Oxford Street

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Naquela noite chovia. O inverno chegou e com ele o frio dos sentimentos - ninguém sorria, ninguém ria; todos se preocupavam em correr da chuva.

Passos molhados, rápidos e escorregadios, percorriam a rua provocando o barulho reconfortante do chapinhar da água. Da janela dos apartamentos, os observadores curiosos viam com prazer o movimento da rua.

Um casal apontou na esquina, correndo dos pingos gelados. A garota corria na frente e o rapaz logo atrás. Uma senhora os observava da janela de um dos apartamentos; brincou consigo mesma, imaginando suas escapadas quando mais nova.

Mal sabia aquela senhora que aquele casal não estava escapando. Eles sequer corriam da chuva - para falar a verdade, eles corriam do tempo.

Haviam se conhecido numa noite chuvosa como essa, meses atrás. Ela trabalhava no café que os amigos do rapaz o convenceram a ir. Suas primeiras palavras trocadas foram: "Pare de sujar a mesa que eu estou tentando limpar.". Desde então, ele visitou o estabelecimento todos os dias, só para sujar a mesa que ela limpava.

Seu primeiro encontro fora num parque. Ele nervoso, ela indiferente. Para ele, conquistá-la parecia impossível. Para ela, esperar por um beijo que talvez nunca viesse era totalmente aterrorizante.

O primeiro beijo deles demorou o tempo que os custou entenderem que sempre quiseram a mesma coisa. Acontecera numa tarde ensolarada, de frente ao metrô, em meio ao barulho dos carros e de pessoas apressadas para chegarem ao seu destino. Nenhum dos dois jamais o esqueceu.

Meses se passaram e o que antes eram flores, viraram ervas daninhas. O carinho consumiu-se num afago costumeiro, indiferente. O antigo amor, apesar de existir, fora eclipsado por contrastes de vida que muitas vezes os impediam de viver por completo um ao outro.

Hoje pela manhã ele a convidara para sair. Ela não pode - tinha de servir as mesas naquele mesmo café onde se conheceram. O mesmo café que ele não visitava mais e cujas mesas ele parara de sujar só para fazê-la sorrir.

Marcaram então de sair à noite. Já chovia quando finalmente se encontraram no cinema. Durante todo o filme ele não a tocou sequer uma vez, embora tenha reclamado do emprego dela como garçonete e de seu simples apartamento de apenas um cômodo.

Antes de o filme terminar, a jovem garota decidiu partir. Não havia mais nada que a prendesse a ele, não como antes. O rapaz a seguiu, sem conseguir entender o porquê de ela não o querer mais. Entretanto, assim que ela partiu, a ideia de realmente perdê-la abalou-o tanto quanto um tiro no peito.

Então o rapaz correu. Correu, com seus passos afundando nas poças de lama da chuva. Viu sua amada na esquina da rua, desolada, a chuva ensopando suas roupas como grandes lágrimas solitárias. Ela não podia deixá-lo! Ele tinha de alcançá-la o mais rápido possível. Apressou o passo.

Da mesma janela da rua, a senhora ainda os observava brincar na água. Como eram divertidos os tempos de juventude! Saudades de quando podia passar o tempo daquela mesma forma com o finado marido.

A garota não conseguiu correr mais e parou. O rapaz a alcançou, abraçando-a logo em seguida, aninhando-a em seus braços para protegê-la da chuva. Ela sentiu seu abraço, seu cheiro e seu carinho por uma última vez antes de se despedir. E voltou a seguir seu caminho, a chuva lavando as lágrimas que restaram de seu primeiro amor.

Mas que pena que ela já estava indo embora, pensou a senhora ao ver a moça sumir no fim da rua. Sua curiosidade minguou. Será que um dia ela veria aquele jovem e feliz casal de novo?

Fechou a janela. Do lado de fora, as pessoas agora saíam de seus esconderijos. A chuva havia cessado; a Oxford Street continuava a mesma de sempre.

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