte do meu trabalho e, de certo modo, eu até gostava do desafio. Estava focada, como sempre, e me recusava a deixar qualquer coisa me distrair. Eu me esforçava ao máximo para que as lembranças daquela última vez fossem enterradas. O problema é que algumas feridas nunca cicatrizam completamente, e eu estava prestes a descobrir isso.

Era início da tarde, e o sino da porta soou. Meu coração deu um salto automático. Olhei para frente e lá estava ele. Bruce Gutiérrez entrou com sua presença imponente, como se fosse dono de cada centímetro do chão que pisava. De imediato, um silêncio incômodo caiu sobre o salão, e as conversas ao redor pareceram suspensas, como se todos aguardassem sua próxima atitude.

Eu não me deixaria intimidar. Continuei focada no que fazia, pronta para atendê-lo caso ele precisasse. Mas então, sem nem olhar na minha direção, Bruce acenou para outra garçonete e disse com a maior calma do mundo:

— Eu prefiro ser atendido por alguém que saiba segurar uma bandeja corretamente.

Aquilo bateu como um soco. Vi as outras garçonetes se entreolhando, tentando não rir, mas algumas clientes mais indiscretas não conseguiram segurar as risadinhas. Aquilo queimava na minha pele como uma ferida aberta, mas eu mantive o rosto impassível, controlando cada músculo para não demonstrar que, por dentro, a humilhação me afogava. Ele sequer olhou para mim, e isso fazia o sangue ferver.

Observei a outra garçonete atendê-lo enquanto ele ignorava totalmente minha presença, agindo como se eu fosse invisível. Ele parecia satisfeito com isso, como se soubesse exatamente o impacto que sua atitude teria. Cada riso abafado das clientes me lembrava de que ele havia plantado uma semente de dúvida na minha capacidade, me reduzindo a algo insignificante. Era como se, de alguma forma, ele tivesse arrancado todas as minhas camadas de confiança, me deixando exposta ali, diante de todos.

Mas eu não cederia. Não deixaria que ele visse o quanto aquilo me afetava. Continuei servindo as mesas próximas, os passos firmes, o rosto inexpressivo, embora cada segundo ao redor dele fosse uma tortura. A cada vez que ele desviava o olhar, era como se estivesse reafirmando o quanto me considerava incapaz. Era a mesma sensação de ser diminuída que eu sentia desde a infância, e Bruce parecia saber exatamente onde tocar para fazer essa ferida arder.

Quando ele finalmente terminou e saiu, eu fiquei com o peito pesado. Uma parte de mim queria gritar, outra queria sair correndo e não voltar nunca mais. Mas ali, de pé, respirei fundo e lembrei-me de que o motivo pelo qual vim até aqui não era para fugir de desafios — era para enfrentar tudo de frente. E isso incluía Bruce Gutiérrez.

Com o restaurante esvaziando, fechei o turno decidida. Eu não me deixaria abater.

As semanas seguintes passaram rapidamente, mas, ao mesmo tempo, de uma forma angustiante. Eu estava tentando manter a fachada de força, como sempre, mas a verdade era que a cada dia que passava, a sensação de desgaste e de estar prestes a quebrar aumentava. Bruce continuava a aparecer no restaurante, sempre no mesmo horário, sempre com aquele olhar que parecia medir tudo o que eu fazia. Não que ele falasse muito comigo — na maior parte das vezes, ele apenas me ignorava e fazia pedidos para a outra garçonete. Mas a presença dele era opressiva, e mesmo quando ele estava sentado quieto em sua mesa, eu podia sentir seus olhos na minha nuca, como se estivesse aguardando o momento certo para testar os meus limites novamente.

Eu me vi evitando sua presença cada vez mais, me esquivando de olhares e, sempre que ele entrava, a tensão tomava conta do meu corpo. Minhas mãos suavam, a respiração ficava mais difícil, e o restaurante inteiro parecia se tornar um palco para algo que eu não sabia como evitar. Eu não queria dar a ele o prazer de ver como sua presença me afetava, então eu tentava ser o mais indiferente possível, mas isso estava ficando mais difícil com o tempo.

