Sentava-me na mesa do fundo, à minha frente uma mesa de jovens. A velocidade a que cigarros voavam dos seus maços era exorbitante, o fumo criava uma névoa que envolvia as suas palavras.
O da esquerda levantava a mão e levava o cigarro à boca - questiono-me se o nosso tempo passa a iguais velocidades - kronos nunca fora linear e, com a idade, a nossa perspectiva da vida pode, ou não, mudar. Existe também a possibilidade de serem os cigarros: substâncias que se confundem com o seu metaquímico criando novas entalpias.
A rapariga da direita movia furtivamente as mãos, comportamento esse típico da sociedade nem que, na sua última vontade seja para chamar a atenção. Sinto falta de me contentar com essas trivialidades de café e conversas sem nexo que nunca chegam ao fim: palavras soltas que, sinceramente, não sei se os está ou não a afectar.
Luzes imanam do colo de um rapaz, desnecessário e improvável seria dispensar a tecnologia onde momentos onde nem os fotões do olhar se cruzam e intersectam. O tilintar dos copos na mesa reflectiam uma euforia que seria de esperar mas que, por mais que tentasse, eu não encontrava.
Vejo as suas almas como se de uma grande diferença de idades se tratasse quando, na realidade, presumo serem tal e qual como eu. Que alquimia é esta que me transmuta em dimensões tão nada ortodoxas que inibem qualquer nervo transmissor? Que vida está que entre cafés sem açúcar e fumo dissipado no ar transporta toda a minha alma para fora de mim? Não sou capaz de a fazer voltar...
Está a chover. As gotas ritmadas a bater na calçada desorientam qualquer tipo de polaridade nas minhas moléculas, deixam-me desconfortável. Vendia a alma a todo e qualquer Deus para que alguém também se sentisse assim.
Corpos mortos e almas deambulantes, um vazio incontrolável que não me sin na capacidade, nem tenho o intelecto necessário, para descrever. Façam-no por mim. Ou imaginem, de uma forma ou outra, por trivialidades ou não, imagino que, intrínseca ou extrinsecamente, quase todas as pessoas já o sentiram, aquele vazio.
Não tentem mudar a vida. As notas sincopadas da música ambiente vos acompanha não o vai permitir. Não há volta a dar. Não elevem a voz, a frequência é incomparável, inquebrável, entre graves e agudos nunca seremos capazes. Esqueletos ambulantes revestidos de lipídios e epidermes que encobrem os seres mundanos.
Quantos de vocês já rabiscaram papéis na ânsia de uma obra de arte e, no final do processo, se desiludiram?
Não passo de uma alma perdida num conjunto de átomos que, em combinação imperfeita com o meu metafísico, quase deixa de existir e que, repentinamente, pensa em desistir.
A cinza acumulava-se à medida que as conversas passam, grupos e falsos imanavam imanavam o ar do espaço fechado com ideias sem sentido. Estou a sufocar. Não sou capaz de me concentrar nem de me abstrair, limbo incógnito num dualismo corpóreo e mental que não sou capaz de ultrapassar.
Reparo na palete de cores, não varia muito, é algo comum: os tons obscuros da melancolia e do desentendimento. Tal qual uma tela por secar a tinta escorre, o temp passa. Escravos indomáveis da razão que inconscientemente se escondem para não se assustar. Estrelas morreram e ninguém à minha volta se parecia importar. Quantos processos e reações químicas já passaram sem que a maioria das pessoas se apercebesse, como se de um facto desinteressante se tratasse, não fosse ele o sustento da vida.
Somos socialmente uma colectividade pacífica de revoltados, sem força para lutar e sem coragem para desistir.