Capitulo 3
Não tenho costume de tomar café da manhã em casa, normalmente vou ao restaurante da Vovó Cindy, uma senhora muito simpática, com as meninas ou a Karen leva pra mim no colégio como fez ontem, minha mãe sempre sai mais cedo então vou sempre com o meu carro, que ganhei a um ano, como minha mãe sempre se atrasava por minha causa, me deu um. Hoje estou sem fome, e com a cabeça doendo, vou direto para o colégio, esperando que esse dia termine o mais rápido possível.
Encontro Karen e Rose no estacionamento do colégio, Karen com o meu café e Rose agachada ao seu lado cobrindo os olhos e que parece estar preste a vomitar.
- Oi! - digo.
- Trouxe o seu café, você não apareceu na Vovó Cindy.
- Obrigada, acordei atrasa - a desculpa que eu sempre usava - ressaca de ontem? - pergunto me referindo a Rose.
- Quando finalmente consegui tirar ela da fogueira já era quase duas da manhã, tive que ligar para os pais dela e dizer que ela dormiria na minha casa.
- Falem mais baixo, por favor - gemeu Rose - não sei como me convenceu a beber.
- O que? Eu coloquei uma lata na sua mão, as outras foi você mesma que as pegou. - digo.
- Ai meu Deus, minha cabeça parece que vai explodir.
- Eu tenho aspirina na bolsa - disse Karen.
- Eu também vou querer - falo.
- Acho que todas vamos tomar, quase não dormi - disse Karen.
- Meninas eu não me lembro de muitas coisas de ontem à noite, e das que eu lembro gostaria de não lembrar, eu fiz alguma coisa que vá afetar profundamente a minha vida? - pergunta Rose receosa.
- E ai Rose? - cumprimentou David ao passar correndo por ela, meio tímido.
- Por que ele me cumprimentou? - pergunta assustada
- Talvez porque você foi pra dentro de um carro com ele e sabe se lá o que fizeram lá dentro - digo e Karen começa a rir.
- O que? Eu fiz o que?- diz Rose assustada.
- Calma Rose, é brincadeira dela, vocês só dançaram e se beijaram - diz Karen rindo
- Ele é mais novo do que eu.
- O amor não tem idade - diz Karen - Agora vamos entrar - Rose se levanta.
- Não sei como vocês me deixaram fazer isso.
- Não era pra ser inesquecível? - digo
- Inesquecível? Você sabe que eu não me lembro, né?
- Sei, mas nós fazemos questão de te contar tudo.
- Tem mais?
- Para de assustar ela, está tudo bem, Rose, não aconteceu nada demais. - Karen colocou seu braço sobre o ombro de Rose e começaram a caminhar.
Inconscientemente virei para trás e vi uma sombra negra distante no meio das árvores, quando voltei a olhar havia desaparecido, "não fique paranoica" disse para mim mesma, a última coisa que eu preciso agora é encontrar pelos corredores o Jamie ou em qualquer outro lugar e fingir que nada aconteceu, porque é isso que eu devo fazer, ou não?
Tento afastar as imagens da noite passada e do sonho, mas é difícil, é fechar os olhos e volta à cena, eu tenho que me distrair e a melhor maneira é ficar com as minha amigas e não deixar que elas desconfiem do que aconteceu, quero seguir com a minha vida normalmente. Por um segundo perco Karen e Rose de vista e isso me assusta, mas logo as vejo e como se me deixasse segura sigo os passos até o pátio da estátua de Arnold Becker.
- Mel? - me assusto quando ouço o meu nome e levo um tempo até virar para olhar nos olhos de Bill, que fui embora ontem sem me despedir dele depois de ter lhe dado esperança - Você foi embora e eu nem te vi, fiquei preocupado - é claro que ele ficou e isso faz com que eu me sinta ainda pior.
- Fiz muitas coisas ontem por causa da bebida e agora eu sei porque nunca bebo - riu sem graça- o álcool faz as pessoas fazerem as coisas e depois não se lembrarem - minto.
- Você não se lembra do que aconteceu ontem? - pergunta decepcionado.
- Não! - eu realmente queria que fosse verdade, que tivesse esquecido de tudo, não só do nosso beijo - Tudo é um grande borrão, me lembro da música alta e da cerveja e acordar hoje com muita dor de cabeça.
- Ah... - ele coça a cabeça - eu preciso ir pra aula- ele sae meio sem jeito e indo na direção errada, depois que percebe dá a meia volta e entra na sala de aula~~♥~~
- Você realmente não se lembra? - pergunta Karen durante a aula de literatura.
- Sim, me lembro de cada detalhe - admito
- Por que mentiu?