Nos dias em que Bruce não aparecia, eu me permitia relaxar, mesmo que só por um momento, e tentar esquecer o peso da sua presença. Mas esses momentos eram fugazes. Quando ele chegava, meu estômago apertava, e o ar parecia ficar mais denso. Eu pensava em sair do restaurante, dar um passo atrás, mas não podia. Eu precisava do trabalho. Eu precisava mostrar que era capaz, que nada me afetava.

A rotina no restaurante se arrastava, mas eu não podia negar o quanto estava me sentindo exausta, fisicamente e mentalmente. As noites eram longas e muitas vezes passavam em claro, com os olhos pesados e a mente tagarelando sem parar. Eu me pegava repetindo os mesmos pensamentos, questionando por que tudo parecia tão difícil, por que a simples presença de Bruce me deixava assim, inquieta e pequena. Eu sabia que o tempo estava passando, mas havia algo em mim que não estava seguindo o fluxo, algo que parecia estar estagnado.

Eu não percebia, mas meu corpo estava respondendo ao estresse de maneiras que eu tentava ignorar. Às vezes, sentia uma falta de ar, uma sensação de que algo estava se quebrando dentro de mim, mas rapidamente afastava essas ideias, me concentrando no trabalho, nos pedidos e nos clientes. Quando Bruce chegava, no entanto, as coisas pioravam. Eu ficava tensa, com a sensação de que ele estava me analisando o tempo inteiro, esperando por alguma falha, algum deslize, algum motivo para me fazer sentir ainda menor. E ele nunca parecia se cansar disso.

Naquela noite, enquanto eu servia uma mesa próxima à janela, ouvindo risos e conversas ao fundo, a última coisa que eu esperava era um cliente gritar. Mas, de repente, um homem se levantou da mesa e, com raiva nos olhos, começou a acusar-me de ter servido um peixe cru.

— Isso é uma vergonha! Como você pode me servir algo tão mal feito?! Isso é inaceitável!

O homem estava exaltado, seu rosto vermelho de raiva, e eu sabia que não conseguiria controlá-lo sozinha. A pressão começou a subir pela minha garganta, meus pensamentos estavam turvos, como se a raiva dele estivesse se espalhando por mim também. Não era só o cliente. Era o modo como ele falava, como ele me tratava, como se eu fosse incompetente. Era o tipo de humilhação pública que eu já conhecia bem, e tudo o que eu queria fazer era desaparecer.

Os outros clientes olhavam, alguns até riam. A sensação de vergonha me engoliu, e eu tentei manter a calma, mas o nó na minha garganta não deixava. As palavras do homem ficaram ecoando na minha cabeça, e o medo tomou conta de mim. Ele não parava de gritar, de me acusar, e eu não sabia mais o que fazer. Eu queria sumir, desaparecer de dentro daquele restaurante, mas não conseguia.

De repente, um som seco, o som de um soco, ecoou pela sala. Eu estremei. O homem que estava gritando foi lançado para trás, tropeçando na cadeira e caindo no chão, surpreso e desorientado. Meu coração bateu mais rápido, e minha mente estava em frangalhos. Quando olhei para a fonte do impacto, vi Bruce. Ele estava de pé, com o braço ainda estendido, olhando para o homem que acabara de agredir.

O restaurante inteiro ficou em silêncio por um momento, todos os olhares fixos em Bruce, e em mim, claro. Eu estava paralisada. Bruce Gutiérrez tinha acabado de socar o homem por minha causa.

Ele me lançou um último olhar. Parecia examinador, como se procurasse alguma coisa na minha expressão — surpresa, gratidão, talvez? Não tive certeza do que ele queria encontrar. Mas, sem qualquer palavra, ele deu meia-volta e saiu do restaurante, deixando um rastro de espanto para trás.

Não havia agradecimento, explicação, nem sequer um olhar de despedida. Bruce tinha feito aquilo e saído, como se defender alguém fosse uma obrigação casual para ele. A confusão na minha mente aumentou. O homem, ainda no chão, começou a ser amparado por outros clientes, e o murmúrio no restaurante voltou lentamente, como se as pessoas tentassem entender o que acabaram de presenciar.

Aos poucos, o peso de tudo aquilo foi tomando conta de mim. Eu estava exausta, desgastada pela presença opressora de Bruce e agora por aquela atitude tão inesperada. Sentei-me por um momento para recuperar o fôlego, ainda sentindo as pernas trêmulas, tentando processar tudo que tinha acabado de acontecer.

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