Volta a Portugal

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Vendi todos os meus bens e partimos para Portugal. Lá tudo ficaria para trás, o tempo encobriria a tudo. Compramos uma bela propriedade próxima a Lisboa e nos instalamos com muito conforto.O pai dela, devido ao desgosto sofrido com as notícias sobre a sua filha, havia se afastado do cargo de ministro do rei. Era um homem amargurado.Contei-lhe a mesma história que havia contado a ela. Ele comentou:

_ Eu sabia que minha filha não seria capaz de cometer um ato desta natureza.

_ Foi tudo um lamentável engano, senhor. Mas o tempo vai encobrir esta mágoa.

_ Assim espero, senhor barão. Espero que possam viver bem de agora em diante.

_ Tenho certeza disto, pois eu a amo e tudo farei para que seja muito feliz.

Ainda ficamos a conversar mais um pouco. Voltei para minha casa, queria ficar próximo a ela o mais possível. Com alguns meses em Portugal, ela engravidou novamente. Eu, às vezes, acordava com pesadelos horríveis. Eram lembranças amargas da expedição.

Figuras vingativas se aproximavam de mim e tentavam me matar, isso durante o sono. Acordava transpirando muito e com o coração disparado.

Isto foi se tornando rotineiro. Todas as noites eu tinha esses pesadelos horríveis. Outras vezes, era o comandante da expedição tentando matar-me. Eu tinha medo de dormir e definhava a olhos vistos.Minha esposa começou a se preocupar com minha saúde.

_ Você tem que procurar um médico para ver qual é o mal que o aflige, barão.

_ Não é o mal do corpo que me incomoda, mas sim da alma, minha querida. A consciência me acusa dia e noite e isto está me aniquilando. Tenho medo de dormir, pois quando durmo vejo hordas de índios me perseguindo ou os homens da expedição ou o negro morto no nosso quarto.Todos me acusam de ter provocado suas mortes.

_ Mas você não tem culpa alguma. Tudo foi conseqüência daquela noite horrível.

_ Eu sei disto e acredito que sou mesmo culpado por tudo.

_ Não se acuse assim. Você também foi mais uma vítima do pesadelo.

_ Se eu não tivesse agido com precipitação, nada disto teria acontecido. Estou pagando o preço de meus erros.

_ Você não poderia saber da verdade, se outro negro não tivesse lhe contado. Sempre restaria uma dúvida que espero eu, já não exista mais.

_ Já não existem mais dúvidas, apenas remorso por tantas mortes que eu causei.

_ Não pense mais nisso. Um dia Deus o julgará e você verá, o juízo dele será a seu favor.

Ele, em Sua grandeza, mostrará a todos que você não teve culpa alguma, apenas agiu movido pela dúvida. Era um direito seu. Como poderia saber que o tal negro havia entrado em nosso quarto quando você chegou? Além do mais, se mataram o negro não foi culpa sua. Se ele ficasse vivo, poderia ter esclarecido tudo ali mesmo.

_ Vou procurar controlar meus pensamentos, querida.

Disse isto mais para ela do que para mim, pois eu sabia de toda a verdade, mas não tinha coragem de contá-la.Quanto ao julgamento de Deus eu o temia muito mais, pois, aos olhos dele eu nada poderia ocultar. O inferno seria o caminho natural para alguém como eu.

Este pensamento me incomodava muito mais ainda. Orava muito, pedindo o perdão divino,mas não tinha esperanças de obtê-lo.

A gravidez avançada, e eu me destruía cada dia mais. Quando chegou o dia do nascimento da criança, eu me alegrei um pouco com a emoção da chegada de outro filho. Isto me animou. Os pesadelos diminuíram de intensidade. Talvez, com a vinda de um filho eu esquecesse o passado.Sonhava com esta hipótese, até melhorei de saúde, mas tudo não passou de ilusão de minha parte.

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