1 Capítulo

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By now you should’ve
somehow realized
what you’re
not to do.
     “Wonderwall ” , Oasis

Você acha que é fácil mudar seu jeito de ser.
      Você acha que é fácil, mas não é.
      O que você acha que é preciso fazer para se reinventar como uma pessoa totalmente nova, uma pessoa coerente, que pertence a algum lugar? Você mudaria as suas roupas, o seu cabelo, o seu rosto? Vá em frente, então. Faça isso. Fure as orelhas, corte o cabelo, compre uma bolsa nova . Mesmo assim eles verão quem você é. Eles verão você, a menina que continua assustada, que continua se fingindo de esperta, que está sempre um passo atrás, que continua sendo — sempre — a errada. Mude o que quiser, mas isso você não pode mudar.
      Eu sei disso porque tentei.
      Não nasci para ser popular. As coisas não tinham como acontecer de outro jeito. Se eu soubesse o momento exato em que tudo começou a dar errado, poderia voltar no tempo, olhar para mim mesma e dizer: “Escuta só, Elise de dez anos, dá pra tirar esse suéter vermelho enorme com pompons de lã pendurados? Sei que é o seu preferido porque parece ser muito especial, só que não é. Não queira ser especial”.
      É isso o que eu diria para o meu eu mais jovem se pudesse apontar o momento em que me perdi. Só que esse momento nunca aconteceu. Sempre fui perdida.
      Eu tinha os mesmos colegas desde a pré-escola. E eles já sabiam o que eu era muito antes que eu mesma me desse conta. No quarto ano , eu já não era nada popular. Como é possível alguém já ser esquisita no quarto ano? Naquela época, tudo não se resumia a usar pulseirinhas da amizade, sonhar acordada com cavalos e fingir que solucionávamos mistérios?
      Mas, de alguma forma, mesmo no quarto ano, eles sabiam. Uma garota nova se mudou do Michigan para a nossa cidade naquele ano. Nós duas costumávamos nos sentar no pátio durante o recreio, enquanto as outras meninas brincavam de pega-pega, e conversávamos sobre o coven de bruxas que eu queria formar. Eu tinha acabado de ler um livro sobre bruxaria e o meu pai me deu alguns incensos que eu achava que poderíamos usar. E então, certo dia, no parquinho, Lizzie Reardon chegou para a minha nova amiga e disse, com a maior naturalidade:
      — Não passe tanto tempo com a Elise. Você pode acabar ficando parecida com ela.
      E eu estava bem ali do lado delas. Aquilo não era nenhum segredo. Eu era um peso na vida das pessoas.
      Isso aconteceu no quarto ano. Mudamos de escola no sexto ano. A escola nova tinha o dobro do tamanho do colégio antigo. Depois, fomos para uma escola de ensino médio que era o dobro do nosso colégio de ensino fundamental ii . Mas de alguma forma todos os novos alunos imediatamente percebiam como eu era estranha.
      Era uma coisa óbvia. Quando eu era criança, a minha mãe costumava me levar para brincar com outras meninas: Kelly, Raquel, Bernadette Então, no quinto ano, Kelly se mudou para Delaware, Raquel convidou todas as garotas, exceto eu, para a festa de aniversário dela num rinque de patinação e Bernadette me mandou um bilhete para me informar de que ela só brincava comigo porque os pais a obrigavam.
      Eu também costumava brincar com os garotos da vizinhança quando era pequena. Construíamos castelos no verão e fazíamos bonecos de neve no inverno. Mas, quando estávamos no ensino fundamental II , todos começaram a pensar em namorar , o que significava que nenhum menino queria ser flagrado brincando na neve comigo, ainda mais se a pessoa em questão pensasse que ele poderia estar a fim de mim. Porque, obviamente, estar a fim da Elise Dembowski era a coisa mais estúpida que um garoto de onze anos poderia fazer.
      Assim, no final do sétimo ano, eu estava sozinha. Tudo bem, ainda tinha o pessoal com quem eu nadava durante os verões que passávamos na casa da minha mãe, à beira do lago. E também os filhos dos “amigos” dos meus pais que às vezes iam lá em casa para jantares em família, embora nenhum deles fosse exatamente da minha idade. Mesmo assim, eu não tinha ninguém que fosse meu de verdade.
      No último verão, depois do final do primeiro ano do ensino médio, decidi que as coisas não podiam continuar daquele jeito. Eu simplesmente não suportaria. Não que eu quisesse ser Lizzie Reardon, a capitã do time de futebol; ou Emily Wallace, que fazia alguns trabalhos como modelo adolescente; ou B rooke Feldstein, que poderia ficar com qualquer garoto da escola (e era exatamente isso o que ela fazia). Eu não precisava ser a garota mais interessante do mundo, nem a mais bonita ou querida. Apenas não queria mais ser quem eu era.
      Você acha que é fácil mudar. Que é como num filme, aquela s equência com música pop ao fundo em que a menina horrenda se transforma de patinho feio com óculos fundo de garrafa num cisne líder de torcida. Você acha que é fácil, mas aquela foi uma missão que tomou todo o verão. Eu assistia à tv como se estivesse fazendo o dever de casa, anotando quem eram aqueles personagens e desenhando esquemas a respeito dos programas de que cada um deles viera. Toda semana eu lia revistas femininas e de fofocas, testando os meus conhecimentos enquanto estava na fila do caixa na farmácia. “Quem é aquela mulher na capa da Marie Claire ? De que reality show ela participou?” Todos os dias eu abria mão de horas de sol para ficar curvada sobre um computador, lendo blogs de moda, de celebridades e de perfumes. Você sabia que existem sites sobre perfumes? Qual é o sentido disso?
