Luzes e Sombras.

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O calor da tarde ainda pairava no Dendê, mas uma brisa suave trazia um alívio temporário. Sara e Wilbert estavam sentados em uma cadeira de plástico, do lado de fora da pensão de dona Joana. O movimento estava calmo naquela tarde: as pessoas passavam apressadas, e o som da música ao longe se misturava com as risadas das crianças brincando. A vida seguia seu curso no morro, mas para Sara e Wilbert, aquele momento tinha um sabor diferente.

Nos últimos dias, tudo parecia estar prestes a explodir. As tensões políticas, os acordos secretos, a sensação de que algo maior estava por vir. Mas, por agora, eles estavam ali, conversando, desfrutando da companhia um do outro.

Foi então que uma voz os interrompeu.

— Ei, vocês dois! — O tom descontraído de Charles trouxe Sara de volta à realidade. Ela levantou os olhos e viu o gringo se aproximando, com a câmera pendurada no pescoço e um sorriso curioso no rosto.

— Fala aí, gringo. — Wilbert respondeu, com um sorriso de lado. — O que você está aprontando por aqui?

Charles deu uma risada, colocando as mãos na cintura enquanto olhava para o casal.


— Estava fotografando umas crianças ali perto, sabe? — Ele apontou para um grupo de meninos jogando futebol no fim da rua. — E vi vocês dois aqui. Achei que eram um casal muito bonito. — Ele sorriu, com a expressão descontraída de quem estava se divertindo. — Não querem uma foto?

Sara olhou para Wilbert, que a encarou por um momento. A ideia de ter uma foto juntos parecia algo simples e natural.

— Por que não? — Sara sorriu, levantando-se. — Vamos fazer isso.

Wilbert assentiu, um pouco surpreso, mas também com um sorriso genuíno no rosto. Sara deu alguns passos para a frente, se afastando da mesa, e Wilbert a seguiu. Ele parou atrás dela, envolvendo sua cintura com os braços, trazendo-a para mais perto, com os corpos se tocando suavemente sob a luz suave da tarde.

Charles, com a câmera pronta, deu algumas instruções rápidas.

— Vamos lá, só um sorriso. — Ele ajustou a lente, olhando através da câmera. — Isso, fiquem naturais.

Sara e Wilbert se olharam, e, por um breve momento, tudo parecia em perfeita harmonia. O clique da câmera ecoou no ar, e Charles baixou a lente, observando o resultado.

— Perfeito. — Ele sorriu, satisfeito. — Vocês dois têm uma boa química. Acho que a foto ficou ótima.

Sara, ainda sorrindo, se aproximou de Charles e olhou para a câmera, admirando a imagem. O retrato deles, juntos, era simples, mas bonito. Ela nunca tinha pensado em ser fotografada daquele jeito antes. Algo sobre o momento fez seu coração bater mais rápido, e uma sensação de curiosidade tomou conta dela. O que mais poderia se capturar através de uma lente?

— Eu gostei dessa foto. — ela comentou, quase sem pensar.

Charles, que já pensava em guardar a câmera, percebeu o interesse no olhar de Sara. Ele levantou uma sobrancelha, surpreso.

— Você gostou mesmo? Eu posso te ensinar um pouco sobre fotografia, se você tiver interesse. A câmera não é difícil de manusear. — Ele sorriu, gesticulando para a câmera. — É só entender como capturar a luz, a perspectiva, e claro, o momento certo.

Sara olhou para ele, pensativa. Ela nunca tinha pensado em fotografia antes, mas algo na ideia a atraía. Talvez fosse o modo como ele falou sobre isso, com tanto entusiasmo e paixão.

— Sério? Eu adoraria aprender. — Ela sorriu com empolgação, tocando na lente da câmera. — Como funciona isso aqui?

Charles passou a câmera para ela, ajustando as configurações de forma simples.

— Bem, essa aqui é uma câmera profissional, mas o básico é o mesmo. Primeiro, você precisa entender a luz. A luz define tudo na fotografia. — Ele a guiou, mostrando como ajustar o foco e a exposição. — Agora, tente tirar uma foto de Wilbert. Veja o que acontece com a luz e como o rosto dele muda dependendo do ângulo.

Sara, com um pouco de hesitação, posicionou a câmera e, com um movimento cuidadoso, clicou. Ela observou a imagem na tela, percebendo pela primeira vez o poder de capturar algo com os próprios olhos. O sorriso de Wilbert, a luz suave da tarde, tudo estava ali, como um fragmento de tempo congelado.


— Uau. — Ela olhou para Charles, surpresa. — Isso é... incrível.


Ele sorriu, satisfeito com o interesse dela.


— Eu sabia que você ia gostar. — Ele deu uma risada leve, pegando a câmera de volta. — Só não me faça perder meu trabalho com essas fotos bonitas demais, hein?


Sara e Wilbert riram, o ambiente mais leve, como se o peso dos dias anteriores tivesse sido aliviado, mesmo que por um breve momento. Enquanto Charles se afastava, indo em direção à outra parte do Dendê, Sara ficou em silêncio, ainda absorvendo a sensação de ter capturado aquele momento. Algo estava começando ali, algo que ela mal podia entender, mas que já a atraía com força.


O que ela não sabia é que a fotografia se tornaria, mais tarde, uma das suas formas de expressar o que as palavras não podiam. Mas por agora, ela apenas sorriu, olhando para a foto de Wilbert, pensando sobre como a vida era feita desses pequenos momentos.


E talvez, só talvez, ela tivesse encontrado algo novo para se perder.

Impuros - Nossa Liberdade.Onde histórias criam vida. Descubra agora