Capítulo 9
Os primeiros raios de sol mal haviam saído e todos já esperavam prontos do lado de fora da Casa Grande, estavam ansiosos em poderem começar o treinamento. Em pouco tempo estavam divididos em três grupos, cada um com sua habilidade, e já iniciavam as manipulações mais básicas.
Sik havia se unido às outras pessoas de sua tribo, eram quatro ao total, ele e Matt, seu filho, ambos pertencentes à casa de Saraf, e Jessia, Morgan e Prudence, da casa de Fleryan. Os outros dois grupos eram formados por quatro integrantes cada, em um estavam Lyahn, da casa de Conan, e Poah, Clancy e Marylan, da casa de Pavison, e no último grupo estavam Clerg e Yhuan, da casa de Saicon, e Sara e Noah, da casa de Shetat.
O treinamento começou com as técnicas básicas de dominação, todos se concentraram, sentiram a energia do novo mundo que estavam, a canalizaram e começaram a manipulá-la.
Matt lembrava-se das primeiras aulas de dominação que tivera, antes delas serem proibidas, os passos era os mesmos, porém o que dava a intensidade no ataque era o modo que ele se concentrava, o que valia para qualquer um.
Aos poucos pode sentir a energia que o rodeava, a energia que o mantinha preso ao chão, a mesma energia que estava presente em qualquer lugar, a energia que curvava o tecido espaço-tempo.
Ele conseguiu senti-la nos braços, nas mãos e nas pontas dos dedos, começou a interagir com ela, primeiro levantando algumas folhas do chão, depois galhos e pedras. À primeira vista, alguém de outra tribo que desconhecesse as suas habilidades ou de sua tribo, poderia dizer que ele tinha telecinese, mas não funcionava assim, ele não conseguia mover objetos apenas com o poder da mente, talvez as tribos perdidas fizessem isso, mas não ele, não sua tribo, ele manipulava a grande força, assim conseguia diminuir a pressão em cima de objetos e aumentá-la embaixo, fazendo o objeto se mover, parecendo flutuar.
Ele e sua tribo manipulavam o próprio espaço que os cercava, o espaço e sua força, dobrando-o, estendendo-o, fazendo assim coisas viajarem por ele, através dele. Na verdade todos o manipulavam, a simples ação de levantar o braço era uma manipulação do espaço, da grande força, mas sua tribo conseguia interagir grandemente com essa força.
Com um pouco mais de concentração ele conseguiu manipular grandes pedras, e com mais concentração ainda, conseguiu levantar alguns centímetros do chão, mas não conseguiu se manter no ar por muito tempo, era muito difícil.
Grandes manipuladores conseguiam dominar a energia da grande força de tal modo que eles mesmos conseguiam vagar pelo espaço que ela preenchia, mas não ele, pelo menos ainda não, para isso ser possível ele precisava ter uma ampla noção do espaço à sua volta, conseguindo se enxergar parte dele, conseguindo dobrar o espaço em torno de si mesmo. Manipular a energia em torno que coisas ou até mesmos outras pessoas era fácil, pois ele conseguia ver, sentir a energia, mas manipulá-la em torno dele mesmo era diferente, exigia um nível de habilidade que ele ainda não tinha.
No outro grupo, Lyahn, da casa de Conan, se concentrava igualmente, mas a energia que se ligava à sua tribo e sua casa era diferente, ele tinha ligação com a energia que preenchia o espaço, não como a grande força, pois ela era o próprio espaço, mas ele se ligava à energia que viajava pelo espaço, a energia que preenchia o espaço, a energia que iluminava o espaço.
Muitos a chamavam de luz, mas era mais do que a luz, em grande parte era mesmo a luz, a energia que preenchia tudo à nossa volta, energia necessária para a sobrevivência, mas era mais, ele não sabia explicar, mas ele podia sentir, cada vez que saia ao sol, até mesmo quando saia à noite, à luz da lua, ele sentia seu corpo vibrar, sua mente se encher de paz, seu corpo interagindo de certa forma com essa energia. Alguns de sua tribo conseguiam manipular a energia luminosa que existia dentro das pessoas, dentro de si mesmos, trazendo paz, segurança.
