Conto de Uma Violinista

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 Sara, uma conceituada violinista, hoje mais uma vez reverencia seu público que à aplaude de pé depois de uma apresentação brilhante no Teatro Maestras. De pé sob a luz dos holofotes, Sara não contém a emoção de mais um trabalho bem sucedido, apesar da postura firme suas mãos e pernas tremem e as lagrimas se escondem por trás dos olhos brilhantes. Ali, encarando aquele enorme público que veio dos mais variados lugares só para prestigia-la, aplaudindo há quase três minutos eufóricos, Sara só conseguia pensar em toda a sua trajetória até o hall da fama. Todos os obstáculos que uma garota negra, órfã de pai desde os cinco anos, teve que enfrentar para sobreviver. O que muitos dos seus fãs poderiam não saber é que a realidade fora dura com a jovem Sara, que teve que trabalhar ainda criança para ajudar sua mãe a trazer comida para casa. Em uma realidade que faria muitos perderem a esperança e desistir de seus sonhos, a conceituada violinista, usou todas as pedras e obstáculos que apareceram em seu caminho para construir uma longa estrada que a levou direto aos palcos dos grandes teatros internacionais.

Quando tinha catorze anos Sara não diferia das jovens de sua idade, exceto talvez pela sua pouca altura. Assim como todas as crianças de seu bairro, que ficava em uma das áreas menos privilegiadas da cidade, ela adorava correr descalça pelas ruas despavimentadas. Assim também como sua filha, dona Lalá vivia correndo, porém para trazer o sustento de sua casa e filha, uma realidade dura presente em quase todas as famílias que ali moravam. O apelido carinhoso fora dado por todos da vizinhança que receberam de braços abertos Laura e seu marido quando estes mudaram para o bairro, Sara não passava de um pequeno ser embrulhado nos braços de seu jovem pai. Depois da morte do esposo, dona Lalá teve que assumir todas as responsabilidades do lar, desde as atividades domésticas à difícil tarefa trabalhar fora. E apesar das humilhações e rejeições sofridas por ser mulher, negra, sem marido e com filho pequeno, ela sempre manteve a cabeça erguida.

Com a ajuda de uma amiga conseguiu um emprego de doméstica em uma casa de família, logo surgiram outras interessadas em seu trabalho, por fim se viu trabalhando em três casas de famílias diferentes. Não se importava com a quantidade de serviço, muito menos com o que outras pessoas pensavam sobre o serviço doméstico, sempre acreditou que toda forma de trabalho é digna, não importava que tivesse que passar a maior parte do seu dia limpando privadas alheias desde que no fim do dia voltasse para casa com o dinheiro para alimentar sua filha. E mesmo cansada depois um dia inteiro de serviço, sempre recebia sua filha com um sorriso e um abraço de afeto, o sorriso que a pequena lhe dava de volta, todo o carinho, apenas a fazia ter mais certeza que tudo aquilo valia a pena.

Infelizmente devido a toda a carga horária de trabalho de Laura, Sara cresceu com uma mãe ausente que saía antes do dia amanhecer e voltava apenas quando o sol se punha. Passava parte do dia na escolinha e no fim da tarde quando chegava, ia para a rua brincar com os amiguinhos, que assim como ela tinham pais ausentes mesmo que por um motivo justo, as vezes a mãe precisava dormir no serviço e ela tinha que dormir na casa de alguma vizinha. A garota nunca teve raiva da mãe, ou coisa parecida, sempre soube que a situação a obrigava a isso e mesmo longe sabia que sua mãe só pensava nela e em sua segurança. Sempre via na mãe uma heroína, um exemplo a ser seguido. E foi nesse cenário que a jovem Sara foi crescendo, mesmo diante da dura realidade era uma criança sonhadora que via no futuro um livro em branco esperando para ser preenchido por seus sonhos coloridos, ao contrário de seu presente preto e branco.

Depois que fez catorze anos, ela passava apenas as manhãs na escola que oferecia aulas apenas nos turnos manhã e tarde, devido às más condições da escola as aulas noturnas foram canceladas. Como já se achava com idade suficiente, ela ficava em casa sozinha mesmo que a contra gosto da mãe que a deixava sempre aos cuidados de uma amiga que morava do outro lado da rua. Passava as tardes em casa sozinha, fazia sua própria comida, o dever de casa e assim que terminava corria para rua junto com as outras crianças, quando a mãe chegava cansada trazendo consigo a janta daquela noite, corria ao seu encontro, dizia que passara a tarde aos cuidados da vizinha, e à vizinha dizia que a mãe concordara em deixa-la sozinha em casa com a condição de que sempre mantivesse um olho de longe na filha. Sara sabia que a mãe era ocupada demais e não tinha tempo para confirmar a história com a amiga, e a outra inocentemente confiava plenamente na pequena mentirosa, afinal as crianças sempre falam a verdade.

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⏰ Última atualização: Dec 22, 2015 ⏰

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