Prólogo

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Fechei os olhos ao sentir aquele perfume conhecido.

Ele estava ali e todo o meu corpo parecia sentir sua presença, demonstrando através dos arrepios que cobriram cada centímetro da minha pele. Meu coração disparado não ficava para trás e minhas pernas estavam bambas, então eu apenas agradeci a Deus por estar sentada e com a cabeça abaixada, para que ninguém visse minha expressão de sofrimento.

Mas não tinha jeito. Eu teria que continuar a minha vida, da mesma forma que fazia antes de conhece-lo. Seria difícil, eu teria que dar um jeito de superar, por mais que não soubesse como iria fazer tal coisa.

Afinal, a quem eu estava querendo enganar? Ele havia deixado marcas em mim que nem o tempo seria capaz de apagar. Era como uma cicatriz no rosto, impossível de não notar todas as vezes em que se olha no espelho. Esse foi o efeito dele em mim.

E não tinha mais volta.

- Professora? - uma voz conhecida chamou, mas eu estava perdida demais em meus pensamentos e na minha auto piedade para falar com alguém.

- Dois minutos. - resmunguei, sabendo que todos os alunos me olhavam, provavelmente achando que eu estava louca. Bom, talvez eles estivessem certos.

Me obriguei a respirar fundo algumas vezes e decidi que não iria me levantar naquele dia. Por mais que eu tivesse depilado as pernas apenas para usar o meu vestido favorito. Nem mesmo ele havia feito meu humor melhorar, então não havia necessidade de mostra-lo.

- Bom dia. - cumprimentei os alunos que responderam com hesitação assim que levantei minha cabeça.

Será que meu rosto estava tão horrível quanto eu me sentia por dentro?

- Hoje, em nossa aula, teremos o objetivo de discutir sobre onde a literatura se encontra no mundo em que vivemos. Iremos falar sobre a ficção que pode estar em qualquer lugar, em qualquer diálogo, música, livro, filme, série e até mesmo na nossa vida. Até que momento a realidade acaba e a ficção começa? A metáfora pode ser considerada uma ficção? - levantei meu tom de voz para que todos pudessem me escutar sem esforço e evitei olhar para aqueles olhos que me encaravam de um jeito quase incômodo.

Porque ele estava me encarando daquele jeito? Era ridículo e estava me desconcentrando.

- Então, vamos interagir... - continuei. - Eu quero que alguns de vocês me deem um exemplo de metáfora em algo que vocês já escutaram, assistiram, leram... Quem vai começar?

Brittany, minha aluna preferida - é claro que ninguém, além dele, sabia daquilo - levantou uma mão e eu sorri, fazendo um gesto para que ela falasse.

- Eu li uma frase na internet esses dias, era bem engraçada e eu acho que pode ser considerada uma metáfora. - ela pegou o celular e leu em voz alta. - Minha vida é aquela conta de matemática enorme que eu errei por causa de um sinal.

Alguns da turma soltaram uma risada, outros apenas sorriram e eu forcei um sorriso para não deixa-la sem graça. Nada iria melhorar meu humor naquele dia, nem se aparecesse o melhor humorista do mundo na minha frente.

- Bom, pode até ser, mas eu preciso de algo mais complexo. - pensei um pouco antes de continuar, as informações estavam bagunçadas na minha cabeça. Era melhor ter ficado em casa e inventado que estava doente. - A metáfora é uma figura de linguagem onde se usa uma palavra ou uma expressão que não é comum, mas que serve para passar uma mensagem. Quem tem um outro exemplo?

Uma mão se levantou, perto da minha mesa. Oh, não. Eu não estava preparada para aquilo. Ele dificilmente se pronunciava nas minhas aulas. Por quê agora? Por quê logo nesse dia em que ele estava ciente do meu estado emocional? Aquilo só podia ser brincadeira. E uma brincadeira de muito mau gosto.

- Eu encontrei uma metáfora em uma música do Adam Levine que eu ouvi em um filme que gosto muito. - meus olhos automaticamente encontraram os dele e meu estômago revirou.

Eu poderia nunca mais toca-lo, poderia nunca mais abraça-lo ou até mesmo beija-lo. Mas pelo menos eu ainda tinha um período. Mais seis meses, em que eu iria poder admira-lo e sofrer silenciosamente. Era um martírio, mas eu me encontrava estranhamente aliviada por me lembrar desse fato.

- E qual foi? - minha voz era firme.

Se tinha algo de que eu me orgulhava, era de não transparecer minhas emoções na minha voz. Eu conseguia falar normalmente, mesmo estando destruída por dentro, mesmo que minhas feições acabem transparecendo o contrário.

Mas eu sabia de que música e de que filme ele estava falando. Era um golpe baixo. Muito baixo.

- O nome da música é Lost Stars. E a frase diz "somos todos estrelas perdidas tentando iluminar a escuridão".

E então eu entendi o motivo da participação dele na aula. Entendi o porque de estarmos totalmente afastados, entendi o porque de ter sido abandonada.

Ele estava no escuro. E talvez a minha luz não fosse o suficiente para iluminá-lo.

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