- Está me dizendo que meus pais faziam parte d'Os Fiéis?
Encaro Alice com perplexidade e um pouco de admiração.
- Não, Luke. Estou dizendo que seus pais eram integrantes da elite, chefes do movimento. Seu pai detinha sempre a palavra final das decisões.
- Eu..Não consigo assimilar que meu pai, o Supremo da área de relações internacionais, fosse líder de um movimento secreto que age contrário ao governo.
- Eu não entendo, Alice.
- Mas vai entender, Luke. Sei que é muita coisa de uma vez só, mas seu pai tinha muita fé em você, e no que é capaz de fazer pela causa. Durante anos escuto os planos de proteção a você. Não é por descaso que sua mãe te ensinou pouco do que o protocolo do país impõe. Ela não poderia encher sua mente com as coisas que eles dizem, coisas do tipo: se conforme, não busque além. Por isso que você não conviveu com crianças da sua idade, salvo o Marco, para que não se influenciasse. Faz sentido para você?
- Nem um pouco.Ela sorri.
- Então vamos de novo. Desde que você nasceu, seus pais viram que você era diferente das outras crianças, inclusive do Lino. Você era curioso e questionador, se tinha uma cerca impondo limite, era um convite para que escalasse e fosse para o lado 'errado' . Sempre buscando o diferente e exigindo explicações. Para que não perdesse isso que veio contigo, seus pais cortaram suas relações com influências fortes, como professores particulares e outras crianças, sendo educado pela mãe em casa. Se demorasse mais tempo para acontecer, sua mãe teria sérios problemas para impedir que você fosse para a faculdade. Enfim, tudo ia bem e parecia no rumo, quando vieram suas crises. Seu pai pensou que fosse fraqueza e que nunca poderia ser escalado para Os Fiéis, mas sua mãe acreditava que elas eram prova de uma imensa sensibilidade, e que você tinha o dom de sentir o que vem do outro.
Confesso que nem eu acreditei nisso, mas ela era uma Fiel, afinal, e se mostrou extremamente correta quando você me ligou ontem. Eu vi que era seu destino, e que mesmo sem saber, você sabia.Ela ri. Graças a Deus está recuperada da hipotermia, só teve que dormir por algumas horas no calor para voltar ao normal.
É tão surreal tudo que ela está me contando.- Falta muito para chegarmos?
- Na verdade não, daqui a umas duas horas de viajem, mais ou menos.Assinto com a cabeça. O dia já está claro.
Estamos na estrada há pelo menos dezoito horas sem parar, só pra recarregar o carro, e já faz uma hora que estamos numa descida. Estamos indo pro lugar daquela foto, aquele monumento com a lua pintada. Eu suponho.De repente, penso nos meus pais...meu pai eu sabia que não conhecia direito, mas da mãe eu não esperava.
Quando penso em como acreditava conhecê-la bem, e na verdade não fazia ideia de nada do que acontecia. Eu nem sei quem ela é.
Perguntei a Alice se ela sabia sobre o que o pai falava quando estava caído e dizia eu vi, eu vi, mas ela não sabia dizer. Me contou que não faz muito tempo que ficou sabendo do grupo, e que ainda não atua em campo, procurando o caderno, mas que ajuda nas outras...questões da organização, sobre as quais ela não quis comentar.Como uma barrinha de frutas e bebo água. Meu estômago dói pedindo mais comida, mas não sei o que me espera e prefiro não arriscar. Revezamos o volante algumas horas atrás, por que meus músculos doíam, mas vejo que ela já está cansada.
- Posso pegar o volante, se quiser. Eu já estou bem.
- Ah, obrigada! Mas nem vai precisar, Luke. Nós já chegamos.Ela vira numa estradinha menor e segue por uns 50 metros antes de virar novamente, e então eu vejo o lugar da foto, e um arrepio percorre minha espinha. Bem a nossa frente está o palacete, mas saindo dos seus lados e indo até perder de vista, tem muros enormes e muito altos escondendo o que tem atrás. A construção parece abandonada, como se não viessem pessoas até aqui há bastante tempo. Quando descemos do carro, olho em volta. Já faz muitos quilômetros que deixamos de ver qualquer tipo de vegetação, imagino que a prefeitura não quis gastar plantas falsas tão longe da Cidade. Então esse descampado era pra ter sido notado a mais tempo, mas acho que não prestei a devida atenção.
Lentamente, caminho até o palacete, que parece um templo grego da enciclopédia, com colunas na frente. A lua crescente prateada está quase apagada, diferente de como era na foto. O chão está coberto com poeira espessa, mas por mais que pareça que estamos sozinhos, noto pegadas novas no chão. Pegadas solitárias, porém bem marcadas no pó.
Me viro para Alice.
- E agora, o que fazemos?Ela me lança um sorriso maroto.
- Tem medo de altura? Por que vamos pular esse muro.
Querem que você conheça a Cidade Baixa.
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Antes que o tempo acabe
Science FictionEm um planeta Terra futurista (mas não tanto assim), o jovem Lucas leva a vida sem expectativas, sem o que ele chama de Grande Motivo. Em meio a seus problemas adolescentes, crises existenciais, obrigações e exigências da vida, e a perda de amigos e...