Era estranho pensar em tudo que podia fazer com seu dom, não por serem coisas estranhas ou anormais, mas por saber que a sétima tribo manipulava a energia contraria à sua, a que havia sido a primeira a se unir à nona tribo na guerra, ajudando-os a criarem monstros que agora vagavam por toda Gaila.
Conforme ia se concentrando, conseguia sentir seu corpo vibrar, os braços formigarem, as mãos se enchendo de energia, e pouco depois conseguia soltar no espaço pequenas esferas luminosas, conseguia trazer ao lugar em que estava uma luminosidade muito intensa, as vezes conseguia juntar tanta energia que sentia as próprias mãos brilharem.
No terceiro grupo, Noah, da casa de Shetat, esforçava-se para mapear o lugar onde estava, a energia que se ligava à sua tribo era energia das coisas vivas, a força da atração das coisas. Quando algo interagia com o espaço, quando alguma coisa tinha determinada energia e interagia com as outras, ela liberava uma força. As pessoas, pelo simples fato de existirem, liberavam essa energia, tinham essa energia em torno de si. No mundo em que estavam as pessoas haviam criado máquinas e aparelhos estranhos que conseguiam criar essa energia, conseguiam manipulá-la também, de uma forma grosseira e primitiva, mas conseguiam. Ele se ligava à força da interação.
Ele rastreava mentalmente o espaço à sua volta, pois sabia que aquele mundo guardava em seu subsolo grande quantidade de minerais, como também acontecia no seu, e sua habilidade funcionava bem com minerais, principalmente com ferro e metais. Eles interagiam com sua energia de certa forma que se moldavam à ela. Quando Noah era pequeno ele havia ganhado de seu pai algumas bolinhas de metal, quando criança ele gostava de brincar com elas as transformando em tudo que sua mente desejasse, carruagens, cavalos, castelos, espadas. Quando cresceu e treinava para as batalhas ele as utilizava para lutar, era impressionante o que podia fazer com elas, conseguia transformá-las em finas e letais agulhas, as fazendo viajar pelo espaço com grande velocidade, indo na direção que quisesse. Mas as havia perdido na noite da invasão, por isso agora buscava metais no subsolo para poder fazer o que sabia, apenas lançar ondas sônicas não o satisfazia, para batalhar ele precisava de minerais.
Não demorou muito para todos estarem prontos para os treinos de combate, todos já eram grandes, e apesar das manipulações agora estarem proibidas em Gaila, sabiam bem o que estavam fazendo e estavam em um bom nível de concentração.
Sik conversou um pouco com todos, conduzindo-os até o outro prédio, onde pegaram armaduras de pano e madeira para o treinamento, tinham que garantir que ninguém se machucasse.
As regras eram simples, não lançar nenhuma rajada de energia altamente letal, não acertarem as construções, não machucarem a si mesmos nem aos outros e não lançarem nenhuma rajada para fora do campo de treinamento.
A primeira dupla a treinar fora escolhida por sorteio, Jessie Fleryan, da casa de Fleryan da segunda tribo, e Poah Pavison, da casa de Pavison da primeira tribo. Todos ali ouviam histórias dos treinamentos enquanto estavam em suas casas em Gaila, sabiam que era mais do que apenas treino, sabiam que era quase que um esporte, uma competição. A adrenalina invadindo o corpo enquanto encaravam um adversário aliado de outra tribo, o corpo reunindo energia, as rajadas cortando o espaço, o espaço interagindo com a luta, todos queriam estar naquele lugar um dia, poderem “treinar”, e agora todos estavam.
Jessie e Poah pararam frente à frente na arena, que ficava bem ao centro do campo, delimitada apenas por marcações de pó de ossos de animais, formando um espaço oval. Os outros pararam ao lado da Casa Grande, sentando em alguns troncos deitados no chão, que formavam uma espécie de arquibancada, e esperaram para ver e urrar pela batalha. A orientação era não gerar nenhum tipo de disputa ou rivalidade, mas era nato, esse sentimento sempre estava presente, mesmo sendo todos aliados.
Com o som agudo do tilintar do sino quem avançou primeiro foi Poah, não iria deixar que uma garota da segunda tribo o derrotasse. Ele corria em direção a ela e concentrava uma grande esfera de energia luminosa na mão, quando ele se colocou na frente dela com um salto, e jogou a mão à frente lançando um raio de luz que ardia nos olhos, viu apenas um vulto girar sobre e ele e para à suas costas. Jessie se colocou em posição de ataque e bateu forte as mão na frente do corpo, com os braços esticados, fazendo todo o espaço se curvar e jogando Poah no chão na frente dele.
