O choro alto se juntou aos sons de arquejo que banhavam aquela noite fria, o cheiro de sangue e suor estava impregnado no ar. Uma mulher estava deitada no chão de madeira de uma pequena e velha cabana no meio de um bosque escuro, uma garota que aparentava ter dez anos estava ajoelhada aos seus pés segurando o bebê responsável pelo choro nos braços.
- É um menino, - anunciou a criança com uma voz firme.
A garota segurava o bebê sujo de sangue e não parecia se importar muito com o detalhe.
- Deixe-me vê-lo, vamos, eu quero vê-lo, - murmurou a mulher enfraquecida.
Ela tinha o vestido emaranhado e sujo entre as pernas e o rosto banhado de suor, as mãos tremiam quando ela envolveu o bebê e o desceu aos seios.
- Ele é lindo, esses olhos pratas em chama... Ele será como o pai... Um guerreiro... Forte... Fiel... Tire a corrente do meu pescoço e ponha envolta do dele e não importa o quanto ele chorar não o tire, é para o bem dele.
A menina tirou a corrente da mulher e fez como ela instruiu. O bebê gritou e se contorceu, a pele envolta do pingente que abraçava a corrente começou a ficar avermelhada, o tridente deixava uma marca azulada na pele imaculada da criança recém-nascida.
- Está queimando ele, - disse a menina horrorizada.
- O pingente foi banhado no rio mais profundo de Atlanta sete vezes, para cada uma das sete virtudes de um guerreiro. Ele foi moldado pela mão das ninfas mais puras de Leviósa e beijado pelos lábios do próprio Hélio. É uma honra usar essa corrente... E ele deve usar desde já, o tornará forte.
A mulher levou o filho ao seio e fez o choro dele terminar com a oferta de alimento.
- O nome dele deve ser Jáspiey, como meu pai, como o rei, como milhares antes dele foram. É um nome que carrega poder. Você vai cuidar dele até chegar o momento certo, não o leve para casa Eynihis, quando chegar o momento ele irá sozinho.
- Por que diz isso senhora? Será você a cuidar de teu filho, não precisa disto.
Então a mulher olhou a criança com grandes e perspicazes olhos. Depois olhou ao filho mamando em seu seio, e então olhou novamente a criança.
- Eu não estarei aqui para o meu filho. Será você, Eyni. Agora vá pegue ele e vá.
- Ir? Como assim ir? – Perguntou a menina horrorizada.
- você não pode ouvir? Eles saíram do mar e estão vindo me buscar...
A menina ficou pálida como cal.
- e-e-ele-es? – gaguejou.
- pegue-o e desça em direção ao deserto, Eyni, minha boa e fiel amiga, e que os deuses lhe acompanhe. Mas vá! Agora, Eyni!
A jovem pegou uma manta e enrolou em volta do bebê. Com lágrimas nos olhos fugiu pela única porta da cabana degradada carregando-o nos braços. O pequeno permaneceu silencioso até o amanhecer, todo o caminho que menina passara correndo sem dá um pio. Mas então quando os raios de sol começaram a dissipar a escuridão a menina gritou e caiu de joelhos na areia amarelada do deserto. O bebê se pós a chorar tão alto que provavelmente podia ser ouvido á quilômetros de distancia.
A menina se levantou tremendo e ofegante, a mão sobre o peito por onde uma mancha de sangue se espalhava, uma mancha quase idêntica a que surgia no peito da criança que ela carregava só que a do menino era dez vezes menor. Mas ela sabia que não fazia diferença, o significado era o mesmo:
A mulher deixada para trás estava morta. Pelos deuses... Abriély estava morta. A princesa de Atlanta estava morta.
...
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Atlanta
AdventureSereias e Atlanta. A submersa cidade de Atlanta tem herdeiros bondosos, e reis malvados, e nesse mundo há deuses e um olimpo. Há paixões vorazes e maldições necessárias.