Capítulo 11: Xeque-mate

930 132 93
                                    

A parede do meu quarto não era inteiramente lisa e nem totalmente branca. Em alguns lugares a tintura estava um pouco falhada em sua coloração, a deixando com outros tons de branco. E por mais que eu não tivesse passado a mão pela superfície, sabia que certos lugares tinham pequenos furos causados por pregos no passado. Tudo isso foi observado muito rápido, mesmo que não tivesse dedicando atenção a isso. Meu quarto tinha virado um forte em que poderia me esconder de pessoas - em especial Thiago -, e os detalhes dele pareciam querer me engolir como a sensação que percorria por todo o meu corpo. Fiquei tanto tempo parado, sentado na cama, olhando para a parede, que meu quarto começou a se tornar um lugar desconhecido. Quanto mais encarava os objetos, menos conhecia. Minha cabeça não estava exatamente ali. Eram apenas informações espalhadas por um cômodo que eu não conhecia mais de tanto encará-los. E isso soava tão estranho. Era exatamente como me sentia.

- Você não quer jantar mesmo? - Minha mãe insistia pela fresta da porta.

Assenti com a cabeça, levantando uma maçã intocada para acalmá-la da ideia que não comeria nada o dia inteiro.

Imaginava meu próximo encontro com Thiago. Meu estomago embrulhava enquanto a voz de Júlia ficava mais alta gradualmente toda vez que lembrava do ocorrido. Precisávamos conversar urgentemente, e dessa vez necessitava deixar tudo em pratos limpos. As meia-informações que ele me lançava para que ficasse algo subentendido, ambíguo, já tinha superado a cota aguentada por mim. Os jogos de Thiago, onde eu apenas era mais uma peça de sua brincadeira, estavam prestes a acabar. E ele se surpreenderia quando eu gritasse xeque-mate.

Antes de dormir imaginei diversos meios de abordá-lo e treinei as falas, em sussurros para as paredes nem-tão-brancas, para tentar impedir uma possível gagueira, que sempre aparecia em momentos inoportunos.

*

Todos os alunos passavam por mim e adentravam a sala de aula. Ainda estava do lado de fora, de pé, olhando mais a frente, esperando avistar Thiago ao longe para poder resolver nosso dilema o mais breve possível.

- Esperando o namorado? - Arthur sorriu enquanto caminhava para perto de mim. Parou, encostado na soleira da porta - Acho lindo esse triangulo amoroso entre vocês. A Júlia te beija também ou você não aceita?

- Para de encher o saco, Arthur - Pedro o puxou para dentro da sala, cumprimentando com um aceno de cabeça.

O professor da primeira aula apareceu no nosso corredor, e entrei na sala ao lado, para conseguir cabular os minutos iniciais de sua aula. Não entraria para aula nenhuma enquanto ainda tivesse coisas a esclarecer com Thiago. Quando o homem alto e magro passou, saí rapidamente da outra sala, caminhando em direção contrária ao professor.

Estava perto do banheiro masculino, agora vazio pós o sinal soar, esperando. Minhas unhas todas roídas me deixaram sem opções para conter a ansiedade. Migrei para o velho hábito de morder o lábio inferior. Lembrei que Eleonora me mataria ao ver minhas unhas roídas e puxei a manga da blusa para esconder as mãos, como se o ato resolvesse alguma coisa. Mas tinha tanta coisa em mente que aquilo passou despercebido.

Finalmente o vi. Mas estava acompanhado de seu pai. Ambos na porta da biblioteca. Havia mais alguém com eles, mas tinha uma pilastra na minha frente tampando a visão. O pai dele era um Thiago em uma versão mais velha. Apesar de um semblante mais bravo e começo de calvície. Supus que ele cumprimentava alguém. E com a mão bagunçando os cabelos do filho, ele se despediu indo para outro caminho acompanhado do vice-diretor da escola. Ignorei meus pensamentos que tentavam imaginar o que o vice-diretor fazia conversando com o pai de Thiago, quando vi o próprio caminhando em direção nossa sala de aula.

Todos os erros que eu cometiOnde histórias criam vida. Descubra agora