Depois da visita às torres no grande planalto, Öfinnel e Raastad seguiram caminhos diferentes. Uma importante conferência estratégica aconteceria na cidade élfica de Talbos, mas um problema impedia o rei de participar. Em seu lugar, enviou seu filho Nöl. Ele perdera sua esposa, Chira, dos vetmös. O rei finalmente compreendia como haviam sido tolas aquelas discordâncias. Apesar da grande maioria dos seguidores de Merrin, pertencerem aos vetmös, muitos destes lutaram bravamente com a aliança durante a guerra.
Tentavam limpar e reconstruir Umm e novos sonhos e premonições voltavam a perturbar Öfinnel. Sem o líder, os seguidores de Merrin se dividiram. Alguns daqueles chegaram em Nova Vellistrë buscando refúgio. Muitos entre os holmös não queriam aceitá-los, mas foi decisão do rei, novamente fazendo uso de seu trono, recebê-los.
Havia muitos poucos holmös e vetmös depois de tantas guerras. A reprodução dessas antigas linhagens era lenta se comparada à dos humanos. Seus números agora constituíam uma pequena minoria. A maior parte dos súditos de Nova Vellistrë eram humanos das diferentes tribos, reinos e regiões do velho continente. Todos estes nasceram e cresceram em tempos de guerra, e sua cultura influenciada por forte hierarquia militar se resumia à sobrevivência. Os homens respeitavam Öfinnel como um grande general, mas não como um rei. Ele se arrependia de ter aceitado ajudar na reconstrução do reino. Em outros tempos, sua palavra bastava para acabar com os conflitos, mas nestes dias, num reino de homens, se ele quisesse resolver um assunto, muitas vezes tinha de recorrer à violência.
Suas visões mostraram um novo tempo de ruínas para Vellistrë, caso o trono caísse nas mãos de um simples homem. Sua pequena expectativa de vida e fragilidade levaria a uma série de disputas internas e por fim, o conflito político enfraqueceria o exército e por consequência seriam engolidos pelas hordas. Não era algo que ele conseguia transmitir àquele jovem general e seus seguidores. Acreditavam que o tempo deles havia chegado. Que era tempo dos homens reinarem sobre os homens. Öfinnel pensava que eram tolos. Esse ainda era o tempo dos holmös e até mesmo dos vetmös. Sem seus pastores, o rebanho estaria perdido.
– Deixe-me ver se entendi bem, General Papoulp. O senhor sugere que eu deixe minha terra, a terra de meus ancestrais. A terra que eu ajudei a defender e reconquistar?
Estava diante do rei um humano das tribos do norte. Gente feroz e teimosa. Eram grandes guerreiros e muito determinados em seu treinamento, isto é verdade. Mas também, um povo que não sabia o seu lugar. Ele era alto, mas não tanto quanto o rei. Olhava-o de baixo para cima. Atravessando sua face uma cicatriz bem grande, algo de que se orgulhava e que usou como símbolo para a ascensão em sua carreira. Em seus modos, quase selvagens, Papoulp retrucou.
– Se essa é a terra de seus ancestrais? Sim isso é verdade. Se vocês, holmös a reconquistaram? Não, isso não é verdade. Fomos nós, os homens que fizemos isso. É nosso o mérito. Assim, por justiça, deve ser nosso o trono.
– E se eu me recusar? O que fará? Acha mesmo que podemos vencer essa guerra contra os demônios?
– A guerra chega perto de seu fim, velho rei. As torres dos elfos garantirão nossa vitória. E se é preciso de alguém para empunhar esta espada aí. Eu digo a ao senhor e a qualquer outro nestas terras que sou tão capaz quanto o senhor!
– Seu tolo! Todos sabem que se outro, que não eu, empunhar esta espada ela irá destruir a tudo e a todos.
– Há! O velho discurso do rei dos holmös! Quem acredita numa tolice destas? Que uma espada simplesmente vai explodir, caso outra pessoa a utilize! Isso é mais um dos velhos argumentos que sustentam esta suposta superioridade dos holmös e vetmös sobre nós, humanos. Nós, que no passado fomos escravos nas mãos de seu povo. Nós, que construímos todas estas cidades. Nós, que lutamos tantas guerras na linha de frente. É a nós, que o reino deve pertencer!
