Capítulo 4

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Estou me vendo dentro de uma sala, trancada por uma porta de metal. Estou me debatendo feito louca, em um hospício. Grito desesperadamente alguma coisa, mas não consigo ouvir por causa da respiração ofegante do meu subconsciente. Prendo a respiração pelo menos para tentar ouvir o que estou dizendo para eu mesma.

ACORDE!!!

No mesmo instante eu acordei desesperada, certa de que aquilo era um aviso. Minha vista estava embaçada e o local estava empoeirado. Comecei a me acostumar com o local e vi que estava amarrada na parede por correntes de ferro ao lado de Wybie, que estava completamente inconsciente. Onde eu estava era a pergunta que eu me fazia. Sabe aquela sensação de que você está apenas sendo observada do escuro de uma sala empoeirada e com cheiro de ferrugem? Eu não sabia, até aquele momento. O nosso ser misterioso saiu das sombras e, pelo amor de Deus, aquela face era de arrepiar cada parte do seu corpo.

Vou detalhar bem esta parte porque acho uma parte importante: tinha cicatrizes no rosto como Edward, mãos de tesouras; tinha olhos fundos que eu não sabia se me assustava mais saber que eles estavam observando-me da escuridão ou saber que não tinha nada lá; seu pescoço era reto e tinha o osso estufado nos dois lados; e por último, mas não menos importante, as mãos longas e ossudas que ela possuía. Eu estava assustada mas curiosa ao mesmo tempo. Não é a toa que me intrometi em lugar que não me chamaram e parei aqui, como da última vez.

-Quem é você? -perguntei sem medo, mas com aquela gota de suor pingando no meu lado direito.

-Você sabe quem eu sou.

-Não, na verdade foi por isso que eu perguntei.

-Bem, você pode não me conhecer. Mas tenho certeza que sabe quem é minha mãe.

-Sua mãe? Espera, onde nós estamos?

-Você vai logo descobrir. Mas como sou uma pessoa que gosta de surpresas, vou reservar este momento especialmente para você. -disse passando seu dedo indicador ossudo no meu nariz. E foi daí que tive uma pequena teoria de quem ela poderia pertencer.

-É só um palpite, mas você é filha da Bela Dama?

Ela me olhou intensamente com aqueles olhos fundos, parecendo afirmar a minha pergunta. Deus, o que está acontecendo? Como a Bela Dama conseguiu ter uma filha se ela já tinha morrido? E como conseguiu alguém? Muitas perguntas para poucas respostas... E ela saiu da luminosidade e voltou para a escuridão. Depois que os barulhos dos seus saltos pairaram no ar, a luz acendeu num estalar de dedos. Com isso pude ver toda a cena: eu, Wybie amarrados com correntes em uma parede e Mr. Bobinsk amarrado em outra parede. Os potes com coisas obscenas vagando sobre minha cabeça estavam nos cantos da sala, junto com conjuntos de tesouras, canivetes, serras e outros instrumentos que não sabia o nome. Parecia um daqueles filmes de terror onde envolvia massacres, cirurgias, autópsias e outras coisas. Nervosismo me sobe pela cabeça e começo a cutucar Wybie com meu pé.

-Wybie acorda por favor!!!

-O-oque aconteceu? Onde eu estou? -perguntou ainda sonolento.

-Estamos na casa da Bela Dama. Só que não é a Bela Dama, é a filha dela e nos trouxe exatamente nesta sala. Mas não sei e nem quero imaginar o que ela fará conosco. Mas temos que sair daqui agora!

Observei bem a sala como um detetive procurando uma agulha num palheiro. Procurei por ajuda, mas ajuda em forma de objetos. Olhei bem ao meu redor e vi que uma das minhas correntes estava entre-aberta. Era uma das únicas opções que encontrei naquele momento. Quando se está em desespero você não consegue pensar bem como nas outras vezes. Resolvi usar o ombro de Wybie como apoio para tentar tirar a corrente do gancho. Enquanto Wybie gemia de dor e desconforto, eu estava me contorcendo que nem uma centopeia ambulante tentando me libertar que nem um pássaro preso. Um pássaro azul preso. Consegui o ângulo certo e dei impulso no ombro de Wybie, que parecia que iria se deslocar e dei um mortal como nunca dei. Na verdade nunca tentei ou dei um mortal. A adrenalina mexe tanto com a gente ás vezes... E consegui finalmente sair da gaiola e me libertar das correntes. Fiz o mesmo com o garoto do ombro quase deslocado e iria fazer o mesmo com Mr. Bobinsk, quando ouvi o mesmo barulho de saltos se aproximar e tive que achar uma saída rápida.

Me desesperei mais do que quando vi a sala por completo, mas consegui achar uma saída encima da estante dos potes obscenos. Era como se fosse um duto de ventilação mas que não era um duto de ventilação. Escalei as divisões da estante e ajudei Wybie a subir e fomos para onde o destino nos aguardava. Só ouvi a porta abrir e um grito estridente indicando raiva e ódio.

-Cadê aqueles dois malditos? Droga! Por que tinha que me dar correntes velhas mãe?! Mas não preciso me preocupar, logo eles vão ver as coisas do MEU modo. -completou com uma risada diabólica no final que metia medo em qualquer criança.

Fomos andando, ou melhor, engatinhando no duto quando avistamos a saída. Fomos parar em um dos quartos, o quarto onde havia o piano mas que agora não tinha mais este. Disse a Wybie para me ajudar a achar pistas do que estava acontecendo, dados ou algo que me indicasse o que aconteceu aqui e quem seria aquela mulher ou ser, de verdade. Não achei nada, mas achei um vulto nos observando novamente. Acho que posso acabar me acostumando a ser observada.

-Por favor, acabei de sair de uma "perseguição" e estou totalmente perdida e cansada, então mostre sua cara logo e vamos acabar com isso... -disse diretamente.

Saiu um rapaz alto, agasalhado por inteiro, olhos azuis penetrantes e com um cabelo que, devo dar uma ênfase, ser bem escuro no tom preto. Não conhecia aquele cara e nunca ouvi falar e muito menos já vi ele antes.

-Já conhece até a minha presença. Fascinante. -disse o rapaz.

-Quem é você? E você me conhece?

-Pode ser que sim, pode ser que não. Eis a questão.

-Deus, por favor, chega de enrolar e me diz logo quem você é!

-E para que? Além disso, eu não passo de um "gato preguiçoso".

Aquela frase e os dedos se dobrando para mostrar as aspas na frase ficaram grudados na minha cabeça por apenas uns quatro segundos, sempre fazendo aquele eco dramático que todo consciente tem.

-Gato?!!





Coraline e a Volta ao Mundo SecretoOnde histórias criam vida. Descubra agora