Uma Marca de Sangue

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Quase todos os dias eu venho me questionando o porquê do meu nascimento. Eu realmente não entendo os motivos aos quais hoje eu estou aqui. Vivo. Respirando. Ou seja, vivendo. Sabe? Às vezes me falta um real sentido a minha vida. Mas só às vezes, como nesse exato momento.

Meu nome é João. Eu tenho 12 anos e sou morador da favela da Rocinha. Minha mãe é diarista e meu pai faz bicos (que são aqueles trabalhos que tem de vez em quando e de vez em quando não tem). Eu tenho mais uma irmã e um irmão, eles são mais novos que eu. Meu irmão, Israel, tem 9 anos e minha irmã, Eliza, tem 4 anos. Meus pais trabalham bastante. Quando meu pai arruma um emprego ele fica fora quase o dia inteiro, e minha mãe também. Hoje por exemplo, estou sem eles em minha casa. Em pleno sábado de tarde, podendo estar soltando uma pipa, jogando uma bola, estou aqui em casa cuidando dos meus irmãos. Isso quase sempre acontece. Meus pais vão trabalhar e eu fico encarregado de cuidar da casa e dar conta desses dois. Eu entendo, eu entendo, porque eles estão lutando para garantir algo de bom para nós, só que eu vejo as outras crianças aproveitando um dia de sábado e eu não posso fazer o mesmo. É bastante triste. Mas tento entender.

Tudo segue normal. Minha irmã acabou de dormir. Meu irmão está assistindo tevê e eu estou termiando minha lição de casa. Eu estou na 6° série, ops 7° ano, do ensino fundamental. Eu ainda não me acostumei com essas mudanças de séries/ano tudo ainda é muito complicado. Eu estudo em um Colégio público daqui do município do Rio de Janeiro. Ele é aqui perto da comunidade mesmo. O ensino não é um dos melhores, mas eu tento ser diferente para seguir uma vida diferente para minha família. Meu sonho é ser Engenheiro. Quero ser Engenheiro Cívil. É, sim, já pesquisei tudo sobre a profissão. Projetar prédios deve ser muito legal. Só que é um sonho bastante difícil de conseguir. Mas não vou desistir dele não.

Estou sentando em um sofá meio velho que tem aqui em casa, meu irmão está ao meu lado. Eu estou com meu livro na mão lendo quando de repente ouço muitos tiros do nada. Minha primeira reação foi abraçar meu irmão e leva-lo para o chão. Porque os tiros estão muito pertos, mais perto que o comum. Rajadas e mais rajadas. Um tiro atrás do outro. Minha irmã começa a chorar e eu vou até ela e a pego e ficamos eu, minha irmã e meu irmão abraçados no chão em meio a um grande tiroteiro intenso.

Quando tudo parece ter se acalmado ouço gritos e mais gritos do lado de fora da minha casa. O tiroteiro parou, mas ouço minhas vizinhas gritarem "Socorro, ajudem ele, ele foi baleado". Como vejo que tem uma aglomeração considerável de pessoas quase na porta da minha casa eu resolvo sair, mas falo para meus irmãos continuarem lá dentro. Quando abro a porta da minha casa e vou de encontro a rua, me deparo com o corpo do meu pai estirado no chão ensanguentado.


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⏰ Last updated: Jan 18, 2016 ⏰

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Vida TenazWhere stories live. Discover now