Aqui estou eu frente à morte. O ultimo membro de minha egocêntrica espécie. Os espíritos das florestas no fim estavam certos, acabamos por nos destruir apesar de todos os avisos e sinais. Mas quem pode nos culpar? Ninguém... todos estão mortos – parece que mesmo à beira da morte não perdi meu senso de humor -, todos exceto eu. Mas isso esta prestes a mudar.
Durante um tempo me orgulhei de sobreviver após o fim de todos. Fazia-me sentir melhor do que eles de alguma forma. Mas aos poucos a solidão foi me enlouquecendo e percebi que isso não era um mérito e sim uma maldição.
Ainda me lembro de como tudo aconteceu...
Um meteoro caiu no Oceano Pacifico, aparentemente sem maiores danos, começou a ter sua estrutura estudada por cientistas de todo o mundo. Eles descobriram que o meteoro produzia algum tipo de energia que poderia vir a substituir todas as outras que eram utilizadas pelo nosso povo. Começaram então a extrai-la e pouco a pouco ela começou a substituir os meios comuns. Petróleo, eletricidade, energia nuclear... Tudo passou a ser ultrapassado. Em menos de uma década tudo tinha sido substituído pela aquela energia que ficou conhecida como Infinito (nome dado pela característica do meteoro de produzir a energia ilimitadamente).
E foi então que os espíritos das florestas apareceram. Obviamente este não era o nome deles, mas é assim que ficaram conhecidos pela preferência por ficar em florestas. Apareceram pelo mundo inteiro, revolucionando tudo que a sociedade achava conhecer. Ninguém entendia o que eles eram. Aos poucos as religiões se moldaram para tentar compreender esses seres, os Estados começaram a tentar comunicar-se com eles, mas as únicas palavras que eles diziam, em vários idiomas, eram "Morte infinito".
O mundo não deu importância e continuou sua vida cotidiana. Até que tudo começou a desandar. Uma epidemia tomou conta da população que foi pouco a pouco dizimada. Todas mortas por um estranho tipo de câncer. Os governos de cada país fizeram o possível para reverter a situação, mas a cura nunca foi encontrada. Por fim descobriram que a fonte era o Infinito. Ela possuía um tipo de radiação desconhecida que ao ter contato frequente com as pessoas provocava a doença.
Mas ai o mundo tinha ruído. Apenas três por cento da população humana tinha sobrevivido e ainda assim já estavam condenados. Arquivos de governos de vários países foram vazados revelando que eles tinham prosseguido as tentativas de se comunicar com os espíritos da natureza. Em algumas dessas tentativas eles haviam obtido sucesso e receberam o aviso que estavam se autodestruindo com a nova fonte de energia. Mas eles fecharam os olhos para os avisos e prosseguiram sem dar relevância às advertências. O mundo (ou o que restava dele) explodiu em protesto e a partir daquele momento o mundo passou a não ter governo, lei ou qualquer tipo de regras. A anarquia tinha sido instaurada.
E a autodestruição prosseguiu. As pessoas se matavam por motivos banais até o momento em que todas desapareceram. Todas mortas... Menos eu.
É irônico como todos os humanos morreram, mas animais e plantas continuam seus ciclos normalmente. Aparentemente eles são imunes ao Infinito ao contrário dos humanos que independente da cor da pele, gênero, religião ou sexualidade foram atingidos...
Sempre tivemos a impressão que fossemos melhor que tudo e todos, que o mundo não poderia continuar sem nós, mas a verdade é que só atrapalhamos. Provavelmente o mundo estará cada vez melhor sem os humanos. E talvez essa seja a pior conclusão que eu tenha chegado frente à morte. Quanto tempo desperdiçamos nos afastando uns dos outros? Quanto tempo perdemos em nossa busca insaciável pelo poder, pelo dinheiro e pela evolução? E do que adiantou?
Durante a vida sempre estive preocupado em deixar um legado, mas agora percebo que o que tinha era um sentimento primata de eternizar meu nome. Nunca tive a real vontade de ajudar o mundo de alguma forma e agora não há mais tempo. Agora não tenho mais "todo tempo do mundo" como cansei de repetir e cantar. Agora tenho apenas alguns instantes. E gasto esses instantes para pedir desculpas... um pedido destinado a ninguém? Não, me direciono ao mundo... E também digo adeus...
O último adeus.
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Epitáfio
FantasyO que a ultima pessoa de nossa especie diria ao estar prestes a morrer? Nessa pequeno conto o narrador é o ultimo membro de nossa especie e reflete frente à morte a respeito dos erros cometidos pela humanidade e os motivos que fizeram o mundo chegar...