-Porque a verdade o iria machucar, quando o beijei não senti nada, acabou entre a gente e eu nem sei se algum dia tivemos alguma coisa, falar isso para ele por mais que fosse a verdade seria pior, eu não quero o ver sofrer e nem alimentar falsas esperanças.
- Mas eu acho que o magoo-o mesmo assim.
- Eu bebi e fiz a coisa mais estupida que alguém poderia ter feito, beijei o meu ex namorado no dia que eu disse que não iriamos voltar, depois dele ter falado que ainda me amava.
- E quanto ao Tom?
- O que? Ele é um idiota, mas beija bem. O estranho é que eu beijei o ex da Mary e ela o meu - rimos, mesmo que fosse sem graça - Mary e Tom são nojentos tanto juntos quantos separados.
- Concordo plenamente, eles se merecem. Uma confissão de ontem à noite... O Tom me beijou também, logo depois do Bill ter batido nele.
- Ai meu Deus - rimos ainda mais- como pôde?
- Não me julgue, você fez o mesmo.
- Não estou te julgando, é que toda essa situação é engraçada e assustadora.
- Melanie? - diz a professora.
- O que foi? - a olho sem interesse. - É alguma coisa importante? - a senhora Eleonor me olhou pasma, uma senhora de quarenta anos que usa roupas coloridas e decotes extravagantes, seu cabelo meio grisalhos misturados a uma tintura avermelhada, estava soltos o que dá a ela uma aparecia de mais velha.
- Você fez a resenha do livro que passei para as férias?
- Não, lógico que eu não fiz, talvez não te disseram sobre o significado de férias, então eu vou falar, são os dias em que você não tem aulas e que não é obrigado a fazer dever de casa, porque se não fosse assim, se chamaria final de semana - ela me olha como se eu tivesse a ameaçando com uma faca, e eu sei muito bem como se fica, ela parece querer falar alguma coisa, mas só me olha - E aliás, quem vai querer ler um livro ridículo que nós enche de esperança que o personagem principal vai sobreviver, que vai achar uma cura milagrosa e no final ele morre?
- Então você leu o livro? - pergunta a professora.
- É, eu li - respondi, havia lido no dia que ela passou, passei a noite lendo e no final eu peguei o maldito livro e o joguei pela janela, nunca mais o vi.
- E essa é a sua resenha, tudo o que você entendeu foi isso?
- Se valer, sim, foi o que eu entende - estava ficando furiosa.
- Na verdade o livro nós ensina como lidar com a perda, a aproveitar, mesmo que seja difícil, cada dia da nossa vida, a fazer deles inesquecíveis, mostra para as pessoas que ficam a continuar em frente, a superar a perda.
- Não me ajudou em nada ficar dizendo que precisa seguir em frente, não adianta, só fica pior.
- Você precisa entender que a perca é algo natural da vida, ninguém vive para sempre.
- Acontece que eu não tive nem tempo de me despedir do meu pai e nem da minha irmã, eles simplesmente se foram - naquele momento eu já estava gritando - e eles não tiveram tempo de tornar seus últimos dias inesquecíveis. Então esse livro é uma porcaria, porque a única coisa que eu senti foi que nunca consegui dizer adeus, a nenhum dos dois.
Normalmente não demonstro os meus sentimentos na frente de alguém, muito menos de uma sala cheia de alunos, então quando começo a chorar e eu sei que não ia conseguir segurar, saio da sala correndo e vou para o único lugar no qual me sinto segura, longe dos olhares de pena e de dó, vou para a floresta.
A mata é bem fechada perto do colégio, ninguém me encontraria ali, sabendo disso desabo de joelhos no chão, chorando igual uma criancinha que caiu de bicicleta e que acha que nunca vai conseguir andar de novo, mas é exatamente assim que me sinto, que nunca mais vou conseguir andar ou continuar a viver.
Depois de uns dez minutos chorando sem parar, fecho os olhos, respiro fundo e conto até dez, respiro fundo e conto até dez, repito até sentir que não cairia mais nenhuma lagrima e volto para o colégio.
A última coisa que quero é voltar para sala de aula, então vou até a secretaria falar com a Katia, é a única na sala, sempre é, no momento é o mais próximo que tenho de uma mãe.
- Querida o que houve? - minha cara devia estar realmente péssima, porque nem precisei abrir a boca.
- Eu surtei na sala de aula por causa de um livro estupido. - digo.
- Venha cá, sente-se ao meu lado - ela posiciona uma cadeira ao seu lado e eu me sento, ela me abraça e antes que me lembre de contar até dez, volto a chorar e dizer coisas sem sentido.
