II - 1959

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Depois que meu pai sai, a única coisa que me resta a fazer é arrumar aquela bagunça em seu devido lugar. Guardo as roupas na pequena cômoda que está ao lado da cama, e vou vasculhar o lugar.
O quarto é pequeno e há um banheiro do lado direito que eu entro para ver. Me deparo com uma banheira antiga que provavelmente não funciona, e um chuveiro comum. Resolvo aproveitar que não há ninguém e tomo um banho para refrescar aquele dia exaustivo.
Após alguns minutos debaixo daquela água quente e revigorante, ouço um barulho vindo do quarto.
"Claro que não, Johan" - uma menina, provavelmente, esganiça.
"Eu estou falando, aquele garoto não é normal" - elas param por um instante quando eu desligou o chuveiro "Olha, a cama está ocupada"
"Deve ser menina nova"
Antes que elas continuem a conversa, me arrumo rapidamente e saio do banheiro abafado. As duas meninas me encaram enquanto eu tento secar meus cabelos vermelhos molhados.
"Oi, meu nome é Jasmine" a loira se levanta e se apresenta. Ela é bonita, e está usando uma calça jeans boca de sino colorida e uma bandana na cabeça.
"Oi, meu nome é Atlas" digo tímida, enquanto dou um beijo na bochecha dela.
"Atlas? Tipo, o livro de geografia?" ela sorri.
"Uhum" retribuo o sorriso.
"Velho, eu queria ter um nome desses".
A menina atrás tosse discretamente e eu olho para atrás de Jasmine. A garota está usando um óculos escuro e uma bengala.
"Atlas, Johan. Johan, Atlas" a loira diz.
"Oi" ela diz e eu sorrio "Ah, sim. Eu sou cega." ela termina.
Fico sem reação mas depois Jasmine sorri e muda de assunto.
"Eu estou no quarto ao lado, o 13, então qualquer coisa pode chamar." assinto "Já deu uma passeada por aqui?" ela pergunta animada.
"Não"
"Cara, você tem que ver cabana da Sra. Fields"
"A coordenadora?" gargalho.
"Sim, ela guarda muitos vinhos antigos para comemorar as ocasiões da escola, aí às vezes a gente rouba alguns"
Johan tosse de novo, e Jasmine ri.
"Calma, Johan. Ela parece ser gente boa. Você não vai contar para a Fields, vai?" ela me encara.
Faço um sinal negativo com a cabeça.
"Ótimo, agora vamos lá antes que escureça" ela diz e me puxa para fora do quarto, seguida de Johan.
Passamos pelo corredor e descemos a escada devagar para ajudar Johan, e saimos do alojamento.
Lá fora a temperatura está amena, o sol está para se pôr, e os pais já foram todos embora. Alguns meninos estão encostado em um carro quebrado preto, enquanto conversam.
"Oi Carl. Oi Dann. Oi Harry" Jasmine grita e acena para eles. O último garoto, dos cabelos cacheados, sorri e começa a andar até nós.
"Achei que não vinha para cá esse ano" ele diz quando se aproxima.
"Anne não deixou?" Johan pergunta.
"Você conhece a minha mãe, acha que aqui é um perigo. Mas eu falei para ela que o Bill Gates tinha estudado aqui e ela deixou" ele riu.
"Você não cansa de mentir?" Johan indaga "Tia Anne acha que até o Einstein estudou aqui"
Ele dá de ombros.
"Não ligo se ela é idiota o suficiente para cair nessa. Não vou ficar em casa. Não com aquele homem."
Ele olha para mim e depois vai embora, sem ao menos se apresentar.
"Não liga, ele é assim, tem um problema sério com o padrasto e sempre fica bravo quando falamos que ele está errado" Jasmine diz.
Rude, ignorante, e do mesmo alojamento que eu. Droga. Penso.
Jasmine puxa meu braço e começamos a andar de novo.
***
"Aqui é aonde a gente come às vezes" ela termina de mostrar o pátio do lado de fora.
Andamos mais um pouco até perto da cerca verde-amarela onde não poderíamos passar. A cabana da Sra. Fields, que na verdade se parece com um banheiro químico, está lotado de garrafas e quase não conseguimos abrir.
"Ela reabasteceu hoje de manhã, aposto" Johan sussurra. "Melhor levarmos uns para o Josh"
"Ele quase teve uma 'overdose' de vinho ontem. Tem certeza?" Jasmine diz discretamente.
"Ah, é." ela para um instante "Mas ele disse que se não morreu aquela vez, não morre mais. Ele tava tão bêbado que não sei como foi para a escola no outro dia"
Jasmine ri, e por uma abertura quase que imperceptível puxa uma garrafa de vinho.
"1959. Uau" ela lê e assobia. "Esse é bom. Gosta de vinho, Atlas?"
"Meu pai comprava quando minha mãe morava com a gente. Eu tomava um copo por mês e era ruim"
"Eu também não gosto. Nem o Josh, eu acho. Mas ele diz que te faz parecer intelectual e não sei o que mais, e como não temos outra coisa para tomar além do suquinho da cantina, eu me acostumei com o gosto"
Sorrio de lado enquanto saimos rapidamente.

Já está escuro quando chegamos no centro do campus perto dos alojamentos, e há uma fogueira acesa. Algumas pessoas estão sentadas ao redor dela, um garoto toca violão e uns cobertores são arrumados no chão.
"Ótimo. Passagem" Johan diz. Com certeza ela sentiu o cheiro de fumaça.
"O que?" pergunto.
"É um ritual que eles fazem para os novatos. Vocês vão lá, falam da sua vida e blá blá. É um saco. Mas se não fosse por isso eu não teria conhecido o Sam"
"Eu tenho que ir?" pergunto olhando as chamas. Ela assente quieta.
Antes de ir, vou com elas ao alojamento guardar o vinho, e depois de alguns minutos descemos até onde a fogueira está. Já está lotado de gente ao redor, e eu me sento ao lado de Johan por que Jasmine está com o suposto Sam, seu namorado.
"O que eu faço?" sussurro para Johan.
"Nada. Fala seu nome, de onde você veio, como era sua vida fora daqui, por que veio e se está gostando"
O "nada" dela não é o mesmo que o meu.

Quando todos começam a se apresentar, chega a minha vez. Peter, o garoto do último ano que começou a fogueira, deu a deixa para mim. Me levanto e percebo que o tal Harry está abraçado com uma menina morena, então começo a falar.
"Atlas, 17 anos, segundo ano, mora em Atlanta com meu pai. Não tinha muitos amigos na antiga escola, então as despedidas não foram demoradas. Conheci pessoas legais e lugares legais" terminei de falar, eles aplaudiram e passou para a vez de outro garoto.

Depois que a fogueira foi apagada, subi com Johan para o quarto e todos fizeram o mesmo.
Deitei na cama e sem nem pestanejar, já estava dormindo.

Oeeee gente, então, nesse capítulo deu pra ter uma ideia de como é a High Tone e tals, bem, espero que tenham gostado.
Aceito críticas construtivas.
Um beijoooo :x

Through The Dark // H.S.Onde histórias criam vida. Descubra agora