Capítulo um

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Clara

Permiti que um longo e sonolento bocejo me escapasse enquanto eu fechava o livro que estava disposto sobre a mesa bem diante de mim. Apoiei as minhas costas no encosto da cadeira, levantando os braços para o alto como uma maneira de me espreguiçar.

Ouvi e senti alguns leves estalos pelo meu corpo. Eu já estava naquela posição há horas, precisava me levantar e me alongar um pouco. Me coloquei de pé, aproveitando para recolher as embalagens de biscoitos e salgadinhos que estavam espalhados pela minha mesa de estudos.

Coloquei tudo na pequena lixeira que havia ao lado da escrivaninha e bati as mãos uma contra a outra para limpar alguns farelos que as sujavam. Quando me virei para dar continuidade a pequena, porém necessária, faxina, ouvi um barulhinho estranho vir direto da minha barriga.

— Algo me diz que já passou da hora do almoço. — Eu falei para mim mesma, pegando o celular no meu bolso e me surpreendendo ao constatar o horário. — Bom, vejamos o que tem para comer.

Deixei o meu quarto, seguindo agora na direção da cozinha. Abri a geladeira e no mesmo instante o sorriso presente no meu rosto desapareceu tão rápido quanto surgiu. Eu estava faminta, mas a geladeira estava vazia, e mesmo que não estivesse, não faria diferença alguma já que eu mal sabia como fritar um ovo.

Desde que meus pais viajaram, eu estava sobrevivendo graças a alguns lanchinhos rápidos que encontrei pelos armários. Agora que eles haviam acabado, eu precisava encontrar uma nova solução para saciar a minha fome. E juntando o útil ao agradável, decidi sair um pouco para fazer um lanche em algum local próximo a minha casa.

Voltei para o meu quarto, separei algumas roupas em cima da cama, segui para o banheiro onde tomei um banho um pouco demorado e então voltei para o quarto para me vestir. Penteei o meu cabelo molhado, peguei o meu celular, minha carteira e quando finalmente estava pronta, eu segui o meu caminho, não esquecendo de trancar tudo antes de sair de casa.

A lanchonete para onde eu estava indo ficava de frente para um lindo parque. Por conta do horário, era possível ver algumas crianças brincando no escorregador e nos balanços. Uma parte de mim ficou com vontade de ir até lá e brincar com elas, mas eu sabia muito bem que há anos eu já não tinha mais idade para isso.

Empurrei a porta de entrada da lanchonete, ouvindo um sininho adorável anunciar a minha chegada para os demais clientes e funcionários do estabelecimento. Me sentei em uma cadeira livre em uma pequena mesa de frente para a janela. Aquele lugar me dava uma visão privilegiada do parque e do seu movimento.

Uma moça, uma garçonete, veio me atender. Ela me entregou o cardápio e esperou pacientemente enquanto eu o analisava e escolhia com calma qual seria o meu pedido. Depois que a garota se retirou, eu levantei a cabeça e uma imagem me pegou de surpresa. Do outro lado da rua havia um homem, eu não o conhecia, mas ele estava olhando diretamente para mim.

Confusa, eu estreitei os olhos em uma tentativa de identificar o seu rosto, no entanto, mesmo com a distância, era difícil para mim reconhecê-lo. Eu estava certa de que nunca o havia visto em toda a minha vida, mas porque ele olhava para mim como se eu fosse um alvo em potencial?

Não acredito nisso, não sou a única nesta lanchonete, talvez ele esteja olhando para outra pessoa. Eu segurei o seu olhar, somente para testar a minha teoria, e ele não desviou o dele nem por um segundo. Aquilo já estava começando a me deixar um pouquinho assustada.

— Aqui está, senhorita. — Eu me assustei com a voz da garçonete, que havia retornado com uma bandeja onde eu pude vê-la equilibrar o meu pedido. — Oh, perdão! Eu não pretendia assustá-la.

Sentimento PerigosoOnde histórias criam vida. Descubra agora