Se você ainda não chegou a 1998 nos Diários, este POV contém spoilers
A Naomi estava em um mau humor incrível. Eu ainda não entendi o problema dela, pois tenho um milhão de amigas e ela se dá com todas, menos com Kate, Singe e Rê. Quando perguntei, ela respondeu que a Kate tem um ego enorme, Singe só fala de crianças e a Rê não tem uma célula de humildade. Cara, elas são mesmo assim, mas elas também são muito mais que isso. É foda quando a sua mulher não se dá com as suas amigas, pior ainda quando não suporta três das melhores. Então, hoje, assim que eu desliguei o telefone com a Kate e disse que ela queria que nós fôssemos lá à noite, a Naomi inventou um jantar com o Gary.
-Já temos compromisso, Eddie. Não posso fazer nada se a Kate avisou em cima da hora.
-E o Gary avisou quando? – Perguntei, sabendo que o próximo passo dela seria se trancar em algum lugar e ligar pro Gary pra tentar fazer aquele jantar acontecer.
-Desde... o início da semana.
-Bom, mas você só me avisou agora. E em cima da hora por em cima da hora, eu vou à Kate.
-Pois eu vou ao Gary.
-Ok, mande um abraço pra ele.
Puta que pariu, tenho saco pra milhares de coisas. Aliás, para praticamente todas as coisas. Sou o tipo de cara que vive a vida pra não se estressar, sabe? Mas não tenho paciência nenhuma pra Naomi tentando evitar os meus amigos.
Fomos então, com Naomi reclamando o tempo inteiro. Cheguei a desejar que realmente o Gary tivesse telefonado e ela tivesse ido ao jantar dele. Felizmente moramos perto e, quando estivesse no apartamento, ela não ia poder ficar resmungando. Mas, conforme diminuía a velocidade para parar o carro em frente ao prédio da Kate, uma pessoa em pé embaixo de um poste de luz chamou a minha atenção. Era uma mulher pequena, a luz a deixava com um brilho dourado, ela parecia indecisa, como se estivesse de pé em uma encruzilhada. Era uma puta cena linda e não acreditei que não tinha trazido a câmera. Eu sempre a levo a todo e qualquer lugar, mas a Naomi me perturbou tanto que acabei esquecendo. Desci do carro e dei a chave para o manobrista completamente no automático, sabe, sem perceber o que estava fazendo, e então a mulher olhou pra mim.
Juro que foi como receber uma descarga elétrica no corpo, a adrenalina subiu, caralho, acho que até comecei a suar, e olha que estava um frio de rachar.
-PUTA QUE PARIU! – Eu ouvi a minha voz, então acho que fui eu quem disse.
A mulher levou um susto, obviamente sem me reconhecer. Mas cara, aqueles olhos, aquela boca perfeita, aquele ar inocente, eu a reconheceria mesmo que hoje tivéssemos oitenta anos.
-Malu? É você?
Ela continuou piscando sob o poste de luz, confusa.
-Sou eu, o Eddie!
A boca perfeita se abriu em um sorriso e ela correu para me abraçar, e acho que nem quando senti os seus braços ao redor do meu pescoço eu consegui acreditar no que estava acontecendo. Foram tantos anos, que realmente cheguei a pensar que a Malu era sonho. No início eu tinha certeza absoluta que ela voltaria, quando ela estivesse bem, ela voltaria, mas o tempo passou e finalmente me conformei que ela estava bem em outro lugar e eu jamais a veria novamente, e então comecei a me perguntar se eu realmente a havia visto algum dia. É que não foram anos fáceis, e nem eu mesmo estive presente no meu corpo a maior parte deles.
Ouvimos um pigarro do nosso lado, me lembrando que existia Londres à nossa volta.
-Naomi, essa é a Malu, de quem eu já te falei. Uma das minhas melhores amigas no mundo – Eu tive de soltar a Malu, mas ela continuou segurando as minhas mãos. – Malu, essa é a minha mulher, Naomi.
-Prazer – Naomi estendeu a mão e Malu a apertou, embora, com a outra, continuasse de mãos dadas comigo.
-Muito prazer – Malu respondeu e imediatamente se virou pra mim, enquanto entrávamos na portaria. – Me conte tudo, Eddie! Tudo!
-Porra, eu não, conte tudo você!
Fiz milhares de perguntas e não recebi resposta para nenhuma, pois a Malu me perguntava um milhão de coisas também. Mas não tinha importância, pois só o que eu realmente queria saber era se ela estava feliz. O acordo silencioso e completamente unilateral que havíamos feito tinha sido esse: Ela podia ir embora, desde que fosse feliz. Bom, era o que parecia. Ela decididamente sorria muito. Sem dúvidas estava limpa. E, se estava aqui, havia uma boa chance de que não tivesse mais medo. Mas era pouco, era muito pouco. Eu precisava sentar com ela, como nos velhos tempos.
Até que Naomi pigarreou de novo e percebemos que já estávamos no andar da Kate, em frente à porta aberta. Quis ter levado a câmera mais uma vez pra tirar uma foto da cara do pessoal. Porra, queria tirar uma foto da minha cara!
Não sei se ela estava feliz mesmo, mas definitivamente estava bem, casada, morando em Paris e prometeu vir sempre, inclusive pro nascimento da filha do Mick. Foi então que o telefone tocou e Kate começou a esbravejar daquele jeito dela, pois era o Tom dizendo que não viria.
Imediatamente, olhamos todos pra Malu.
O foco mudou rapidamente, pois parece que virou esporte predileto falar mal da Lana. Não entrei na brincadeira porque, primeiro, não é a minha praia, e segundo porque não tenho nada contra ela. Seu casamento com o Tom foi uma merda, o que não faz dela uma merda como pessoa e, além do mais, eu mesmo não mereço exatamente uma medalha nessa categoria. Então olhei pra Malu. Ela não participava da discussão e poderiam até creditar isso ao fato de ela não conhecer a Lana. Só que a Malu é transparente pra caralho.
Eu a conheço há dez anos. Tento esquecê-la há dez anos. Há muito pouco que eu não tenha tentado, nada surtiu efeito, fiz muito mal pra mim mesmo, perdi toda chance e esperança de ter uma família e por muito pouco não matei a mim e a Amber no processo. Mas, naquele momento, quando percebi que nada havia mudado e vivíamos presos em Saint-Malo para todo o sempre, eu capitulei. Me rendi. Não luto mais. Sou seu, Malu, faça de mim o que quiser, me dê o papel que achar mais adequado. Só, por favor, não saia mais da minha vida.
---
Esse POV faz parte da Semana do Eddie, que está acontecendo no grupo Realidades Paralelas da Mari
VOCÊ ESTÁ LENDO
O Lado Escuro da Lua
RomantikEsse livro é uma coletânea dos POVs de Canções da Minha Vida e Diários de Malu, à venda na Amazon.com.br. Essas visões dos personagens foram escritas pelas leitoras e, algumas, pela autora, e nasceram de uma brincadeira no grupo Realidades Paralelas...