Claudia me ligou todos os dias desde o enterro, mas eu não queria conversar. Assim como meus pais também não queriam. Estávamos todos de luto, mas cada um reagia de uma forma diferente. Meu pai bebia, minha mãe se trancava no quarto e eu saia. Não suportava ficar dentro daquela casa com aquele clima de velório todo santo dia. Já havia se passado uma semana desde o enterro, meus pais estavam se arrumando para a missa de sétimo dia de Sarah, mas eu não queria ir. Já tinha me despedido. Não queria ir até uma igreja apenas para orar por Sarah, podia muito bem fazer aquilo em casa, ou em qualquer lugar que eu estivesse.
Liguei para a clinica outra vez durante a semana e a mesma mulher me atendeu. Por sorte uma paciente tinha desistido e eu acabei pegando seu horário. Já estava no ponto de ônibus quando meu celular vibrou.
Peguei o aparelho para ler a mensagem antes de subir no ônibus.
"Nanda estou preocupada, por favor, atenda o celular".
Enfiei o celular no bolso da blusa quando ele começou a tocar. Paguei o cobrador passando pela catraca e me sentei no primeiro lugar vazio que encontrei.
Apertei o botão verde do aparelho.
-- Você ia morrer se me atendesse?
-- Oi Claudia. - disse.
-- Estou preocupada com você Nanda.
-- Não tem com o que se preocupar. - disse.
-- Como não? Estou te ligando há dias. Você nem ao menos respondeu minhas mensagens.
-- Tenho uma consulta com um medico. - disse tentando parecer indiferente. Mas aquilo me fez pensar se a pessoa que ia tirar a criança de dentro de mim era considerada um médico.
-- Pensei que você só ia tirar os pontos no final do mês. - disse -. E achei que ia com você.
-- Não vou tirar os pontos.
-- Você está bem? Perguntou parecendo preocupada.
-- Acho melhor eu desligar. - disse sentindo minha garganta ficar apertada.
-- Não desliga, por favor. - pediu com certa urgência.
-- Não se preocupe, eu estou bem. - menti.
-- Me conta, por favor, o que está acontecendo com você Nanda. - suplicou.
Pensei em encerrar a ligação, sentia que estava prestes a começar a chorar.
-- Se não vai tirar os pontos então o que vai fazer no medico? Perguntou quando eu não disse mais nada. - Aconteceu alguma coisa? Você está doente?
Ela sabia meus pontos fracos, sabia que se continuasse insistindo eu acabaria falando o que iria fazer naquele maldito consultório.
-- Estou gravida - sussurrei sentindo algumas lagrimas começarem a escorrer pelo meu rosto.
Ouvi sua respiração entrecortada do outro lado da linha.
-- O-o que? Espera, acho que não ouvi direito. - ela esperou que eu repetisse. - Você está falando serio?
-- Sim.
Esperei que ela me chamasse de irresponsável, ou de burra. Mas isso não aconteceu. Claudia gritou maravilhada do outro lado da linha.
-- Está me dizendo que vou ser tia? Perguntou de forma inesperada. - Essa é a noticia mais feliz que eu poderia receber. - Pude ouvi-la rindo do outro lado da linha.
Aquilo me fez sorrir, fazia muito tempo que não ouvia Claudia rir.
-- Claudia. - chamei. Minha voz soava como se eu estivesse chorando.
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Um fio de esperança. {EM REVISÃO.}
Non-FictionA primeira vez que ouvi falar em anorexia, não tinha mais do que 12 anos. E naquela época eu não conseguia entender como uma pessoa podia ter nojo da comida. Não sabia nada sobre o assunto. Até descobrir que Claudia estava indo por esse caminho tão...