Calíope Braga

➑. 𝒜 𝓂𝒶𝒾𝓈 𝒷𝓇𝒾𝓁𝒽𝒶𝓃𝓉ℯ

- Bem, eu falei. A porta dos fundos quase sempre está deserta. - disse a loira e, de fato, não havia ninguém ali. Mas, mesmo sem almas vivas naquela região, era possível ouvir o turbilhão de vozes abafadas pelas paredes. Era como um som ambiente e constante, já que um timbre se emendava no outro. Escutar todas aquelas melodias humanas fez Calíope sentir um imenso frio na barriga. Afinal, já fazia uns bons anos que a garota não presenciava tanta gente em um só lugar, e só de pensar em todos aqueles olhares de julgamento sentiu falta de ar e sua respiração começou a ficar pesada. - Pelos deuses, você está com medo! - exclamou Seth, maravilhada.

- Será que dá pra calar a boca, ô seu projeto de Melaleuca. - Lilly rebateu, esbaforida, enquanto a loira se afogava em risadas. Ela riu tão fácil de sua desgraça que a menina ficou querendo saber de onde tinha saído tanta intimidade. Com toda certeza eu devo ter cara de palhaça, pensou a Braga.

- Se te consola, não tem porque estar assim. É só fazer uma cara neutra e não falar nada e todo mundo vai supor que você é alguém quieta e misteriosa. Acredite em mim, eu faço isso toda vez que não desejo conversar. E sempre funciona.

Calíope deu um suspiro profundo e se recostou na porta. Tinha sido uma péssima ideia ir tão arrumada. Agora, seria impossível não chamar atenção. Ela fechou os olhos e contou até dez, enquanto tentava se convencer das palavras de Seth.

- Tá. Só me dá uns minutinhos. - falou Lilly, se recuperando.

- Você é meio fraca, não é? - comentou Seth, provocativa. Calíope, então, que antes já se estressava com a personalidade detestável da garota, deu um passo de supetão, e, na força do ódio, girou a maçaneta. Você nem faz ideia, pensou menina antes de entrar.

• • •

A dupla entrou em uma antecâmara, a qual continha dois bares de drinks, algumas poltronas e sofás para descanso e uma escultura icônica feita de gelo no formato dinâmico de uma luta entre um tigre e um lobo ou, pelo menos, entre seus análogos alienígenas. Nas mesas de bebidas, alguns espumantes soltavam fumaças coloridas, que se dobravam em figuras simples como corações e estrelas, que dançavam no ar.

Ainda naquele cômodo, o duo rapidamente chamou atenção por mais motivos que Lilly desejaria. Primeiro, o fato de suas figuras serem praticamente opostas uma à outra, como se fossem um yin yang itinerante. Se isso não fosse o suficiente para chamar sua atenção, então seu olhar poderia ser tragado pelas peças magníficas que trajavam, as quais se distinguiam de qualquer outra presente, e tinham um aspecto místico, quase divino. Ainda que nada nesses últimos dois motivos fosse o bastante para lhe prender, Seth por si só já era um imã de olhares. Parecia que algo nela intrigava curiosidade nos espectadores, que ansiavam pelo próximo passo da garota. Ela, que há pouco tempo agia como uma criança, se vestiu da personalidade inicial. Transparecia seriedade e dominância e seu sorriso servia apenas para deixar as pessoas mais desconfortáveis. A Calíope também eram destinadas encaradas, principalmente de alguns dos mais velhos, que a notavam e franziam as sobrancelhas, como se reconhecessem nela similaridade impressionante com outrem, ou como se observassem um rosto familiar não identificável.

Já ao entrar no salão principal, que lembrava um auditório em sua forma, porém com um aspecto rebuscado dos tempos do rococó, esbanjando lustres colossais e pinturas detalhadas em suas paredes, além de mobílias caras e mesas enfeitadas com castiçais de ouro, a dupla se deparou com um casal de mesma idade. A menina, uma ruiva de cabelos longos e olhos de um vermelho como o de maçã, tinha uma expressão séria. Empurrava seu par, como se algo que ele dissera a tivesse irritado. Este segundo tinha uma pele parda e seus cabelos negros se encontravam jogados para o canto do rosto. Seus olhos eram verdes e longos e suas sobrancelhas grossas. Quando notaram a ilustre presença da dupla, rapidamente fizeram reverência.