somewhere

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LOUIS' POV

Meus olhos estão mais claros do que o normal.

Quando éramos adolescentes, Harry dizia que meus olhos eram de um azul intenso, como o oceano quando eu estava feliz, ou como o céu quando eu chorava. Hoje, meus olhos não se assemelhavam nem ao oceano e nem ao céu. Estavam mais comparáveis a um dia nublado, dos densos e sem cor. Profundos. Sorrio fraco para o meu reflexo no espelho ao deixar nos lados de meu pescoço duas gotas de colônia Hollister; ele sempre elogiou este perfume. Franzo as sobrancelhas com o contraste do terno preto com o par de Vans de mesma cor, mas não ouso mudar nada. Harry sempre me vestiu e sempre fui elogiado, o que deve significar alguma coisa. Com as roupas que imagino que ele me faria usar, me sinto parcialmente satisfeito. Talvez eu finalmente tenha aprendido.

Não vejo a hora de encontrá- lo. Contei as horas, os minutos, e finalmente o momento está chegando. Quero olhar em seus olhos e dizê- lo que o amo, como faço todos os dias. Só que hoje será diferente, o que faz minhas palmas suarem e calafrios percorrerem minha coluna eventualmente. Bagunço um pouco os cabelos, como se buscasse algum tipo de aprovação inexistente, e dou uma última olhada no espelho antes pegar as tulipas vermelhas e sair de casa.

Durante o caminho aperto o volante com força e meu olhar vai ligeiramente de um lado ao outro, me fazendo parecer quase paranóico, checando a cada segundo o buquê no banco do passageiro. Ter as flores favoritas de Harry ao meu lado me faz sentir algo reconfortante, mais próximo e palpável. É como se o dia estivesse congelado, constantemente prendendo- me na rotina de esperar e esperar por algo que não sei o que é e que nunca chega. Os sinais estão mais demorados, as travessias mais longas e o tempo parado. Após secar o suor de minhas mãos pela enésima vez, avisto meu destino. O foco de minha visão passa a se concentrar apenas no mesmo ponto, e ao descer do carro me guio diretamente para a entrada do lugar. Ao passar pela entrada principal, não consigo decidir entre parar onde estou e não mover mais um único músculo ou simplesmente continuar a caminhar com segurança. Antes que possa pensar, estou lá. O lugar está consideravelmente cheio - mais do que eu desejaria para um encontro com Harry -, mas é claro que não posso simplesmente fazer com que todos saiam, então me sento em uma das cadeiras de uma fileira vazia no fundo da sala e espero por Harry em silêncio.

Estou ansioso para vê- lo.

Algumas pessoas vêm me abraçar, e da forma mais educada que encontro, recuso seu afeto e peço que me deixem esperar por meu marido sozinho. Me mexo no assento desconfortavelmente diversas vezes, até que me convença de que não há maneira de me sentir bem de alguma forma ali e me levante. Coço a nuca, examinando os arranjos de flores vermelhas e segurando contra meu peito as que eu mesmo trouxe. Minha respiração está acelerada e meu coração, descompassado; porém, sinto como se tudo parasse por um segundo, no instante em que as grandes portas na direita do salão abrem- se e posso ver meu garoto.

Eu gostaria de dizer que seu jeito único de caminhar me captou de forma que não pude fazer nada além de sorrir. Gostaria de dizer que a felicidade em seus olhos iluminou o ambiente um pouco mais do que apenas a luz que entrava pela janela. Gostaria de dizer que ele corou ao que beijei sua bochecha, e que correu os dedos longos pelos cabelos, lambendo sutilmente os lábios ressecados pelo inverno.

Mas, infelizmente, ver Harry, coisa que sempre me alegrou, tornou- se subitamente um trauma; algum tipo de medo. O tipo de medo do qual é preciso passar as cobertas pela cabeça ao dormir, e dar a mão para alguém ao andar no escuro. O tipo de medo que fez com que as tulipas escorregassem de minhas mãos e meu peito se apertasse.

Ao que seu ataúde é posto cuidadosamente sobre o balcão de mármore o silêncio instala- se, tornando a atmosfera de pêsame e tensão quase visível. Continuo observando- o a distância, temendo me aproximar e constatar a verdade, mesmo que eu já a conheça cruamente. O oxigênio exaure meus pulmões de forma que a única saída que encontro é me segurar em uma das esculturas de gesso e arregalar os olhos, esperando que o a vida voltasse ao meu corpo tão rapidamente quanto o deixou por aquele momento.

somewhere / larry stylinsonOnde histórias criam vida. Descubra agora