"A cidade de Ünderhall. Ó, como ainda se mantinha erguida, majestosa e inalterada, não se rendendo às forças inóspitas e incessantes desta região", pensou Niridas, enquanto parava o cavalo na base do morro e fitava com grande admiração a abandonada cidade élfica.
Já havia se passado algumas horas desde que haviam deixado o posto avançado de Arcorrio, há milhas dali. Fora uma caminhada lenta, marchando por regiões de relevo acidentado, de montanhas congeladas e árvores mortas, onde várias vezes a montaria havia dando lugar à caminhada. Agora, já no fim do dia, a comitiva contemplava uma vasta imensidão branca, com a cidade dos elfos no coração da planície.
Os tempos antigos de glória e esplendor ainda reluziam em suas altas e pontudas torres, quase a tocar o céu. Os detalhes nas torres eram nitidamente visíveis do morro de onde a comitiva estava posicionada. Janelas de arco quebrado rodeavam as torres mais altas, em formatos de pirâmides finas e alongadas, criando únicos padrões de perfeição e simetria arquitetônicas. Os tons cinzentos e de fuligem predominavam nas paredes daqueles prédios e casas, que outrora eram preenchidos de vida e calor. Entre a Montanha ao leste da cidade, corria o grande e calmo rio Elnyr, vindo do nordeste e fazendo uma grande curva ao redor da cidade e então seguindo para o sul.
- O sol já começa a partir para além das montanhas. - falou Niridas, olhando diretamente para o sol escarlate. Sua voz soou branda e serviu de alerta para os outros homens se agruparem. - Nossos cavalos não aguentarão a nevasca que vem com os ventos da noite.
Os riscos e efeitos que trazia após o pôr-do-sol nas terras geladas eram de conhecimento de todos, mas Niridas fazia questão de tornar a repetir. "Esses jovens inexperientes... Avisá-los sempre de alguma coisa nunca é demais", pensou desdenhadamente. Era o dia em que os jovens guardas eram levados para fora das muralhas da cidade para expedições. Começavam de manhã, acompanhando o sol que se levanta ao leste, e após uma série de reconhecimentos dos locais dentro do perímetro do Reino de Túridan, partiram para mais longe. Uma série de outros treinamentos para novos aspirantes a cargos no Exército estavam sendo realizados, alguns estavam se realizando paralelamente e outros ainda aguardariam alguns dias para serem realizados.
O grupo era composto por alguns filhos de nobres e alguns filhos de camponeses, estes por último levavam alguma vantagem por conhecer as regiões mais a fundo que os outros. Mas, ali aonde se encontravam, era longe de qualquer lugar por eles conhecidos; era muito longe de casa, e mais longe ainda do fim do trajeto deles. Conhecer a região por completo era uma característica que os diferenciaria muito, mas não era o único motivo que estava sendo buscado ali. Niridas buscava algo que os testassem, que os batizassem. Estavam seguindo toda a extensão do rio Ardan - que se localizava à sudoeste de Túridan - e o dia, que partia aos poucos, fora tranquilo; o que significava que ainda precisavam seguir caminho. Mas o restante do grupo não sabia de tal metodologia. "E um tempero de surpresa", brincara Niridas enquanto refletia sobre o que fazer, alguns dias antes, quando fora lhe encarregado essa missão.
Largou um pouco seus pensamentos e, sem virar para eles, indagou:
- Sabem aonde estão?
Todos estavam acompanhando sua visão e murmuraram, com curiosidade, que não. Então ele, começou a explicação:
- Ünderhall - virou para fitar seus rostos. Alguns cerraram as sobrancelhas como se já tivesse ouvido aquele nome em algum lugar. Balançou a cabeça em desaprovação e continuou: - Ünderhall.. a antiga e, arrisco até dizer, mitológica, cidade dos elfos da neves! Estão lembrados agora? Não importa... Há alguns anos aqui era uma rica cidade, como vocês podem ver por essa arquitetura - seu tom de voz possuía um conhecimento profundo, carregando de lembranças enraizadas em sua mente - Tudo que suas vistas alcançam foram construídas de maneira muito bem pensada...
E o que suas vistas alcançavam era uma cidade com várias casas, em sua maioria na cor cinzenta, devido aos materiais do qual seus tijolos eram feitos; baixas e coladas bem próximas das outras. As ruas, extremamente retas e seguindo caminhos com medidas precisas e padronizadas, eram sempre repletas de casas e prédios em suas margens, todos possuindo geometrias harmoniosas e adereços, ornamentos e decorações próprias. Mas isso só era visível em alguns poucos pontos da cidade, que sobreviveram aos efeitos do tempo e da neve; em outros cantos a neve se acumulara de tal maneira que, ruas desapareceriam, e casas estavam com paredes cobertas por camadas de gelo, telhados e decorações estavam sucumbindo no chão.
- É como a vida nos ensina: tudo que é belo sucumbe com o tempo e com eles não haveria de ser diferente - refletiu e, quando acabou, acompanhou com os olhos dois jovens montados se aproximarem do grupo.
Eram Ghroi e Dant, ambos encarregados de verificar se havia alguma mata capaz de abrigá-los. O grupo estava numa grande clareira branca e próximo a eles só era visível o rio, a cidade e mais nada. O céu estava nublado, ventos uivavam por entre rochas longínquas, e a noção de espaço e magnitude eram perdidas naquele imenso vazio. Ambos os batedores eram magricelos, mas a quantidade de capas e panos que usavam para se cobrir emprestavam a eles um aspecto redondo. Logo que chegaram, anunciaram:
- Não achamos nada que pudesse nos abrigar.
- Apenas vimos, de longe, uma mata fechada para lá além do rio, mas a neve estava pesada para lá, com uma ventania forte carregada de neve. - complementou Dant logo em seguida. Tinha pouca altura e uma barba pouco volumosa se formando em seu rosto, mas ainda era muito jovem para ostentar qualquer feição madura. Seu cabelo era longo e pouco tratado - Até lá é neve pura nos quatros sentidos, muito fácil se perder.
Niridas mexeu os olhos ao redor, vendo poucas alternativas. Observou, por um tempo, os portões trancados da cidade, e notou que as rajadas de neve lançadas pelo vento, eram detidas pelas várias torres que se encontravam paralelas ao Portão Sul da cidade. Percebeu ainda um cubículo perto do portão, escondido por entre as estruturas, que aparentava ser uma guarita. Por fim, declarou:
- Os grandes portões da cidade serão nosso abrigo esta noite. Não ousem sair de perto. Estamos em terras estrangeiras e nada disso aqui nos é conhecido! - e logo em seguida, balançou as rédeas do cavalo, descendo pela leve inclinação do morro, seguido pelos outros seis membros. Deixavam um rastro profundo na neve que, em poucos segundos, voltava a se recompor novamente, como uma criatura viva.
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Guerras do Gelo - Sonhos de dragão
Fantasía"Os ventos dos norte traziam consigo previsões tenebrosas para as regiões geladas no extremo norte do continente, as terras dos reinos de Gomdril, Anduril, Aigdursil e dos elfos ao leste. Se alguma força do mal estava ressurgindo de volta ao mundo...