O vento soprava. Ecoava não só nos meus ouvidos, mas também dentro de mim. Era tudo o que eu ouvia... O vento a arrastar as folhas das árvores, o vento a despentear o meu cabelo, o vento a desgastar a rocha das montanhas à minha volta... Eu sentia o vento do fim de tarde de inverno nos meus dedos brancos de frio, nos meus lábios gretados, na minha face rosada e no nariz vermelho, mas, mesmo assim, não queria abandonar aquele local.
-Alex... – murmurou Dan, com a sua voz suave e calma, enquanto segurava a minha mão esquerda com a sua direita – Alex, já toda a gente foi embora...
-Espera só mais um pouco... – pedi, sem desviar os olhos do centro da clareira.
Ela estava ali. Era a minha última oportunidade de a ver. Eu não a queria deixar, não queria que ela ficasse sozinha. Eu não podia ficar ali eternamente, de olhos postos num túmulo, mas neste momento não era capaz de me afastar. As lágrimas corriam pelo meu rosto, quase congeladas pelo frio.
-Alex, - voltou a chamar Dan – vamos voltar para a escola. Está a anoitecer, e está frio. As pessoas vão ficar preocupadas.
Não lhe consegui voltar a pedir que esperasse. Ele já tinha ficado muito tempo comigo, e nem sequer a conhecia.
Ninguém para além de nós ficara mais do que quinze minutos. Alguns alunos e professores tinham vindo, deixado flores, rezado por ela, mas ninguém ficara. Só nós.
Ela era minha amiga, no final de contas. Tinha passado muito tempo comigo, muitas horas nos corredores da escola, muitos trabalhos feitos em conjunto na biblioteca, muitas saídas até à vila. Eu confiava nela e contava-lhe muitas coisas sobre a minha vida, e ela sabia sempre ouvir-me e aconselhar-me.
O Dan apertou suavemente a minha mão, lembrando-me que tínhamos de ir.
Retirei do bolso do meu casaco um lírio, a flor preferida dela, e deixei-a sobre a sua mão. Toquei-lhe levemente na face, que estava agora serena, quase sorria. Ela usava um vestido branco, com mangas de renda, e tinha os pés descalços. Muito diferente da Sara que eu conhecia, sempre vestida de negro. Aqui, parecia mais jovem e feliz. Mas era exatamente a mesma.
Ainda de mão dada com o Dan, saí finalmente da clareira. Ao ver que eu chorava, pôs um braço à minha volta, e deu-me um pequeno beijo na testa.
-Ela nunca vai deixar de estar contigo... – sussurrou ele ao meu ouvido. Depois, colocou uma mão no meu coração, e continuou – Neste momento, ela está mesmo aqui.
-Eu sei... – suspirei – Mas é tão difícil imaginá-la morta. Pensar que nunca mais vou vê-la, que nunca mais vou falar com ela ou encontrá-la nos corredores, ou mesmo reclamar sobre os professores com ela, ou fazer os trabalhos de casa. Nunca mais vou ouvir a voz dela ou pedir-lhe conselhos... Nunca mais lhe vou dar um abraço...
-Alex, ouve. – ele pôs uma mão sob o meu queixo, levantando-o suavemente, e eu encarei pela primeira vez naquele dia os seus olhos castanhos, que brilhavam como duas estrelas, e que me faziam sempre sentir melhor – Ela está contigo. Todas as memórias que vocês têm juntas, ninguém tas pode tirar. O que interessa realmente, é a imporância que ela tem para ti e tu para ela. E isso ninguém pode apagar.
Sorri. Tentei que o meu sorriso fosse simples, que não mostrasse tristeza nem perda, mas não sei se fui bem sucedida. De qualquer das maneiras, o Dan conhece-me demasiado bem para acreditar.
-Não precisas de sorrir...
-Vamos voltar para a escola, pode ser?
Ele limitou-se a acenar com a cabeça, começando a andar, de costas para a clareira. Eu segui ao lado dele, a tentar tirar a Sara do meu pensamento, mas, naquele momento, pareceu-me completamente impossível.
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A Procura
FantasyOs alunos do colégio para feiticeiros Starlam Palace não tinham dúvidas - Sara Stormblossom suicidara-se no decorrer da segunda semana de aulas. Era uma rapariga tímida, sem muitos amigos, que costumava passar muito tempo sozinha, e que poucos conh...