Capítulo Único

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As bases epistemológicas
da Agroecologia 1 1
João Carlos Costa Gomes

1.1 Introdução

Antes de tentar mapear as bases epistemológicas da Agroecologia,
considero importante explicitar o que se entende por epistemologia.
Dependendo da corrente de pensamento, o conceito de epistemologia
pode assumir diferentes significados. Aqui o conceito epistemologia
é utilizado com o sentido de teoria do conhecimento, englobando
tanto o conhecimento científico como os saberes cotidianos, no caso,
expressados na sabedoria dos agricultores, também é denominado
conhecimento "tradicional", "local" ou "autóctone". Este esclarecimento
indica que a análise exclusiva dos conhecimentos científicos deve ficar
no campo da filosofia da ciência.
A necessidade de estudar as bases epistemológicas da Agroecologia
é decorrência do que normalmente se denomina crise do paradigma
ocidental, na agricultura expressada como a crise do modelo produtivista, baseado nos preceitos da revolução verde. Muitos
estudiosos consideram a Agroecologia como o novo paradigma. Para
evitar que se busque a saída para a crise usando as mesmas ferramentas
responsáveis por ela, ou seja, para que a base epistemológica na busca
de soluções para os problemas contemporâneos, da agricultura em
particular e da ciência em geral, não seja a mesma epistemologia que
sustenta o paradigma responsável pelo surgimento de seus problemas,
é importante fazer-se um mapa, ainda que breve, das características
do paradigma em crise, feito através de breve reconstrução crítica das
concepções teóricas do conhecimento científico técnico, permitindo
uma reflexão sobre o progresso da moderna ciência ocidental, evitando
que a busca das bases epistemológicas da Agroecologia venha seguir por
um caminho equivocado.

1.2 Da Filosofia da Ciência TradicionaI à Nova

Filosofia da Ciência Tradicional
Como Filosofia da Ciência Tradicional caracteriza-se o surgimento
do discurso epistemológico moderno, identificando os traços que
definiram a fase pioneira do Modelo Empirista de Ciência: empirismo
britânico, racionalismo e positivismo moderno, a partir dos autores mais
importantes desses movimentos, respectivamente Francis Bacon, René
Descartes e Auguste Comte. De forma sintética, durante os séculos
XVI, XVII e XVIII sucederam-se tanto o desenvolvimento da ciência
como os intentos de teorizá-la. Aos esforços pioneiros de Copérnico,
Kepler e Galileu para instaurar um método experimental e de Bacon
para teorizá-lo, foi acrescentada a filosofia mecanicista de Descartes,
considerada a primeira das correntes filosóficas da modernidade. A
afirmação da autonomia da razão não é exclusiva do racionalismo,
mas a partir deste, de todo o pensamento moderno. Mais tarde Hume matura o empirismo e Isaac Newton conjuga os descobrimentos
dos pioneiros para dar um decisivo giro na filosofia natural, onde a
matemática deixa de ser o fundamento para converter-se em meio auxiliar. No século XIX, Auguste Comte renova o empirismo sob o
nome de "positivismo" e, ao mesmo tempo, estabelece os fundamentos
da sociologia positivista.
Uma análise histórica sobre esta evolução é importante por dois
motivos:
A. Nem tudo significa o mesmo. As críticas ao processo de
consolidação da ciência moderna e ao modo de apropriação
de seus resultados, são dirigidas ao "modelo científico
empírico", "baconiano", ao "paradigma cartesiano", ao
"positivismo" ou ao "reducionismo", desconhecendo que
existem diferenças conceituais e várias reformulações nessas
propostas, ainda que no seu conjunto representem decisivo
papel na consolidação do que se reconhece como "ciência",
"metodologia científica", "paradigma ocidental".
B. Caráter progressista das propostas para o que era domi-
nante nas épocas em que surgiram. As críticas contem-
porâneas associam autores e conceitos com a manutenção
do status quo e com práticas científicas conservadoras, não
obstante a contextualização histórica. A consolidação da
ciência (e do conhecimento científico) era percebida, à
época, como a melhor estratégia e talvez a única, para no
campo das ideias enfrentar o dogmatismo e dominação
da igreja, os governos autocráticos e a ordem estabelecida.
Não se trata de uma defesa à críticas que são verdadeiras,
mas de resgatar o quadro geral de então e o papel crítico
desses autores, para o rompimento do que era dominante
na época.

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