Passou a manhã toda e ninguém comprou a farinha de seu Mario, que começava a ficar impaciente e pensando no dinheiro que havia investido na saca.
- Dois litros de farinha, Seu Mario! Chegava o primeiro cliente do dia e pedia. Era Zé de Onofre, antigo cliente.
A farinha era medida pela lata de óleo nas mãos de seu Mario, que caprichava na enchida e sempre mandava mais do que o litro que media, deixando contente o cliente que acabava fidelizado.
Ainda enchia a segunda lata quando Adalto chegou pra fazer seu pedido.
_Bom dia, seu Mario! Bom dia Zé! Seu Mario me dê três litros!
- Dou não... to é vendendo! E ria a boca sem dentes.
-Ô Adalto, ta sabendo do bandido que pegaram em Riachão?
-Oxe, e não foi Givanildo de Tata? Já sabia que não prestava nada aquele xibungo... Uma vez me tomou duzentos reais saindo do banco, acredita?... Aquele cabrunco! Tenho dó mesmo é de Tata. Criou tão bem o moleque pra virar nisso...
- Disseram que deu tiro e tudo! Veio fugido de São Paulo!
- De São Paulo? Entrou na conversa seu Mário.
- Sim, Seu Mario! Disse que participou de um furto no Museu do Ipiranga, acredita? Levaram um monte de jóias da família real, uma mais valiosa do que a outra. Só que a Policia Federal seguiu no encalço dos caras e prendeu a todos!
_ Ouvi dizer que na fuga Givanildo perdeu um anel de Dom Pedro que vale mais de quinhentos mil reais! Ah se vem parar na minha mão... faço miséria!
- Quinhentos mil reais?! Quase gritou seu Mario, que neste instante meteu a mão no bolso onde repousava o anel que achara na viagem.
Sem tirá-lo do bolso, mas com a mão a alisá-lo, Seu Mario perguntou se havia informações de onde julgavam Givanildo ter perdido a jóia.
- Dizem que foi entre Coité e Riachão, Seu Mario. Ou entre Riachão e Pé de Serra, sei lá...
Os olhos de seu Mario brilharam feito criança quando ganha presente.
A vontade era deixar a saca de farinha ali e ir admirar o tesouro que descobrira ter achado. Adalto e Zé de Onofre ainda ficaram pormenorizando a notícia da prisão de Givanildo. Agradeceram a Seu Mario a farinha e foram se afastando. Enquanto isso, a mente de Seu Mario começava a divagar sobre as possibilidades de tornar-se recém proprietário de um patrimônio estimado em quinhentos mil reais. E em meio aos altos devaneios que o levava cada vez mais longe, um passarinho de dúvida veio pousar em seu colo. Será que o anel encontrado seria mesmo o do rei? Como ter certeza? Devia contar a alguém? Tinha medo das conseqüências. Se contasse a alguém que o obrigasse a devolver a jóia. Mas devolver a quem? A Givanildo que não seria né! Bandido salafrário vivia roubando as gentes da região, sempre com violência, portando revolver e tudo, ameaçando matar. Que bom que tinha sido preso. Gente assim, não merecia nem viver, que dirá ficar livre. Este era o pensamento de Seu Mario. Entregar o anel às autoridades também seria leviano. Afinal, não tinha um da polícia que se salvasse naquele lugar. Todos corruptos, ponderava. Até em Dom Pedro pensou. Como devolver ao defunto aquilo que nem seu seria mais. Afinal que direito tem o defunto sobre o que deixa no mundo dos vivos? E buscar não viria. Se tivesse que vir não seria agora, não é?
Então lhe pareceu bem razoável cuidar do anel pelo menos até decidir o que fazer, e manter tudo em segredo, exceto de Maria, é claro, que já sabia de tudo.
hrec.eX%
VOCÊ ESTÁ LENDO
O Anel do Rei
Fiksi UmumO Romance narra a história de Seu Mario, um velhinho do interior da Bahia e sua saga depois que encontra um anel supostamente valioso e toda aventura para protegê-lo de todos e seus devaneios que farão você ir do riso às lágrimas! Por favor comente...