– Tolos como você, Papoulp, só trarão ruína sobre o nosso povo.
– Não me venha com essa de nosso povo! Não somos o mesmo povo. Vocês, são escolhidos de deuses que já não mais se manifestam para nos auxiliar. Seus deuses estão mortos, ou falidos. É o tempo dos homens! Afinal, quantos de vocês realmente restaram? Será que se fossem todos unidos, seriam capazes de compor um batalhão? Vocês são uma raça condenada. O seu tempo já passou. Não são viris como nós! Onde está a prole de vocês? Como garantirão nosso futuro?
Aquela falação irritou o rei. Seu coração pulsava dentro do peito. Olhou para sua maõzorra imaginando-a esmagando o crânio do general insurgente. Larissanle, sua esposa o repreenderia. Mas ela já não estava ali. Eliarta desaprovaria. Ela também se fora. Seu filho, Nöl, certamente o recriminaria, mas estava viajando. Havia velhos conselheiros. Compreenderiam? E de tão acostumado à violência, cedeu cegamente ao desafio daquele jovem e ambicioso humano.
Sacou sua espada e diante de sua corte, dividiu-o em dois, com um golpe rápido e pesado. O chão rachou quando a espada terminou seu curso. E um silêncio súbito tomou conta do salão. Nos olhos de seus súditos, o horror. Seu rei, um ser deformado, sem um dos braços, e no lugar deste, uma grotesca mãozorra de metal. Sua espada verde e de brilho pulsante não acumulava sangue em sua superfície, este evaporava em instantes.
Sob certa perspectiva, foi um bom discurso, o último discurso do General Papoulp. E em muitos aspectos ele estava certo. Parecia chegar ao fim a era dos holmös e vetmös. Mas em outro aspecto fundamental estava errado. Se o rei cedesse seu trono, ou se fosse morto, ou mesmo se a espada fosse tomada dele, seria o fim de todos os homens, elfos, anões e demais aliados. Öfinnel fez muitas escolhas difíceis naquela guerra. E esta, foi apenas mais uma.
Pessoas começaram a choramingar, outras a defender que aquilo havia sido um absurdo.
— Calem-se! — ele gritou uma única vez antes que o burburinho crescesse. Olhavam-no com o rosto vermelho, olhar tresloucado. Muitos pensavam que o rei finalmente havia mergulhado nas trevas.
– Escutem-me! E escutem-me muito bem! — sua voz era firme e carregada de emoção.
— Não importa o que pensam ou dizem! Sou Öfinnel Prístimos, rei da antiga e Nova Vellistrë. Um reino que não terá sentido em cidades, dinheiro ou poder. Um reino cujo único objetivo é vencer esta guerra. Liderar gente, hölmos, humanos, anões ou felinos, lagartos ou elfos que escolham Vellistrë como seu reino é minha tarefa. E de mais ninguém! Ninguém! — olhou para o corpo dividido que ainda se balançava em espasmos. Foi até uma mesa e tomou dessa uma toalha. Cobriu o corpo do general. O tecido branco absorveu o sangue tornando-se rubro.
— O General Papoulp foi um grande guerreiro. Que ele seja lembrado como grande herói de guerra. E não se esqueçam de sua morte. Eu o matei. Matarei também qualquer um que coloque em risco nosso objetivo. Não é momento de dividir forças, mas juntar forças. Haverá muita guerra adiante de nós. Os homens lutam bem, mas tem vidas curtas. Minha responsabilidade é viver por mais quantos mais anos forem necessários e garantir a derrota das hordas. Que o General lembre a todos, daqui para diante, que não deixarei ninguém, nem nada se interpor entre mim e este objetivo. E faço-lhes uma promessa. No dia em que esta guerra tiver seu fim, nem eu, nem nenhum outro holmös será rei e governador de homens. Quando esta guerra acabar, nossa tarefa também terá acabado. Minhas visões já revelaram: será o fim da era dos hölmos e a aurora do tempo dos homens.
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Öfinnel. Rei. Vidente. Guerreiro. Lenda.
FantasíaÖfinnel foi o último rei de Vellistrë antes que fosse destruída pelas hordas de demônios invasores. Determinado, forte e imortal. Está vivo há incontáveis gerações e sua memória vai se perdendo aos poucos. Fortes ondas do destino impelem suas açõe...