BOATE DA MANGUEIRA
Corria o ano de 1.976 em meados de agosto. Itumbiara, cidade na fronteira de Goiás com Minas, vivia sua rotina pacata de cidade do interior. A majestosa Avenida Beira Rio tomava estilo de recreio. Comerciantes e fazendeiros mais abastados se preparavam para construir lindas mansões de frente para o rio Paranaíba. A regularização das enchentes, com a construção da barragem de Furnas animava as pessoas a morar na parte mais baixa da cidade sem os perigos das cheias anuais. O momento político vivido pela nação era favorável a novos empreendimentos. Os políticos locais se movimentavam para conseguir investimentos públicos. A melhor diversão dos homens da cidade era as visitas às duas boates: uma instalada próximo do posto fiscal, conhecida como Ponto Azul, e a outra no bairro Afonso Pena, a boate da Mangueira.
A primeira casa era dirigida por dona Gloria, uma senhora cinqüentona. Na juventude fora o mimo de muitos fazendeiros endinheirados. Era uma mulher inteligente, conseguindo segurar um pouco das fortunas que ajudou a dilapidar. Muitos ricos gastaram boiadas inteiras na esbornia com Glorinha. Ela começara cedo na vida, quando um namorado a deflorou aos dezessete anos de idade. Os pais, pessoas humildes, mas rigorosos nos costumem, ao tomarem conhecimento da filha deflorada por um Don Juan, filho dum rico fazendeiro forçaram o casamento. Casar não deu certo, o tal tinha uns cobrinhos e indenizou o pai dela pagando um dote pelo defloramento. O sumiço deste dinheiro gerou um desentendimento muito grande na família. Desiludida Glorinha fichou-se na delegacia de polícia como meretriz e foi para a zbm (Zona do Baixo Meretrício).
Hoje conformada com sua sorte de mulher dama, até é feliz por ter sido atirada na vida tão cedo. Administra com maestria de quem conhece seu oficio o empreendimento cuja atividade é a mais antiga da terra. Sua casa tem muitos cômodos para aluguel por hora e não tem ociosidade. Muitas meninas novas e bonitas moram com ela e lhe dão lucro toda noite. Caso não seja com o aluguel de quartos o faz com bebidas, sempre as mais caras da cidade. É uma atividade da semi-ilegalidade, mas os problemas com a segurança pública são administrados com jeitinho. O comandante do destacamento faz vistas grossas para sua boate. Fazem troca de favores e ambos ficam satisfeitos.
Por ocasião de eleição municipal, sempre teve o cuidado de ajudar nas campanhas políticas. Nunca tomou partido de ninguém: sua parceria é feita com todos. Quando chega o resultado das urnas não precisa se preocupar, cooperou com o vencedor. Se por acaso aparece algum delegado de policia linha dura arranja uma audiência com o prefeito e tudo se ajeita rapidinho, isto quando não manda uma das meninas, sempre a mais bonita e inteligente conversar com a autoridade de forma particular.
A casa da mangueira pertence há um ex-rico herdeiro de família tradicional. O local onde funciona próximo de uma mangueira centenária foi uma imensa fazenda herdada pelo pai de Jerominho. O rapaz era dado a esbórnia e inimigo do trabalho duro, morreu cedo corroído pela cachaça pelo excesso de mulheres. Para sustentar os caprichos de muitas dondocas, foi vendendo pedaços de terra e consumindo as economias. A maior parte do dinheiro gastou no puteiro com a Glorinha.
Ao morrer, doente e sem recursos, deixou ao único filho a sede com pouco mais de dez alqueires de terra. Assim mesmo estava com negócio encaminhado, mas a morte o levou primeiro. Jerominho, feito herdeiro único, não perdeu tempo e torrou o resto da fortuna, mas foi mais inteligente que seu pai: mandou lotear e comercializou quase tudo. Deixou uma chácara, da sede por saudosismo e ter onde morar. Antes de findar o dinheiro instalou a casa de diversão. Para desgosto do pai, Jerominho veio ao mundo em embalagem com erro de fábrica: por fora era homem de barba, mas tinha a essência de uma fina mulher. Seus arroubos femininos faziam os amigos e parentes rejeitá-lo. Conformou-se com a sorte e ia cuidando de sua vida. Enquanto tinha algum dinheiro, conseguiu grandes amores, mas como não era generoso com os amantes, perdeu os parceiros.
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BOATE DA MANGUEIRA
Short StoryEm Itumbiara - GO existiu duas boates interessantes competindo uma com a outra sobre qual teria mais clientes. As duas ainda sobrevivem, porem com menor importância para os rumos da cidade