Escuro

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Talvez o amor seja algumas vezes tão dolorido porque as pessoas não amam com o coração e sim com os olhos.
Para mim talvez isso nunca se aplique. Afinal não acho possível se amar com os olhos.
No meu caso, eles não conhecem as aparências. Meus olhos não podem ver a luz, e é por isso que eles habitam unicamente o pior mundo, o mundo da escuridão.

×××

É tão bom me acomodar debaixo das cobertas. Pelo menos, minha cama é
Confortável. Os lençóis e o travesseiro estão um gelo, por isso coloco as cobertas por cima da cabeça para criar um pouco de calor. E me
lembro de uma coisa: respirar e viver.

Ao sair da cama e encostar os pés descalços no chão gélido. Tiro um suéter do armário e visto por cima do pijama, procurando
um par de meias. Não acho de jeito nenhum e a única opção que tenho e ficar descalço.

Ser cego não é algo fácil.

Mamãe batia as portas do armário com violência, e seus passos eram firmes no piso de madeira da cozinha, no andar de baixo. Eu desejava a todo momento que ela não vinhesse até mim, desejava que ela tivesse me esquecido.

Eu era apenas um corpo de 70 quilos inutíl, um peso quase morto que respirava um pouco de oxigênio e se arrastava pelos cantos.

Eu poderia por um fim em tudo mas eu tinha que viver.  Eu deveria cumprir a promesa de aplaudir Gemma no grande auditório do colégio no dia de sua formatura em alguns anos.

Alguns inúteis anos onde apenas serei um grande problema.

O cheiro de mofo do meu quarto e da casa por algumas vezes parecia estar misturado com um cheiro de sangue e carne podre que me fazia querer vomitar, eu não me lembro ao certo quando começou, mas o cheiro parecia em alguns momentos estranhamente familiar.

Era como se eu já tivesse sentido esse cheiro milhares de vezes antes da primeira vez e mesmo assim não conseguia identificar de onde vinha já que a casa sempre estava muito limpa.

××

Andar pelos corredores da escola não é uma das tarefas mais fáceis no mundo quando se é deficiente visual. É impossível ser guiado pela audição quando o barulho dentro de sua mente e fora dela é insuportável.

Ao adentrar as grandes portas do ginásio senti a mão do treinador  me guiando, até o meu conhecido banho.

- Pronto styles - seus passos ficaram distantes e o som da bola de basquete quicando no chão pode ser ouvido.

E mais uma vez eu estava sozinho, mas era estranho, era como se alguém estivesse comigo, ao meu lado, mesmo sabendo que estava sozinho.

Os passos ficavam cada vez mais próximos da porta enquanto eu mantinha meu edredom cobrindo todo o meu corpo mas, ainda assim sentia o vento gelado bater contra mim dando pequenas descargas elétricas por todo ele. Resolvi então me levantar e fechar a janela, eu toquei todo o vidro e passei a mão pela tranca de ferro enferrujada, descobrindo que a mesma estava fechada, e se a janela estava fechada o que poderia ser... E então eu ouvi aquela voz.

- olá Harry - e depois veio aquela gargalhada nojenta que faz com que instantaneamente meu corpo ficasse paralizado.

-Pai nosso que estás no céu..- comecei a rezar baixinho.

-Santificado seja a sua morte - Ele completou.

××××

Continua?
Gosto da opinião de vocês sempre. Isso foi apenas para dar um gostinho.
Bjos

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