- O livro... - soluço, começo a contar a história do livro, mas parecia sem sentido até para mim - professora Eleonor... eu não... e depois ele morre - termino num soluço.
- Calma, Mel - encosto minha cabeça em seu ombro e ela me abraça.
- Eu não quero mais morar naquela casa, eu não quero mais andar pelos cômodos e ser levada a uma tempestade de lembranças com eles, eu não quero mais me sentir tão sozinha, insegura e com medo.
- Você ainda é muito jovem, mas já passou por muita coisa nessa vida, não tem uma receita ou palavra certa que eu possa dizer que vá acabar com a dor que está sentindo, mas lembre-se, você perdeu pessoas que amava e que a amava muito, mas ainda tem pessoas que precisa de você e que a ama também e por mais que sentimos falta de alguém e pareça que exista um buraco tão grande em nosso coração que nunca será capaz de fechar, a sua vida continua. Perder alguém é como um ferimento grave, na hora doí, pensamos que nunca parará de doer, mas com o tempo ele cicatriza, mas deixa sequelas, uma fina linha branca, não para nos lembrar da dor, mas nos lembrar do que tinha antes do corte, pra te lembrar das coisas boas e é assim que você tem que ver, precisa deixar o ferimento cicatrizar, porque a dor vai passar.
Depois de sair da sala da Kátia não volto para a sala de aula como havia prometido a ela, vou até a enfermaria e digo que estou passando mal, o que pelo meu estado não tinha como negar e vou para casa.
Quando chego em casa vejo as várias mensagens de Karen, leio a última que ela enviou.
"Eu sei que você gosta de ficar sozinha, mas diga que está tudo bem ou que não está, diga alguma coisa" dizia a mensagem.
"Não se preocupe, estou em casa, não estou me sentindo bem, estou com muita dor de cabeça, depois eu te ligo" respondo e depois desligo o celular.
Quando o meu pai morreu a medica receitou alguns medicamentos para minha mãe, vou até o quarto dela e abro a última gaveta do quarta-roupa e numa caixinha branca está todos eles com a data de fabricação da semana passada. Pego um que diz ser para dor de cabeça e outros sintomas que não me interessa, quase todos são para estresse, depressão e insônia. Tomo o remédio e vou dormir, dessa vez consigo dormir sem ter pesadelos de ser arrastada.
Acordo com alguém mexendo em mim, segurando os meus braços, levanto num pulo quase caio da cama e estou preste a gritar quando percebo que é a minha mãe.
- Calma, sou eu, a mamãe - diz ela - a Kátia me falou o que aconteceu e a enfermeira disse que você estava passando mal, liguei para o seu celular e estava desligado.
- Quero horas são? - olho meio zonza pela janela, parecia estar anoitecendo, mas não podia ter dormido tanto.
- Vai dar sete horas - diz e se senta na cama.
- E você só chegou agora?
- Não, eu vim assim que a Kátia me falou, quando cheguei você estava dormindo, não queria te acordar, mas já está tarde e você precisa comer alguma coisa. Eu pedi pizza, já deve estar chegando.
- Pizza?
- Você sabe como sou na cozinha e não aguento mais comer congelados.
- Tudo bem.
- Você quer conversar sobre o que aconteceu hoje?
- Não, eu não quero.
- Tudo bem - ela me olha por um momento - bonito.
- O que? - ela apontou para o meu pingente - Eu comprei durante a viagem.
- E como foi a viagem?
- Foi... Legal.
- Que bom, eu vou descer, a pizza deve estar chegando, vou arrumar mesa, ou você prefere comer vendo um filme?
- Vendo um filme. - digo
- Ok, você quer escolher?
- Aham
- te espero lá em baixo então - ela me dá um beijo e sai.
Tudo o que eu quero é voltar a dormir e só acordar quando a minha vida não estiver de cabeça para baixo como está agora, talvez fosse nunca, mas ter a sensação de não ter que sentir mais essa dor é tranquilizante. Será que existe paz depois da morte, ou você ainda precisa lidar com os problemas depois que morrer? Ou pensamos que tenha paz porque é mais fácil imaginar que nossos entes queridos estão em um lugar melhor?
Desço após ouvir a campainha tocar, talvez por essa noite eu consiga ter uma vida normal, comer pizza vendo um filme com a minha mãe, mas pela manhã tudo voltaria ao normal, meu café da manhã seria café com creme em um copo plástico e eu ainda iria ao colégio sozinha.
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Feche Os Olhos
RomanceTudo o que Melanie Stancy queria era terminar o ensino médio e sair daquela cidade que só trouxe tristeza e começar uma nova vida bem longe dali. Porém, o último ano que parecia estar sob o seu total controle vira de cabeça para baixo, quando um gar...