Enquanto caia, com um rápido reflexo, ele juntou energia em uma das mãos e lançou uma rajada no chão, levantando de ponta cabeça no ar, e antes mesmo de se virar e cair de costas para sua oponente, com a outra mão lançou uma rajada em direção à Jessie, a fazendo cair sentada no chão.
Quando caiu em pé no chão, depois de dar uma pirueta no ar, se virou rapidamente, vendo duas grandes pedras voarem em sua direção e o acertarem no peito e na barriga, jogando-o para trás sem ar.
Quando conseguiu se levantar viu Jessie correndo em sua direção e esticando os braços e uma onde de rajadas que viajavam pelo ar e o acertavam com grande força, o jogando para trás cada vez mais.
Em uma tentativa de se proteger, Poah cruzou os braços à frente da cabeça, fazendo um X. Em poucos instantes um grande escudo luminoso se formou à sua frente, e, firmando um pé à frente do corpo, descruzou os braços com um movimento brusco e um grito, fazendo o escudo girar e voar em direção à Jessie.
Assim conseguiu firmar uma onda de ataques, a cada passo que dava à sua frente cruzava os braços em X, concentrava energia e os descruzava novamente, lançando discos de energia pelo espaço, sem dar tempo para ela se levantar.
Jessie rolava pelo chão tentando se esquivar dos ataques, mas eles eram muito rápidos, não conseguia completar nenhum movimento. Quando finalmente conseguiu se colocar de joelhos no chão, outro disco luminoso vinha em sua direção. Com um rápido movimento, lançou uma rajada de energia no chão, se erguendo no ar e girando deitada por cima do disco, assim, enquanto girava, estendeu um dos braços e com a mão aberta deu um forte tapa no ar, lançando uma rajada de energia na direção de Poah. O ataque cortou o ar, o outro disco de energia que vinha e atingiu Poah, jogando-o contra a parede de pedra do campo de treinamento, fora da arena. A luta estava acabada.
Jessie respirou fundo, limpou a poeira da roupa, colocou os fios de cabelo que saíram do rabo de cavalo para trás da orelha e foi em direção ao companheiro de luta, que agora estava sentado no chão apoiando os braços nos joelhos e se lamentando por não ter ganhado a batalha.
— Deixa eu te ajudar. — Jessie estendeu a mão para ajudar Poah a se levantar. — Foi uma bela luta! Parabéns!
— Bela luta não adianta. — Ele se levantou sem a ajuda da moça. — Ou você ganha, ou você perde. Se essa luta fosse de verdade eu estaria morto agora!
— É por isso que treinamos.
Ele se afastou limpando a sujeira da roupa e arrumando a armadura no corpo. Foi até os troncos e se sentou junto aos outros. Jessie caminhou até o meio da arena e esperou para enfrentar o próximo adversário.
O próximo que se levantou foi Matt Saraf, da casa de Saraf, seria uma batalha entre irmãos de tribo, as mais empolgantes.
Ambos pararam frente à frente em posição de ataque.
— Pronta para perder Jessie?
— Se eu fosse você eu não contaria com isso Matt.
O sino tocou e Matt avançou arena adentro com os braços para trás, parecendo bolar algum tipo de ataque surpresa. Enquanto ele avançava, rapidamente Jessie calculou sua trajetória e previu onde daria seu próximo passo, fazendo com que ele tropeçasse e caísse. Enquanto Matt caía, Jessie lançou uma rajada de força por baixo dele e outra contrária por cima, fazendo-o girar e cair de barriga no chão, ficando sem ar.
Matt sentiu a força do impacto e ficou um pouco tonto, tentou recobrar a consciência o mais rápido que pode, pois conseguia ver Jessie se aproximando para um novo ataque. Serrando os punhos concentrou energia e se lançou ao ar com um único impulso, não conseguia flutuar, mas conseguia se lançar à grandes alturas. Quando subiu ao ar, ainda deitado, girou para trás chutando duas grandes ondas de energia, que acertaram a moça em cheio, deixando-a sentada no chão.
