• Prefiro me aposentar

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Três dias. Foi o tempo que Anne conseguiu viver em paz, sem a sombra de Gabriel Guevara pairando sobre o seu estúdio. Ela achou que ele tinha desistido, que talvez tivesse encontrado um tatuador que se curvasse à arrogância dele. Mas, como era de se esperar, o universo não lhe dava descanso.

Era uma tarde movimentada. O estúdio estava cheio de conversas, o som das agulhas trabalhando sem parar, clientes entrando e saindo. Anne finalmente tinha se distraído o suficiente para esquecer o último encontro com Gabriel. Até que, claro, a porta se abriu e o inconfundível som das botas pesadas dele ecoou pelo estúdio.

Ela nem precisou olhar. Sabia que era ele.

— Porra, de novo não... — murmurou, sem tirar os olhos do trabalho que fazia no braço de um cliente.

Gabriel entrou como se fosse dono do lugar. E o pior? Algumas pessoas o reconheceram imediatamente. Murmúrios começaram a surgir, e Anne já sabia que aquilo ia ser uma dor de cabeça.

— Você realmente não tem mais o que fazer? — ela disse sem olhar para ele, concentrada nos últimos detalhes do desenho. Mas dava para sentir a presença de Gabriel se aproximando, junto com aquele maldito perfume caro que sempre fazia seu estômago revirar — e não de um jeito ruim, o que a deixava ainda mais irritada.

— Tenho, mas você é mais divertida — ele respondeu, se encostando na parede como se estivesse assistindo a um show. — E, admito, eu gosto do desafio.

Anne terminou a tatuagem e se virou lentamente para ele, com o olhar carregado de raiva contida.

— Qual parte de "eu não vou te tatuar" você não entendeu?

Gabriel cruzou os braços e deu aquele sorrisinho irritante que fazia o sangue dela ferver.

— Todas. Achei que você tava só jogando duro pra me provocar.

Ela deu um passo à frente, agora de frente para ele. Estava cansada daquele joguinho. As palavras saíram rápidas e afiadas, cheias de desprezo.

— Eu não tô jogando duro, Guevara. Eu tô recusando, sacou? Não sou um capacho que você pode dobrar com esse seu sorriso de galãzinho de merda. Você acha que porque as pessoas caem aos seus pés, eu vou cair também?

Gabriel riu baixo, mas dessa vez havia algo mais em seu olhar. Algo mais sombrio, mais irritado.

— Não subestime o que as pessoas fazem pra conseguir o que querem, Anne.

— Olha, você não me assusta. Pode parar de tentar esse papo de "sou o cara", porque não vai funcionar. — Ela bufou, já cansada daquela conversa sem fim. — E, sério, qual é a sua? Não é possível que não exista outro tatuador em Madrid que aceite o seu dinheiro.

— Existe, mas não é isso que eu quero. — Ele deu um passo à frente, a expressão dele ficando mais séria, como se tivesse algo a provar. — Eu quero você.

A frase ficou no ar por alguns segundos, carregada de tensão. Anne cruzou os braços, arqueando uma sobrancelha.

— Cuidado com as palavras, Guevara. Eu posso entender de outro jeito.

Gabriel soltou uma risada curta, mas os olhos dele continuavam fixos nela, intensos. Dessa vez, não havia arrogância no sorriso. Havia determinação.

— Então entenda como quiser. — Ele deu mais um passo, ficando a apenas alguns centímetros dela. — Mas eu não vou desistir. Você vai acabar cedendo, Anne. E quando isso acontecer, vai ser nas minhas condições.

Ela encarou aquele rosto bonito de perto, os olhos escuros cheios de autoconfiança, e quase se deixou afetar. Quase. Mas Gabriel não sabia com quem estava lidando. Anne Ferreira não se dobrava por ninguém.

— Nas suas condições, é? — ela repetiu, dando um risinho sarcástico. — Beleza. Então me faz um favor: espera sentado.

Gabriel não recuou. Pelo contrário, ele inclinou a cabeça, olhando diretamente nos olhos dela.

— Eu tenho paciência. E você vai me tatuar, quer você queira ou não.

Anne sentiu a boca secar, mas não baixou a guarda. Era como se os dois estivessem em uma guerra silenciosa, uma batalha de vontades.

— Eu prefiro me aposentar do que tatuar você — ela cuspiu, sem perder o controle.

Gabriel abriu um sorriso largo, genuíno dessa vez, como se estivesse gostando da luta.

— Então, vou continuar vindo até você mudar de ideia. — Ele deu uma piscadela e se afastou lentamente, como se já tivesse vencido a discussão. — Até logo, Anne.

Ele saiu do estúdio como se não tivesse uma preocupação no mundo, e Anne ficou ali, travada por alguns segundos. Aquela porra de sorriso ainda estava gravado em sua mente.

Ela respirou fundo, tentando se recompor. Quando voltou para o cliente, já sentia a raiva crescendo de novo. Quem esse cara pensava que era?

Mas uma parte dela, uma parte que ela odiava admitir, estava curiosa. Talvez até ansiosa para ver qual seria o próximo movimento dele.

Afinal, Anne não gostava de perder.

Sin límites - Gabriel GuevaraOnde histórias criam vida. Descubra agora