Dupla traição
Definitivamente o universo não conspirava a seu favor! - Pensou Irene ao levantar e sentir a cabeça rodar. Há dois meses flagrara seu namorado na própria cama com a melhor amiga e agora se via tendo sonhos eróticos com ele. Sentada na beira da cama sentiu a bexiga reclamar que precisava expurgar toda a cerveja, tequila, uísque..., que ingerira na noite anterior e com muito esforço cambaleou até o banheiro lembrando detalhes do sonho. Ainda sentia o cheiro, as mãos, as carícias de Anderson em seu corpo. Sua alma ainda flamejava e não entendia porque aquele sonho permanecia vivo em sua mente, porém ao sentar-se no vaso um mix de sentimentos apoderou-se de seu corpo. Não fora um sonho! Os preservativos na lixeira não deixavam dúvidas que transara com alguém naquela noite e por mais absurdo que pudesse parecer, em seu íntimo torceu para que não houvesse sido com ele. Não depois de tudo que a fizera passar, sentir e odiar. Sua vontade era permanecer ali ou quem sabe mergulhar no vaso e ressurgir em outro lugar, noutra realidade em que não houvessem Anderson, Camila, ressaca e aquele sonho que se apresentava agora como uma realidade aterradora. Ao enxugar-se sentiu uma sensação gostosa e as cenas da noite anterior remexeram-se em sua mente, mas não conseguia lembrar da cara do sujeito que a deixara assim tão sensível e como a dúvida a deixava irritada decidiu tomar um banho, o café e tão logo tiraria a história a limpo. Iria ligar para Duda. Com certeza ela saberia com quem havia deixado a boate! Enquanto a água fria corria por seu corpo ela murmurava baixinho:
- Nunca mais vou beber! Putz.
Saiu do chuveiro sentindo-se um pouco melhor e ao chegar a cozinha exclamou:
- Merda!
Havia um café da manhã preparado e um bilhete e ela sabia que aquilo só poderia ser arte dele. Hesitante, caminhou até a mesa, pegando lentamente o papel onde estava escrito:
A noite
A noite nos revela
Angústias, emoções
No palácio ou na favela
Ecoam sensações
Tequila, uísque ou cerveja
Coquetéis, brindes e perdões
Lábios sabor cereja
Corpos embrulham-se em colchões
No esquecimento
Deixo-te meu sabor
Embrenho-me em teu pensamento
Dele sou morador
Seu nego
Anderson não era o tipo de homem irresistível, porém poucos homens tinham o dom de ser cafajeste como ele e sua habilidade no sexo era irritante e desconcertante para Irene que rasgou o papel com raiva, atirando-o ao chão, pensativa. As imagens ficavam mais claras e as sensações mais presentes. Conseguia sentir as mãos dele dedilhando sobre seu corpo como se tocasse as cordas de um violão, seu beijo deslizando por seus seios intumescidos, as mordicadas nos bicos, o contrair de sua vagina à espera daquela língua maravilhosa percorrendo cada centímetro úmido e desesperado por um carinho. Viajava de olhos fechados vendo a imagem do negro alto, aquele tórax bem definido à mostra, o abdômen desenhado que levava a um mastro grosso, habilidoso, que sempre atingia todos os pontos que houvessem em sua gruta, fosse ele qual fosse. De repente, Irene percebeu que estava molhada passando a mão sobre a calcinha, sentindo o tesão crescente e tentando fugir dos pensamentos e lembranças sentou-se para tomar seu café e concentrar no que deveria fazer naquele domingo. Mentalmente criou uma lista que começava por lavar a louça e terminava por arrumar o pequeno apartamento, que naquele momento mais parecia uma república diante de tanta bagunça. Terminou seu café indo para a pia com os pensamentos e sentimentos distorcidos, mergulhando nos afazeres e a única coisa que a torturava era saber que no dia seguinte encontraria Camila, sua ex-amiga e atual namorada de Anderson. Aliás, há dois meses se perguntava porque ainda trabalhava no mesmo lugar, sabendo que seria muito mais fácil procurar outro trabalho e livrar-se daquela situação constrangedora. Desde que chegara a São Paulo conhecia Camila e possuíam praticamente a mesma história. Vieram de cidades nordestinas com a intensão de estudar e trabalhar. Se esbarraram no saguão do aeroporto e a empatia foi instantânea, iniciando-se uma série de coincidências, fazendo com a amizade crescesse, fossem trabalhar no mesmo local, estudar na mesma faculdade, curso e sala e dois anos e seis meses depois encontrasse o namorado dentro das pernas dela, em sua cama. Isso não tinha perdão! Com raiva e sensações estranhas Irene se entregou às ocupações do domingo, indo deitar por volta das vinte, cansada, caindo num sono pesado.