1-Acaso

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Todas as noites pareciam iguais para Dessa, mas ela gostava de como a biblioteca era silenciosa a noite, não fora a toa que ela resolvera trabalhar naquele horário. Ela não se sentia a vontade com muitas pessoas, não depois de tudo o que tinha sofrido, ouvir o tempo todo as pessoas perguntarem se ela estava bem e dizerem que sentiam muito não a fazia sentir-se melhor, então se afastar de tudo parecia mais sensato. Ela se mudou para o centro de São Paulo e arrumou um emprego noturno em uma biblioteca, assim ela evitava conviver com as pessoas que a conheciam.

Esta noite em particular parecia quente então Dessa saiu de casa com roupas leves, uma regata branca e uma bermuda jeans comprida até o joelho, prendeu seus cabelos pretos em um pequeno rabo de cavalo, como seu cabelo era curto parte dele já havia se soltado, mas ela parecia não ligar . Ela não achava que deveria se arrumar, na verdade ela sempre usava a primeira roupa que encontrava, tudo era pratico e modesto em seu guarda roupa, ainda assim por onde passava era notada.

Depois de passar um tempo organizando livros que foram deixados nas mesas, Dessa percebeu um jovem rapaz alto e com a pele cor de canela caminhando em direção a estante onde ela colocava alguns livros. Ele era alto e com músculos definidos e usava uma camisa branca com uma calça preta cheia de fivelas, ele tinha um estilo gótico, o tipo de cara com quem ela teria saído quando tinha dezesseis anos e era uma garota roqueira. Conforme ele se aproximava ela notou que ele tinha olhos verde escuro, de um tom que ela nunca havia visto em ninguém - lestes, pensou ela - e um caminhar diferente e imponente, o seu semblante era muito sério, mas o seu rosto era belo e atraente, como se fosse impossível não ficar olhando para ele. Por um instante ela sentiu-se enrubecer e desviou o olhar ao perceber que o encarava, ele pareceu notar e esboçou um pequeno sorriso quase que imperceptível.

O rapaz misterioso parecia esperar alguém - só pode ser uma namorada - ela pensou. Um dos passatempos preferidos de Dessa na biblioteca era inventar histórias para as pessoas. ficou imaginando que aquele rapaz era um caçador de vampiros que havia se apaixonado por uma imortal e que tinha que encontrá-la ali para que ninguém soubesse do romance proibido entre os dois - Ai como você é boba Dessa, precisa parar de ler esses livros de ficção e fantasia - pensou ela enquanto tentava não se perder em sua imaginação.

De repente ela notou que parecia ter apenas os dois naquela parte da biblioteca, o que gerou um pouco de desconforto, afinal de contas ela realmente achava aquele rapaz interessante e atraente, até que ele começou a se aproximar e ela sentiu que o coração estava batendo tão alto que ele poderia ouvir.

- Com licença moça, qual o seu nome?
- Andressa, mas pode me chamar de Dessa.

O rapaz quase sorriu notando como ela ruborisava.

- Dessa - disse com um sorriso de canto mas em um tom sério - notei que você trabalha aqui, mas preciso de um tempo sozinho, você poderia me conceder esse favor.

Ela assentiu que sim e saiu. Se sentiu uma idiota, ele apenas queria ficar só, como a maioria das pessoas que vão em bibliotecas a noite, inclusive ela. Mas havia algo de curioso nele, e não era só a beleza exótica, então ela decidiu dar a volta na biblioteca e observa-lo por uma frestas entre livros de uma prateleira oposta ao sentido onde ele achava que ela tinha se dirigido.

Ele enfiou as mãos nos bolsos e tirou uma espécie de giz branco com o qual ele começou a desenhar símbolos estranhos no chão. -Um vândalo, pensou, por isso ele queria ficar sozinho, devia ter desconfiado - ela o observou recitar umas palavras estranhas enquanto desenhava, ele se levantou e pareceu pisar nos desenhos. Dessa não teve duvida, estava com raiva dele por rabiscar o chão e raiva dela mesmo por ter deixado ele sozinho, ela caminhou em direção a ele enquanto ele sussurrava palavras com os olhos fechados.

- O que você pensa que está fazendo ?- brandiu ela, que já estava em frente a ele.

Ele abriu os olhos de repente que não eram mais apenas verdes, mas pareciam feitos de pura luz verde e ele disse:

- Não devia ter feito isso Dessa.

Em um instante ela não estava mais na biblioteca, estava em um lugar completamente diferente, não só diferente do lugar em que estava antes, mas diferente de tudo que ela já havia visto na vida.

***

Ela estava de frente para o desconhecido, e nada naquele lugar era familiar. O lugar era escuro, não por falta de iluminação, mas por causa das paredes que eram de um tom cinza muito escuro, quase preto, e o ambiente tinha colunas com formas que lembravam ossos, mas se perdiam fundindo-se com o teto formando arcos. A iluminação era feita por luzes que pareciam flutuar, e o ar era gélido, mas ainda assim não sentia frio.

- E agora o que faço com você?- disse o rapaz.

Nesse instante ela sentiu o corpo se arrepiar, e uma forte dor na barriga - ele vai me matar - o pensamento pessimista não saia de sua cabeça. Então ele riu.

- Sabe a quanto tempo um humano não vem aqui?

Humano, essa palavra parecia surreal, então ele não era humano. Mas o que ele era então?

- Quem é você? E onde estou?

O corpo dela estava tomado de medo, mas sua mente também estava repleta de curiosidade.

- Me chamo Anduriel, mas pode me chamar de Andy - e deu uma piscadela fazendo referencia a maneira como ela havia se apresentado - E você está em Inferius Mundi, um dos três mundos que compõem Triantum. Você por exemplo vive em Medio Mundi.

O queixo dela caiu. O que ele falava parecia com os livros que ela lia, por um instante se sentiu Harry Potter descobrindo sobre o mundo dos bruxos.

- Isso não pode ser real. Mas nós estávamos agora a pouco na biblioteca... Oh não, saí sem avisar, vou perder o emprego.

Andy pôs-se a gargalhar.

-Você faz uma viagem entre mundos e está preocupada com o emprego? Sinto lhe dizer, mas isso é a coisa menos preocupante no momento.

Ela empalideceu.

- Com o que deveria me preocupar então?

- Pra começar os habitantes de Inferius Mundi não são muito amistosos com pessoas diferentes, nem sei como reagiriam ao ver uma humana aqui no mundo deles. Mas como eu tenho uma missão aqui, e só poderei abrir um portal daqui a uma hora, o que acha de vir comigo?

Aquilo tudo parecia loucura. Mas ela não conseguia conter a ansiedade e a curiosidade.

- Não tenho certeza se tenho escolha...

- Você pode ficar aqui sozinha me esperando, mas não terá ninguém para te proteger.

- Eu vou.

Andy deu um sorriso de satisfação, havia algo de novo naquela situação que ele gostava.

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