       A única coisa que não consegui fazer foi ouvir música pop. Tentei durante quase uma hora e por fim desisti. Aquilo era ruim. E nem era o tipo de ruim-interessante, como os filmes a que eu assistia sozinha, anotando quais falas de uma comédia romântica faziam com que a plateia risse. Música pop não era ruim-interessante, era ruim- ruim . Vocalistas que abusavam do Auto-Tune e que, na verdade, nem sabiam cantar; orquestrações tão simplistas que chegavam a ser uma ofensa; melodias irritantes. Como assim, eles achavam que eu era idiota?
       Eu teria dado praticamente qualquer coisa para mudar, mas não ia engolir aquilo. Eu odiava aquele som mais do que eu odiava ser eu mesma todos os dias. Assim, me dei por satisfeita ao ler sobre os artistas pop na internet e fiz uns cartões que me ajudaram a memorizar quem era quem até que eu me sentisse pronta para conversar sobre eles. E não ouvi mais nenhuma música sequer.
      Passei todo o verão nisso. Dez semanas, sem parar, exceto pelo tempo que eu estava comprando discos, o final de semana em que tentei consertar o computador do meu pai e a semana que fui obrigada a passar na casa do lago, onde não há televisão nem internet. Tudo bem, rolaram algumas interrupções, mas, mesmo assim, acredite em mim quando digo que passei o resto do tempo do verão dando o maior duro para me tornar descolada.
      Pensando bem, aquele deveria ter sido um sinal de alerta. Dar duro no que quer que seja, por definição, não é nada descolado.
      Na semana que antecedeu o início das aulas, saí para comprar algumas coisas. E não fui simplesmente às compras, fui ao shopping . Eu estava pronta. Sabia o que deveria vestir — já tinha lido tantas Seventeens àquela altura que podia dizer de cor as cinco melhores marcas de rímel sem parar para pensar.
       Eu sabia exatamente o que fazer, mas não consegui cumprir a missão. Eu não ia gastar cento e cinquenta dólares num jeans. Nem dar trezentos numa bolsa. Qual é, Kate Spade, você não vai tirar uma com a minha cara. É só uma bolsa. O Greenpeace me manda bolsas pelo correio o tempo todo — e de graça. Bem, está certo que elas são enviadas em troca de uma doação de vinte e cinco dólares, mas, fala sério, esse dinheiro vai para salvar as baleias, não para pagar por ecobags cujo preço de custo não deve ser mais que um ou dois dólares.
      Os meus pais me deram algum dinheiro para comprar roupas para o início das aulas. Eu também tinha as minhas economias, mas me senti culpada por gastar tudo em roupas que eu nem mesmo queria . Quer dizer, eu ainda tinha vontade de parecer uma pessoa descolada, só que não estava nem um pouco a fim de ir à falência durante o processo.
      A situação deve ser bem diferente para as meninas que sempre foram populares. Provavelmente, quando elas vão às compras, precisam apenas de um tênis novo ou um cintinho. Mas eu estava me reinventando do zero.
      Conferi cada uma das peças no meu armário. Quais delas eu poderia levar comigo na minha nova vida? Os conjuntos de moletom estavam fora de cogitação. Aquele jeans, quem sabe? Embora as bainhas estivessem fora de moda. O suéter, talvez, se eu trocasse o decote.
      Eu achava que não havia nada de errado com as minhas roupas. Eu até mesmo gostava delas. Tinham uma história para contar. O sári indiano que transformei num vestido de verão. A camiseta dos Ramones que comprei num brechó na rua Thayer, tão detonada que só podia ser uma autêntica relíquia dos anos 1970. As botas brancas com estampa de unicórnios porque, apesar de eu já ter quinze anos, ainda achava que, se os unicórnios existissem, eles seriam os animais mais legais do mundo.
      Mas é esse o problema comigo. Exatamente esse. Eu não apenas tinha aquelas roupas, como gostava delas. Depois de dez semanas aprendendo o que as pessoas de verdade faziam, eu ainda gostava das minhas roupas totalmente inadequadas.
     Assim, joguei todas as minhas roupas totalmente inadequadas em sacos de lixo, que fechei com o nó mais apertado que consegui dar, como se as botas de unicórnio pudessem tentar arquitetar uma fuga. Escondi os sacos no sótão da casa da minha mãe. Depois, fui até uma loja de departamentos em busca de todas as peças modernosas que eu conseguisse encontrar. Mesmo em uma loja dessas, o preço total acabou sendo maior que tudo que eu já tinha gastado em qualquer uma das minhas visitas a brechós. Senti até enjoo quando olhei a nota.
      Mas a felicidade por acaso tem preço? Sério, se esse é o preço de estar feliz por ser você mesma, então não vale a pena?

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⏰ Última atualização: Sep 01, 2015 ⏰

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