LISBELA: Muito longe... Termina distraindo.
Perto demais! Tem que ficar bulindo os olhos pra ver a cena.
A gente tem que sentar numa distância certa da tela.
DOUGLAS: Aqui tá beleza?
LISBELA: Não, um tiquinho mais pro meio. Aqui!
DOUGLAS: Mas por que aqui?
LISBELA: Porque aqui na frente tem dois casais, e no meio deles um lugar vazio. Pouca gente vem ao cinema sozinho. Aí vai ficar essa brecha na minha frente.
DOUGLAS: Mas na minha frente ficou o maior cabeção, aí!
LISBELA: Quando começar ela vai arreando na cadeira, você vai ver.
DOUGLAS: Lisbela, tu é escoladona em assistir filme, hein?
LISBELA: Shiiii!
DOUGLAS: Pô, mas nem começou ainda!
LISBELA: Mesmo assim. Antes do filme se fala baixinho.
DOUGLAS: Parece que a gente tá rezando.
LISBELA: Eu adoro essa parte. A luz vai apagando devagarzinho. O mundo lá fora vai se apagando devagarzinho. Os olhos da gente vão se abrindo. Daqui a pouco a gente não vai nem mais lembrar que tá aqui.
DOUGLAS: Pô, é preto e branco!
LISBELA: Eu acho bonito.
DOUGLAS: Atrasado de montão, aí! Lá no Rio de Janeiro só passa filme colorido. Que tipo de história vai ser?
LISBELA: Comédia romântica com aventura.
Tem um mocinho namorador, que nunca se apaixonou por ninguém até conhecer a mocinha.
Tem uma mocinha que vai sofrer bem muito, porque o amor do mocinho é cheio de problemas.
Tem um bandido que só quer saber de matar o mocinho, ou de ficar com a mocinha, ou as duas coisas.
Tem uma mulher que também quer o mocinho, mas ele não quer nada com ela.
E tem também mais uma ruma de personagens que vão ficar fazendo graça para animar a história. Uns vão terminar quase tão bem quanto o mocinho e a mocinha. E outros quase tão mal quanto o bandido, conforme eles ajudem ou atrapalhem o romance.
DOUGLAS: Você já viu?
LISBELA: Não, mas é sempre assim.
DOUGLAS: E qual é a graça?
LISBELA: A graça não é saber o que acontece. É saber como acontece. E quando acontece.
A gente vai conhecer um monte de pessoas novas... Um monte de problemas que a gente não pode resolver, que só eles podem. Vamos ver como. E quando.
Está começando.
LELÉU: Povo de Paudalho, onde há vida há esperança. E o que eu trago aqui dentro desse carro não é milagre, não é macumba, não é catimbó. Não vacina contra sogra, não combate praga de madrinha. Ele não dá cabelo a careca, braço a cotó... Nem vergonha a quem não tem. A mercadoria que tenho para oferecer não cura todos os males, mas só um: o mal de amor. Não dá jeito em todas as doenças, mas apenas em uma: a fraqueza do homem. Não alivia todas as dores, mas acaba com a pior delas, que é a dor de corno. Sim, meus amigos. Os senhores sabem como é isso. O cidadão trabalhou o dia a pulso, e quando chega em casa à noite, não resolve mais o tereré. Quando a esposa passa a mão por cima dele, ele diz assim: "Chegue pra lá, Maria, chegue pra lá. Depois! Vamos resolver essa história mais tarde".