O Peregrino

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Eu tinha largado os negócios. Não dava mais para ser um corretor de seguros, atendendo pessoas 24hs, ouvindo desaforos, tendo que me equilibrar na corda bamba, todo final de mês. Estava ficando louco.

Dei um beijo em minha mãe, despedi-me de meus filhos e pedi à minha ex-esposa que cuidasse deles enquanto eu estivesse fora. Ela não teve objeções. Vendi todas as minhas coisas, fiquei só com a casa. Tranquei tudo e viajei, à princípio, para Santiago de Compostela. Não gostei. Achei um saco. Cheguei a gritar para os céus "Mas que diabo estou fazendo aqui nesse mundo? Eu vim só para sofrer? Qual o sentido disso tudo?". Eu estava no limite.

Como não tinha amarras, saí de lá de noite mesmo. Vaguei.

Uma carona aqui. Um ônibus ali. Atravessei alguns lugares de barco, junto de povos estranhos. Caminhei por estradas longas. Só eu e minha malinha. Comi e bebi o mínimo. Cheguei a jejuar, pedindo a tal "iluminação". Chorei, blasfemei. Gritei várias vezes, porém, antes do sol nascer... todos os dias eu estava a caminhar.

Estava bastante quente, muito mais do que eu gostaria e suportava... Eu estava com fome, sede... Insano. Desabei.

O interessante é que aqui não sei dizer se perdi a consciência ou... não sei. Não quero parecer mais louco do que pareço. Mas eis o que vi: quando eu desabei e a poeira subiu, eu vi um vilarejo imponente sob inúmeras montanhas.

Eu tenho quase certeza de que era apenas um local vazio, mas não foi o que vi. Havia pessoas, com aquelas roupas dos filmes, como togas brancas. Homens com panos cobrindo somente seu sexo, musculosos. Bradavam espadas e escudos pesados. Aquilo parecia... Sparta. Eu sei, eu sei! Eu sei que é insano! Mas, por favor, fique! O que realmente quero contar vem agora...

Alguém me puxou pela camisa, me olhou torto e perguntou num tom perigoso:

- Quem é você, estranho?

Eu tomei um susto tremendo! O cara era tão musculoso que se eu apanhasse dele com certeza iria parar na UTI.

- E-e-eu estou perdido! E-e-eu.. eu me chamo...

Ele soltou um "ahr!" e me soltou.

- Não me interessam mentiras. - bufou, esperando eu me levantar sozinho - Venha comigo, sem gracinhas.

Segui o fortão, tremendo. Se você fosse só um ex-corretor de seguros, acostumado a ficar pregado na cadeira e trabalhando on-line o dia todo você me entenderia.

As pessoas mal me olhavam. Somente as crianças, que treinavam com espadas reluzentes ao lados dos adultos, é que perdiam algum tempo levantando a sobrancelha, curiosas.

As casas, fantásticas, eram todas... eu nem sei como descrever isso! Você certamente já deve ter visto as ruínas da Grécia Antiga. Agora imagine aquilo de pé, polido, belo... Pedras brancas, uniformes. Que casas magníficas! Que colunas! Meu professor de Artes do Ensino Médio iria enlouquecer.

Então ele parou, me puxou pela camisa e sussurrou:

- Faça como eu.

Levantou os braços e, em voz alta, anunciou-se:

- Grandes Deuses! Permita nossa entrada em sua moradia! Queremos ver a Sacerdotisa e o que a sorte nos prevê!

A porta, de ferro, se abriu. Mais uma vez, eu o segui.

O local era escuro, apenas algumas poucas tochas me salvavam de não enfiar o nariz nas paredes. Meu coração começou a acelerar, inexplicavelmente, enquanto minha mente mantinha-se apenas confusa. Guardas empunhando espadas e usando elmos medonhos nos aguardavam.

- Galen, quem é o gordo que traz com você?

Ok. Eu só estou 5 quilos acima do meu peso ideal.

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