Romeu

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Ela está lá, novamente. Correndo de mim pelo jardim. Rindo alegremente e contagiando meu riso. Eu a sigo, tentando agarra-la. Consigo prende-la ao pega-la pela cintura. Sua cintura é tão macia e encaixa perfeitamente nas minhas mãos. Eu a viro para olhar para mim. Retiro o cabelo do seu rosto e a beijo delicadamente. Ela fecha os olhos assim como eu faço. Eu me afasto e a observo. Seus olhos castanho-mel dão espaço a íris negra que dilata. Ela é fantástica. Ela investe novamente em um beijo e eu retribuo. Seguro-a mais apertadamente contra meu peito. Sua pele macia e perfumada. Tão frágil, que temo quebra-la. Ela é tão perfeita. Minha Julieta.

Acordo com as luzes fortes vindas da janela e me amaldiçoo por não ter fechado as cortinas. Mas me levanto. O relógio marca nove horas. Estou atrasado!

Corro para me arrumar. E desço para tomar café.

Eles estão terminando.

-Acordou tarde. –Minha tia comenta.

-Sonhando com Julieta? –Brinca meu tio.

-Pra falar a verdade sim. –Falo.

Me sirvo e engulo a comida o mais depressa que posso. Ben e Marco irão sair para inspecionar a nossa nova vinícola, um outro centro de distribuição de vinhos Montecchios.

Eles saem de carro, e eu monto na minha moto. Coloco a pasta atrás e ligo a moto. Saio e sigo pela estrada até a cidade.

Vou até um escritório de logística, preciso ver detalhes e a documentação da nova loja. A papelada foi bem rápida aqui, mas tenho de seguir para outro depois desse.

Quando vejo já é meio-dia. Não posso voltar agora para casa, decido comprar duas marmitas e duas latas de refrigerante. Sigo até a igreja e me dirijo para a porta dos fundos. Vejo o padre, remexendo nas plantas.

-Padre? –O chamo.

-Romeu! –Ele exclama. –O que o traz aqui?

-O almoço! –Mostro as sacolas. –Venha, padre, irei servi-lo.

Já estou acostumado com a casa simples. Bem habituado. Na verdade me sinto de casa. O cheiro da casa é de ervas e rosas. Pego dois pratos e dois talheres. O padre senta em um local. Coloco o prato a sua frente e o sirvo. Pego um copo e despejo o refrigerante dentro.

-É um sorriso que vejo em seu rosto?

Sorrio mais ainda, mostrando meus dentes.

-É. É um sorriso, sim. –Me sento à mesa.

-E qual o motivo? Não seria Rosa, seria? Ou será outra moça? É possível?

-Huum. –Murmuro. –Não é a primeira opção, e é quase a segunda.

-Oh! A garota dos teus sonhos? –Ele pergunta assustado.

-Sim. –Respondo sorrindo e olhando para meu prato.

-Ah, meu filho. Não é real. Não pode amar-amar alguém que só exista na sua cabeça.

-Mas não foi o senhor mesmo que disse que eu deveria esquecer Rosa, já que ela não me ama? Julieta me ama, e eu a amo também.

-Ela não é Julieta, filho. –Ele teima, mas para ao me ver olhando-o. Ele respira fundo e solta-o. –Certo, mesmo que ela exista, você menospreza o que sentia por Rosa assim tão depressa?

-Ela nunca sentiu nada por mim. –Dou de ombros. –Mas ainda sinto algo por ela, mas sei também que não é tão real quanto pensei que fosse. E não foi o senhor mesmo que disse para que eu a esqueça?

-Pedi para parar de chorar por ela, não para diminui-la a um simples e passageiro amor sem fundo.

-Mas é o que ela foi para mim, padre Lourenço. Jamais foi algo a mais. Apenas minha Julieta.

Padre balança a cabeça negativamente achando todo esse meu pensamento absurdo demais. Começa a comer e eu o acompanho. Depois de comer eu lavo os pratos e o sigo até o jardim da igreja.

-Já pensou em contratar um jardineiro ou algo do tipo? –Falo enquanto limpo as folhas secas.

-E qual seria a graça de cuidar de um jardim?

-Pouparia trabalho, pelo menos. –Falo baixinho.

Ele da um tapa no meu pescoço.

-Ai. –Gemo.

-Continue limpando! –Ele ordena.

O padre Lourenço não costuma me obrigar a limpar seu jardim, ou dar pescotapas. Mas ele está fazendo isso hoje para me prender aqui. Eu nem ligo pra isso, gosto da presença dele, mesmo sendo dolorosa.

-Diga, Padre, acha que minha Julieta vive? Ou será que ela morreu e me deixou aqui para procura-la com a morte?

Ele me dá outro pescotapa.

-Deixe de colocar minhocas na cabeça! –Ele espera um tempo. –Mas respondendo a sua pergunta, acho que ela vive. Respira e está tão forte de saúde como eu e você!

-E por que não estamos juntos?

-Deus escreve as mais belas histórias por linhas tortas.

-Eu a amo, sabia? A amo sem conhece-la, e creio que é o mais puro amor que existe. O senhor concorda?

-Concordo, sim! –Ele sorri. –Bom, meu filho, já terminou por aqui. Vá. Termine seus afazeres e tenha uma boa noite.

-Fala da festa?

-Eu sei que você vai. Não sei como, mas sei que você vai!

Eu sorrio. Ele sempre decifra e descobre tudo.

-Vá!

-A sua benção, padre.

-Deus, lhe abençoe! E lhe dê muito juízo!

-Pode deixar. –Falo e saio o mais depressa possível, não por que quero ir embora e fugir do padre, mas por que quero terminar de ver a documentação e me arrumar para a festa de hoje, onde me despedirei de Rosa. Um beijo, talvez?

Afasto esses pensamentos e sigo, de moto até as demais localidades e termino de arrumar a documentação por hoje.

Volto pra casa e o sol começa a sumir e sei que está na hora de me arrumar.

Chego em casa e passo em frente as portas de meus primos:

-Não demorem, irei me arrumar agora.

-Não demore você. –Diz Marco.

-Estou indo às pressas. Não demorarei. –Falo.

Ben, também se arrumava.

Entrei em meu quarto e o fechei. Me despi e joguei as roupas por todos os lados. Fui até o banheiro e me banhei, tirando toda a sujeira acumulada de hoje.

Lavo meu rosto e passo a mão pelos meus cabelos claros. Ensaboo-me e depois lavo tudo com água novamente. Seco-me e saio do banheiro com a toalha enrolada na cintura. Vou até a sacola do terno e o retiro. Coloco-o sobre a cama, junto com a gravata e a mascara. Me dirijo até a mesa e vejo novamente o esboço de Julieta. Minha amada e doce Julieta. Beijo o desenho e o devolvo junto aos outros.

Olho para a cama e encaro o terno.

-Então é hoje. A partir de hoje serei inteiro de Julieta.

Os novos Romeu e JulietaOnde histórias criam vida. Descubra agora