Prólogo

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O barulho ensurdecedor do despertador ecoava por toda extensão do pequeno quarto de apartamento. No aparelho sobre o criado mudo estava marcado em letras vermelhas e em estilo pixel o seguinte número: 6H 08MIN. Essa hora significava que o dia finalmente havia começado, e que se em menos de dois minutos não tomasse coragem para viver o restante do período que completasse 24H, algum de seus pais, ou seu próprio irmão a pedido de um deles viria a puxar, pronto para obrigá-la a ir ao inferno mais conhecido por escola.

Um resmungo baixo escapou pelos lábios finos graças a ideia antes que os olhos castanhos vagarosamente fossem acordando, procurando de forma desesperada com a mão pelo barulhento objeto. Se ele não fosse interrompido logo, era possível que a própria cabeça acabasse desistindo por mal ter acordado e já estar latejando em dor. Quando enfim achou-o, enquanto alguns apenas respiravam fundo e apertavam o botão de soneca, outros como Frisk davam um soco furioso. Assim, um suspiro de alívio a tranquilizou até a alma, confirmando poder seguir o seu recém começado dia em paz, ou, era o que esperançosamente pensava.

Frisk! Levante logo, já está na hora! — uma voz feminina e madura soou da cozinha. Não era assustadora, pelo contrário, sendo doce. De repente, conseguiu sentir um cheiro familiar que enchia-a de determinação para levantar naquele dia frio. Era a famosa torta de caramelo com canela feita unicamente por sua mãe, que todos da casa amavam.

Em um pulo, rapidamente já estava de pé, abandonando sua quente e macia cama com edredom de bolinhas, pronta para rebobinar sua rotina que consistia basicamente em: tomar banho, o café da manhã e em seguida, ir para a escola.

○ ○ ○

Não muito tempo depois, faltando poucos minutos para o toque de entrada, lá estava a menina calmamente fazendo seu caminho pela rua completamente tomada pela neve. Postes, bancos, árvores, nenhum deles conseguia se salvar do mesmo destino. Mas era o que dava a beleza do local. E além disso, estava feliz com simples coisas que aquela estação proporcionava, como a sensação de sentir suas botas afundando em algo tão fofo, ou como a fumaça causada pelo clima saia de seus lábios. Não percebendo quando o caminho pareceu ser mais curto por estar distraída, aos poucos uma estrutura alta e grande se fazia presente aos olhos de Frisk, sendo sua escola, Under Creek. Na maior parte do tempo, mesmo sendo algo que incrivelmente vivia de deixá-la aborrecida, tinham pessoas específicas que a arrancavam um riso ou outro durante as aulas.

Sans e Papyrus, como eram chamados por todos, podem servir de exemplo. Eles são dois irmãos simplesmente hilários. Um contava piadas que de tão ruins, se tornaram engraçadas, e o outro amava com corpo e alma puzzles, sempre resolvendo um quando tinha oportunidade, sem contar ser ingênuo.

Mas o que realmente chamava sua atenção não eram eles, nem ninguém além dela. O motivo pelo qual se levantava todos os dias chamava-se Chara, e a mesma não possuía nenhuma dessas características citadas, muito menos alguma que a carregasse para a popularidade. Por conta disso, era o que roubava a atenção e coração da pequena Frisk. A maior não passava de uma de suas colegas de classe, sendo a mais calada e distante de todas. Seus olhos avermelhados não exibiam nenhum tipo de emoção sequer, e mesmo após tanto sofrer bullying de pessoas mais velhas pela aparência frágil e falta de reação, permanecia de pé e intacta como uma estátua de comentários e ofensas pesadas.

Ela estava na sala durante as aulas. Seu corpo estava, entretanto, sua alma não. Vagava por algum lugar daqueles olhos e cabeça que escondiam um mundo profundo, ainda não descoberto ou conhecido por mais ninguém além de si mesma. Já passava de um hábito de tanto que se repetia, como um vício: chegando no cômodo, Chara caminhava até a última cadeira da fileira próxima das janelas, e ficava com o rosto apoiado na mão, observando tudo que acontecia do lado de fora. O mundo passando lentamente diante dela.

Então, em uma questão de segundos, a menina que dominava seus pensamentos surgiu entre os demais alunos. Sua camisa verde com uma listra amarela grande no centro, juntamente com a gola branca, eram inconfundíveis. Chara carregava em suas costas uma aura escura ao mesmo tempo que deprimida, e Frisk se sentia impotente perante aquela situação. Por não conseguir fazer nada sobre isso, mesmo tendo em seu coração uma determinação que se destacava entre todos. Já se passaram dois anos apenas observando a uma distância confortável tudo aquilo que acontecia a sua volta, toda aquela dor que a outra tinha que suportar mesmo sem merecer um pingo daquilo. Porém, havia cansado.

Cansado de ficar sentada sem tomar nenhuma atitude, e de ver que ninguém tomaria uma por já ter em perdido a fé em alguém tão maltratado. De ver que aqueles que deviam cuidar dos mais novos e ensiná-los quando estivessem com problemas em notas, apenas estivessem servindo para os pisotearem sem dó alguma graças ao seu ego enorme e inflado.

Era hora de desbravar o que havia no interior daquela garota e acabar com esse destino que estava quase marcado a ferro quente. Mesmo que tendo uma breve ideia de como seria uma tarefa difícil, não desistiria por nada nesse mundo, e nem em outro. 

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⏰ Última atualização: Apr 10, 2016 ⏰

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