Caindo com uma perna dobrada e a outra apoiando um dos braços, em posição de reverência, pode ver Jessie tentar se levantar, então colocou as duas mãos no chão em frente ao corpo e girou o tronco com as pernas abertas, lançando rajadas de energia em círculo, que fizeram todos caírem ao chão, inclusive os espectadores atentos.
Sik levantou-se rapidamente, tentando se recompor do susto e da fraca dor que sentia em seu peito.
— Parem os dois. As regras são claras. Não podem acertar ninguém além de seus oponentes. A luta está acabada.
Todos se recolocaram aos seus lugares. Da arena, Matt olhou para o pai, que o encarava com um olhar desaprovador, e desfez sua posição de ataque, quando, sem esperar, foi atingido por um ataque de Jessie, que o fez girar no ar e cair no chão. Todos urraram.
Perplexo pelo ataque, Matt socou o chão com energia, se colocando em pé.
— Você não escutou garota? A luta acabou!
— Acabou agora!
Jessie jogou o rabo de cavalo para o lado, com um ar de superioridade, e caminhou em direção aos troncos, deixando a arena, tarefa que foi interrompida quando um galho voou pelo chão e a acertou nos tornozelos, a fazendo cair.
— Não é você que decide quando a luta acabou!
Jessie se virou com raiva, como ele pode fazer isso com ela? O encarou por alguns segundos e se colocou em posição de ataque.
— Muito menos você!
Os dois correram um em direção ao outro, lançando rajadas de energia que se colidiam no ar e geravam uma forte força de impacto, fazendo tudo e todos do campo de treinamento tremer.
Quando chegaram perto um do outro, Jessie atacou Matt, tentando o fazer cair, ele, prevendo o ataque, se lançou ao ar e atacou Jessie, lançando uma forte onda de energia que a jogou ao chão.
— Eu mandei os dois pararem!
Sik fez um movimento com as mãos e lançou os dois ao ar, deixando-os envoltos de uma força que os prendia. Aos poucos eles se aproximaram dos troncos, segundo os movimentos de Sik.
— Qual o problema dos dois? Não sabem escutar uma ordem? Ambos estão fora do treinamento por hoje. Eu vou soltar os dois agora e não quero nenhuma gracinha, ou mando os dois de volta. Entendido?
Ambos concordaram com a cabeça, assim Sik fez outro movimento e os dois caíram no chão.
— Agora, enquanto nós treinamos, Matt, você vai buscar suprimentos em Gaila para a próxima semana, — Sik deu um colar que trazia no pescoço para o filho. — e leve Jessie com você.
— O que?! Eu não posso levar ela junto.
— E eu não posso ir junto com ele!
Os dois começaram a falar ao mesmo tempo, cada um dando mais motivos para não irem juntos buscar suprimentos do que o outro.
— O assunto aqui já está encerrado e resolvido.
— Mas pai...
— Matt, já chega! Vocês dois vão juntos agora até a clareira, vão abrir o portal, pegar suprimentos e voltar. Assunto encerrado.
Os dois se olharam emburrados, mal podiam acreditar no que havia acontecido. Um culpando o outro pela decisão de Sik.
Matt e Jessie se dirigiram até a Casa Grande para pegar suprimentos, enquanto na arena Clancy e Yhuan já iniciavam mais uma batalha.
Os dois subiram as escadas em silêncio, mal podiam se olhar.
— Se você não tivesse me atacado depois que Sik tinha terminado a luta eu estaria indo sozinho até Gaila agora!
Jessie parou um degrau acima dele, olhou para ele com raiva e esticou o dedo em sua direção.
— Se você não tivesse levantado e revidado eu poderia estar naquela arena agora ganhando de mais um. Então fecha essa boca e vamos logo pegar suprimentos, pois quanto mais rápido formos, mais rápido voltamos, e mais rápido eu me livro de você!
Ela se virou e subiu os degraus rapidamente. Matt sentiu a cabeça esquentar, Jessie o deixava totalmente irritado, e acreditava que o mesmo acontecia com ela.
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A NONA TRIBO
FantasyPrimeiro livro da série -A Nona Tribo A Nona Tribo - O Despertar E se o mundo à sua volta e você fossem conectados e se misturassem de uma maneira que um novo e impressionante leque de possibilidades se abrisse à sua frente? Se sua concepção de exis...