AINDA CRIANÇA

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Todo o modo de viver de uma criança começa no seio da mãe. Ele suga o bico e quer que o leite saia, sem muito esforço, se não ele chora. Imagine que todos os seres humanos são assim, crescem sob a crença de mamar e sair alguma coisa. Sugadores. Para Joel a história não é diferente, o garotinho de família humilde que mora em um casebre de dois andares no bairro Santa Rita em Vila Velha, um município do Espirito Santo, que é banhado pelo mar. O garoto tem ainda na infância como grande motivação de vida o peito da mãe.

Joel tem somente cinco anos de idade, mas é animado ao extremo para brincar, mesmo com a enorme quantidade de mosquitos que é obrigado a enfrentar todos os dias. O bairro cheio de valões destampados, local de onde saem os inimigos quase invisíveis. A única saída era uma bomba de inseticida que era abastecida manualmente e que expelia o veneno que matava ou tonteava os atentados mosquitos.

O casebre de pouco luxo não tem reboco, não existe telhas o suficiente para cobrir e proteger as crianças da chuva. Como grande alegria de dona Jandira está à criação das crianças. A mãe que além de Joel tem mais três crianças. Pedro Junior, João e Maria Clara. O sofrimento de dona Jandira está nas dificuldades que passa pela falta de dinheiro. O que traz muita tristeza à família. O seu marido, Clarindo, trabalha de sol a sol em uma empresa de limpeza de beira de estrada, ganha muito pouco, mas o homem é de moral. Ele luta. Não se dá por vencido e sempre há o que comer, mesmo que uma comida simples, sem muito dos pratos sofisticados e bem cheio de nutrientes da burguesia.

O que faz as pessoas felizes quando não existe dinheiro para comprar comida? A resposta parece difícil, mas não é. A cachaça não serve de alimento, mas faz esquecer o sofrimento. Clarindo bebe cachaça todos os dias, pois, seu mundo é destroçado pela pobreza. As crianças vivem sob a força e disciplina de seu pai, que os dá como exemplo o costume de beber cachaça.

O ano é 1992, Joel aos cinco anos vê o seu pai fazendo tira-gosto de linguiça na brasa, após acender dois pedaços de madeira no quintal da casa. A sua mãe que pouco pode fazer para evitar, também de alguma forma já se viciou no álcool, ela bebe mesmo enquanto alimenta o pequeno Joel, que suga um de seus seios.

Uma tarde de natal, seis anos mais tarde, em 1998. Joel e Pedro Junior brincam no quintal da casa, todos os adultos estão fora. O pai e a mãe foram comprar as bebidas e comida para a ceia da noite de natal. As crianças aproveitam para fazer as estripulias comuns da idade.

Joel sobe na laje do banheiro, a única obra de alvenaria da casa, pois todo o resto é de madeira podre, que em muitos casos é de madeira recolhida de sobras de obras, e que é doada a família. Esse material vem com cimento grudado e o resultado na aparência do ambiente não é legal. Mas para Joel nada importa, a sua pouca idade não o deixa ter noção das dificuldades.

O garoto de pernas finas, ombros estreitos e cabelo russo, não têm na sua altura mais de 1,10 metros, pouco para uma criança nesta idade, já deveria estar bem maior. Mas, mesmo assim o garoto tem uma energia formidável. No alto da laje, Joel, que subiu para pegar uma goiaba que estava pendurada em um Galho único que passara por cima do muro da vizinha, encontra o gato da família, shanim, como dona Jandira gosta de chamar. Shanim que gosta de brincar se alisando nas pernas de quem estiver por perto, agora se enrosca em Joel, e, esse o desmotiva, pois quer recolher a goiaba. Para alcançar o seu objetivo o garoto pega uma lata de tinta destas grandes e coloca sobre o pobre do gatinho. Agora sim, o Joel vai poder pegar a goiaba tranquilamente. Ele senta sobre a lata e come a fruta que de tão saborosa o faz esquecer-se do gato. Joel nem pensa em dar um pedaço a Pedro Junior que ficou em casa assistindo televisão.

A pobreza presente na vida de Joel fica mais evidente quando desce da laje e vai acompanhar os irmãos que ficaram na sala, que, além de um sofá velho, uma TV grande, parecendo uma mala, com a imagem em preto e branco, que funciona a vela e chia o tempo todo. De repente os pais entram pela porta.

O bêbadoOnde histórias criam vida. Descubra agora